A intenção esta subjacente no plano para o sector estabelecido para os próximos cinco anos. Definido pelo Executivo como prioritário o subsector da pecuária tem um longo caminho a percorrer durante este quinquénio que também coincide com o Governo em funções. Ele é parte da solução para o combate à fome, a redução da pobreza e promoção do desenvolvimento social e económico do país. Especialistas do sector consideram a iniciativa positiva, mas levantam questionamentos sobre alguns pontos do PLANAPECUÁRIA
Em consonância com o propósito de “aumentar a produção de proteína animal e derivados” e garantir segurança alimentar e contribuir para o desenvolvimento do comércio e aumentar a receitas fiscais, o Executivo gizou um amplo plano a que se propõe implementar durante o mandato.
O propósito é buscar a abundancia de alimentos de origem animal, tais como carne bovina, suína, caprina/ovina e de aves, bem como a de leite e ovos, proporcionando “meios e financiamento a produtores” que estejam agrupa- dos em agremiações. Com este objectivo foi aprovado o Plano Nacional de Fomento e Desenvolvimento da pecuária, abreviadamente designado por PLANAPECUÁRIA.
Para o veterinário e docente universitário, Moras Cordeiro, todos os factores limitantes trazidos na actual proposta do governo, não constrangem apenas os pecuaristas mas, igualmente, o sector familiar que, há vários anos não são apoiados, apesar de ainda assim continuarem a produzir e a abas- tecer os mercados formais e informais. “Mesmo sem PLANAPECUÁRIA os criadores do sector familiar continuaram a produzir e a fornecer todos esses produtos, ao longo de todos estes anos, para consumo dos angolanos”, realça o entrevistado.
Para ele, vai privilegiar-se «os produtores que estejam organiza- dos em cooperativas» mas muitos dos quais nunca mostraram as suas produções. “Qual tem si- do a contribuição dos produtores do sector empresarial para a produção de carne nacional?”, questiona. Moras Cordeiro salienta a necessidade de o Estado fomentar e não estimular o cooperativismo no seio dos criadores do sector familiar, «estruturando e organizando o sector, a cadeia de valor de produção de carne e produtos pecuários, capacitando os seus actores, incrementando os seus níveis de produção e produtividade, acelerando a substituição racional das importações e promovendo as exportações para mercados específicos», citando como exemplo, o que foi feito na República do Botswana.
“Porque é que o Estado não atrai investimento privado ao longo das cadeias de valor da produção de carne e outros produtos pecuários nas extensas regiões da produção dos produtores do sector familiar do Sul de Angola, com a construção ou reconstrução das ‘lojas do mato’, feiras de gado com manga e balança para a pesagem do gado e a venda dos animais a preço justo, facilitando a venda ou troca de produtos de primeira necessidade ou outros de que as populações rurais do Sul (Namibe, Huíla, Cunene e Cuando Cubango) tanto carecem?”, questiona o entrevistado que, entretanto, não reprova o PLANAGRÁRIO.
Crescimento
Moras reconhece que, em ter- mos globais, houve crescimento no sector da pecuária. Registou-se um aumento médio anual de 12% na produção de carne de 2017 a 2021, com especial destaque para a produção de carne suína (55%) e bovina (30%). Mas de- fende que seria bom destrinçar-se as contribuições dos dois sectores fundamentais: o empresarial e o sector familiar, como forma de aferir a contribuição individualizada de cada um deles e perceber- se a preponderância de cada um. Ainda em termos de números, o especialista levanta dúvidas em relação aos números forneci- dos pelo RAPP 2019-2020 em relação ao efectivo de aves e suínos do Cunene.
O triângulo da produção de cereais – Ganda-Huambo-Vila Branca (Huíla) coincide com o triângulo da maior produção de suínos e foi no passado, a região com o maior efectivo de suínos. “O Cunene, com baixa produção de cereais (milho, massango, massambala) e secas consecutivas, tem um efectivo de suínos e de aves superior a Benguela?”, interroga-se. Defende que foi a pecuária o sector familiar que sustentou o consumo interno mas, paradoxal- mente, não recebe qualquer apoio do Estado, privilegiando-se «alavancar o sector empresarial neste subsector», que no passado e presente, nunca ultrapassou mais do que 10% da produção pecuária nacional.
“A pecuária tradicional nunca foi apoiada ‘por estratégias e políticas sectoriais/intersectoriais adequadas, recursos financeiros e humanos especializados, infra-estruturas e equipamentos de apoio e serviços de assistência eficazes’ para além das campanhas de vacinação com baixa cobertura vacinal e alguns apoios em infra-es- truturas mas contribuiu e contribui com a maior parte dos animais para reprodução e abate”, questiona mais uma vez Moras Cordeiro
“Preferiu-se o voluntarismo à razão e à ciência”
Já o agrónomo Fernando Pacheco contextualiza que o PLANAGRÁ- RIO surge depois de uma promessa do Presidente da República durante a sua campanha de reeleição realizada o ano passado e visa “satisfazer preocupações apre- sentadas pelos criadores de gado da Huíla”. Para ele, é “positivo que o Plano procure abranger e apoiar a solução de vários sectores da cadeia de valor”, porém, lhe parece que os objectivos propostos para três anos são demasiado ambiciosos e justifica: os mesmos “criam ex- pectativas que são, como acontece frequentemente, muito pouco realistas”.
O exemplo, para fundamentar os seus receios reside no facto do plano já referir-se à exportação. “Não faz o menor sentido para os dois anos. Acho que nos primeiros três anos o foco deve incidir na criação das condições técnicas, materiais, logísticas e institucionais para então pensarmos numa produção sustentada. Sei que aquilo que eu considero prudência pode ser confundido com má vontade, mas infelizmente o país está repleto de projectos que resultaram em fracassos, porque preferiu-se o voluntarismo à razão e à ciência, ao planeamento e à organização”.
Objectivo do plano
O PLANAPECUÁRIA, aprovado em finais do ano passado, tem como objectivos contribuir para a auto-suficiência alimentar e nutricional das populações de modo a combater a fome, aumentar os rendimentos dos produtores pecuaristas e de outros intervenientes ao longo das cadeias de valor de produção de carne e aumentar a contribuição da produção pecuária nacional na satisfação das necessidades de consumo interno, nas exportações e no PIB do país. Para o período 2023 a 2025, o plano está assente em nove objectivos específicos.
Estruturar e organizar, no sector cooperativo, a cadeia de valor de produção de carne e produção de carne e produtos pecuários, capacitando os seus actores, produtividade, acelerando a substituição racional das importações e promovendo as exportações para mercados específicos. Visa também fomentar a instalação da indústria alimentar, matadouros, casas de abate e de processamento, furos de água, centros logísticos e de frio, bem como a aquisição de máquinas pesadas e ligeiras e camiões tecnológicos transporte de gado e carcaças).