No século XX, em Angola e no mundo, muitos cidadãos, a maioria deles “mais velhos”, morreram em defesa de sua identidade própria, na luta pela sua suposta liberdade e pela independência dos territórios ao qual pertenciam desde há muito tempo e agora denominadas novas nações africanas.
Não foi fácil a estes cidadãos nacionalistas, naquela altura muitos eram jovens, assumirem uma luta pessoal e nacional e também foi uma decisão difícil irem para as matas lutando pelos seus ideais independentistas e sabendo que a sua vida nesta luta seria muito complicada em todos os sentidos, incluindo o afastamento de suas próprias famílias e deixando estas muitas vezes à sua sorte.
Estes guerreiros puseram em risco sua vida e de sua família, muitas vezes. Estes “mais velhos”, avós muitos deles, e os mais novos, tiveram muita coragem para desenvolverem “per si” esta consciência profunda sobre quem eram e o que pretendiam ser, eles e seus filhos e netos e sua nova nação, pois era mais fácil e seguro nada fazerem e ficarem amorfos, naquela época de 1950, meados do século XX, aonde o acesso à informação não era democrático como hoje, nem “online”.
Estes “mais velhos” tinham de ser muito fortes, mental e fisicamente, para decidirem “ir prá mata” lutar pela sua dignidade e de sua família e sabendo que a morte era um dos riscos mais evidentes, mas estas dificuldades motivaram mais estes guerreiros de ontem, avós de hoje, e como resultado dessa luta individual e colectiva, Angola em 1975 transformou-se numa nação independente e inseriu-se num mundo global com seus próprios pés.
Apesar da luta pela independência das novas nações africanas, as sementes do colonialismo não desapareceram de todo e basta um olhar mais atento, profundo e isento pelas sociedades humanas globais actuais.
Angola e as novas nações, após as independências, conseguiram expurgar uma parte do pensamento colonial. Muitos dos modelos coloniais económicos, sociais e ambientais, alguns bem estruturados e adaptados e outros não, por diversas razões sobreviveram até hoje, mas é necessário uma análise sociológica mais cuidada para aprofundar esta questão e identificar seus pormenores e suas razões de sobrevivência forçada ou não.
Agora, nesta nova era, neste século XXI, vieram e continuam a vir para todos os países do mundo, novos colonizadores, denominados agora como neocolonizadores, pessoas diversas e diferentes que representam seus países de origem e que buscam explorar outros povos em seu próprio e exclusivo benefício, pessoas que nos novos países para onde emigam, impõem seus modos de vida particular, radicais, e muitas vezes fora da lei.
Ou seja, estes novos países lutaram tanto contra um colonizador e venceram mas agora têm de enfrentar diversos e diferentes neocolonizadores com seus próprios modelos nacionalistas e os povos originais tornam-se cada vez mais invisíveis na sua economia e na sociedade e até aceitam serem subalternos pois a visibilidade é de quem domina economicamente e, muitas vezes, descumprindo a lei.
É necessário observar e repetir que esta mesma situação está a acontecer em muitos países, incluindo os europeus e americanos. Após estes mais de quinhentos anos de exploração e abuso colonial, com resultados extremamente nefastos para as nações africanas, como resultado deste neocolonialismo diverso e diferente, milhares e milhares de crianças, jovens e “mais velhos” que até lutaram pela suposta independência de seu país , deambulam pelas ruas das cidades, nos bairros, de dia, e de noite, dormem nas soleiras das casas e das pensões, agasalhados por um pedaço de cartão, ao frio e à chuva a molhar, batendo às portas dos carros na esperança de um pedaço de pão, muitas vezes vasculhando nos tambores de lixo e lixeiras humanas à procura de seus sustento.
Quando se estacionam os carros nas ruas destas cidades de hoje, nesta nossa África, é comum aparecerem crianças, da mais tenra idade e até adolescentes e adultos, de mãos estendidas a pedirem um pedaço de carinho do céu, uma côdea de pão mesmo que seja dura e velha, e o mundo olha ou finge olhar para tudo isto e pouco fazer justificando que hoje em dia todos os países tèm estas dificuldades.
O mundo está a complicar-se cada vez mais e o futuro que vem aí não vai ser nada fácil pois a natureza também parece estar a dar uma resposta dura às alterações climáticas que foram causadas principalmente pelas nações que um dia foram ou ainda são os chamados colonizadores, com suas economias consumistas, gananciosas e desequilibradas.
