O Ministério Público pediu, ontem, ao Tribunal Supremo, que não seja considerado o crime de abuso de poder do qual a procuradora Natasha Sulaia Santos vinha acusada e pronunciada, por entender que não foram preenchidos os requisitos previstos por lei para a condenação da magistrada
No caso que envolve o Estado à magistrada do Ministério Público Natasha Sulaia Santos de Andrade, de 46 anos, acusada nos autos pelo crime de abuso de poder, factos ocorridos em 2017, o representante do Ministério Público pediu que o tribunal declare a conduta da arguida como não punível.
Nas suas alegações, o procurador Simão Chapopia considerou que, segundo a lei, ao abrigo da qual a arguida cometeu o crime, ficou provado que o crime não se consumou.
Todavia, esclareceu que foram praticado todos os actos de execução que poderiam produzir o resultado esperado.
O que só não ocorreu por circunstâncias alheia à vontade da arguida ou seja, o crime foi frustrado.
Simão Chapopia sublinhou ainda que pese embora os factos tenham sido praticados em 2017, o caso está a ser julgado agora, num momento que vigora no país um novo código penal.
O novo diploma legal, acrescentou, deu por finda a diferenciação entre os crimes frustrados e tentados passando a considerar apenas os crimes tentados, em cujo conceito cabem todos os elementos do crime frustrado previsto no código anterior.
Referiu que o novo código penal estabelece, também, que sempre que haja sucessão de leis no tempo, deve-se aplicar o regime que seja completamente favorável ao arguido.
A seguir às alegações, o juiz da causa, João Fuantoni, marcou a aprovação e discussão dos quesitos para o próximo dia 4 de Outubro, pelas 10 horas, na sala nº 1 do Tribunal Supremo.
O caso O crime de que vem acusada e pronunciada a magistrada Natasha Sulaia Santos remonta a 2017, altura em que a arguida terá, segundo consta nos autos, violado normas e procedimentos da instituição em que labora, no caso a Procuradoria-Geral República (PGR).
De acordo com a acusação, na sequência do rompimento do contrato de sociedade entre a família da arguida e o cidadão norteamericano Christopher Sugrue, do qual resultou na construção de um complexo habitacional denominado Isha, localizado na Ilha do Cabo, em Luanda, a magistrada terá usado da sua condição para praticar o crime de abuso de poder.
Consta nos autos que, no dia 10 Agosto de 2017, após o sócio estrangeiro ter, supostamente, invadido o condomínio e substituir a equipa de segurança do complexo, alegando ser apenas sua propriedade, a magistrada teria recorrido ao SIC junto da Polícia da Ilha para participar o caso.
Na noite do mesmo dia, apercebendo-se de que o cidadão estrangeiro embarcaria para o exterior do país, a arguida dirigiuse ao aeroporto internacional 4 de Fevereiro, onde confirmou que o mesmo havia abandonado o país com destino a Paris, França, por volta das 21 horas.
No dia seguinte, 11 de Agosto de 2017, terá ligado para o procurador da República junto do SIC, Alexandre Janota, declarante nos presentes autos, solicitando a possibilidade de interdição do mesmo cidadão do país.
Contrariada, na mesma a arguida entendeu escrever para o director nacional do SME, em correspondência assinada como procuradora da República, embora em papel não timbrado, que teve como assunto: “Interdição e mandado de captura internacional contra Christopher Sugrue”.
No documento, a magistrada atestava que o mesmo estava indiciado no processo nº 3771/17, como autor dos crimes de “abuso de confiança, roubo qualificado, ameaças e introdução ao imóvel alheio” solicitando a sua interdição ou sinalização tão-logo aquele se apresentasse nas fronteiras nacionais.
A correspondência deu entrada no mesmo dia no SME, ao mesmo tempo que foi remetida, por e-mail, ao declarante Idelfonso Francisco Massango, representante de Christopher Sugrue, através do irmão da arguida Miguel de Sousa Andrade.
Apesar da solicitação da arguida não ter tido colhimento junto da direcção do SME, o mesmo documento foi parar aos órgãos de comunicação social e às redes sociais, tendo o facto criado prejuízo na ordem moral da PGR organismo do Estado que tem como escopo a defesa da legalidade.
Com isso, diz a acusação, o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público, por deliberação nº 5/18 de 21 de Agosto, participou o facto ao DNIAP.
E, segundo consta nos autos, a arguida agiu em consciência e com a mais ampla liberdade tendo representado como magistrada as consequências do seu acto.
Desta feita, a arguida cometeu o crime de abuso de poder, previsto e punível nos termos do artigo 39 da lei nº 3/10 de 29 de Março, Lei da Probidade Pública, com agravantes de insistência em consumar o crime.