Angola, neste momento, precisa de pessoas ousadas e comprometidas com um desenvolvimento sustentado, que tenham humildade, reconheçam os erros passados e presentes, de forma a permitir que a voz dos mais competentes e responsáveis sejam ouvidas na possibilidade de um maior desenvolvimento económico, social e ambiental sustentados e reais mas esta mudança terá de nascer, principalmente, nos jovens e adultos mais conscientes que sabem que seus avós lutaram e morreram pela suposta independência e desenvolvimento de sua nação, de seus filhos e netos.
Os jovens e adultos de hoje, precisam assumir uma postura mais ousada, mas mais humilde, mais inteligente, mais sapiente e mais aberta ao diálogo e escutarem ideias novas, pois estas ideias podem ser melhores ou não do que as suas, devem espelharem-se na coragem de seus avós e seus antecessores, pois o acesso à informação hoje em dia é muito mais democrático e qualquer pessoa, no geral, pode obter mais informação e pode desenvolver sua própria consciência e assumir uma atitude mais equilibrada em prol de si e de sua nação.
Muitos jovens e adultos Justificam sua indolência e seu desligar da realidade, afirmando que a culpa é dos outros, dizendo que não têm professores à altura, dizendo que o sistema não os beneficia, dizendo que não são filhos de pais ricos, etc.. Estes jovens e adultos não podem aceitar sua inércia dizendo que a culpa é dos outros, pois essa atitude nega a sua própria vida, nega a sua individualidade, nega a sua autonomia, nega o seu “ser ou não ser” humano com potencial próprio de inteligência.
A inércia e o deixa andar, nega a sua capacidade de humano pensante e responsável, capaz de se liderar e ao colectivo a que pertence, esse é o caminho correcto e mais equilibrado, assumir-se, ser capaz de se projectar sem se desculpar com os outros.
Os outros naturalmente também são responsáveis, do que está errado e do que está certo, mas a mudança fundamental está em cada individuo. Não é seguindo em fila que se desenvolve a inteligência, poisquem está atrás só pode ver no máximo o que o da frente vê. É portanto necessário andar em linha, ser, pois só assim todos têm a mesma possibilidade de ver seu horizonte próprio.
O Mestre só é Mestre, só desempenhou suas responsabilidades com mestria se o discípulo o ultrapassar em conhecimento, só assim o Mestre pode ter um “feedback” de que alcançou o âmago de seu trabalho.
Construir uma nação nunca é fácil, mais ainda nas condiçõesem que Angola ficou após a fuga dos quadros administrativoscoloniais e é muito difícil reorganizar administrativamente uma Nação. Não se consegue simplesmente voltar a construir tudo de novo, pois há imensos pormenores passados e presentes intervenientes nessa construção.
O caminho que parece ser mais equilibrado e menos conflituoso é “corrigir o que está mal e melhorar o que pode ser melhorado”, este certamente é o caminho mais sapiente.
Os jovens de hoje, adultos, precisam urgentemente de se assumirem por completo como seres humanos normais e com potencial de inteligência, seres humanos com duas pernas, com dois braços, com um cérebro, com uma família ou não, etc., pois o acesso à informação, hoje em dia, neste século XXI, é muito maior do que antes, no tempo de seus avós que tanto lutaram e até morreram ou estão a morrer porque seus netos e filhos optaram pelo conformismo e pela inércia, dizendo constantemente que a culpa e a responsabilidade é sempre dos outros.
É importante falar, mas é mais importante fazer, pois “pensar exige esforço”. Hoje em dia, o acesso à informação, para muitos cidadãos, jovens e adultos, é muito maior do que qualquer rei tinha há mais de trinta anos e esses reis governavam seus países e alguns até governavam muito bem.
São milhões de crianças do mundo a vaguear pelas cidades e batendo às portas das ruas, à procura de um pedaço de carinho do céu, de uma fatia de sorriso, de um brilho no olhar adulto, de um pão, de um abrigo, de um saber que lhes permita serem mais fortes, mais conscientes, mais exigentes, mais responsáveis, querendo inconscientemente encontrar uma alma que os albergue das intempéries desta vida aonde nasceram.
São milhões as crianças que vagueiam pelo mundo, e ninguém lhes perguntou se queriam ou não nascer aqui e agora nesta terra e estas crianças são parte integral e profunda de nossa consciência e não são responsáveis das acções não equilibradas dos adultos gananciosos ou inconscientes e são as que menos voz têm. É em nome delas que falamos.
Por: VALDEMAR FERREIRA RIBEIRO
* Economsta, Empresário Industrial, Ambientalista