Eu sei, eu sei: o tema em causa não parece ser nada simpático. Mas e daí? As pessoas estão acostumadas a desprezar aquilo que é muito frequente e a desconfiar daquilo que se mostra novo.
Por outro lado, considero que se já houve uma época em que se mais precisasse abordar sobre a democracia como tal, este tempo é efectivamente este (não obstante sua aparente popularidade). Segundo teóricos (mencionando, Paula Becker, Dr. Jean-Aimé A.
Raveloson), “O termo democracia provém do Grego e é composto por duas palavras: demos = povo e kratein = reinar.
É possível traduzir democracia literalmente, portanto, com os termos reinado popular ou reinado do povo.”
Abraham Lincoln, em termos simples, a definia como: “government of the people, by the people, for the people” (governo do povo, pelo povo, para o povo – ) – Traduzido.
Na visão de Paula Becker, Dr. Jean-Aimé A. Raveloson ( Obra Democracia, o que é), Lincoln afirma que na democracia, “O poder surge do povo, está a ser exercido pelo povo e no seu próprio interesse.”
Mas a democracia, de facto, existe? Se considerarmos a visão de Lincoln, só podemos por assim dizer, considerar uma democracia literal, a todo o sistema de governação, onde as vontades dos povos são consideradas ou atendidas, e onde se trabalha para eles e com eles.
Neste sentido, os povos deveriam estar e ser informado de toda a política de gestão e decisões do governo. Entretanto, porquê ouvimos constantemente a se falar do conhecido termo, que quase praticamente passa por vulgar: “SEGREDO DE ESTADO.”?
Que segredo? Não somos nós os “kratein” (soberanos e ou a quem se centraliza o poder)? Guardam segredos aos povos e ainda assim serem rotulados como um estado democrático?
Teria Eugênio Bucci razão quando afirma que até mesmo naquilo que nós informam só nos passam o que nas suas observações, seria conveniente que soubéssemos?
Pois Bucci sustenta que a “ imprensa, ao menos na visão de seus praticantes menos pernósticos, nunca teve a missão de entregar “a” verdade às pessoas, muito menos a verdade com “V” maiúsculo.”
Deste modo, como ele mesmo questionou, como pode haver de facto democracia sem verdade factual?
Um outro facto interessante, é que como sabemos, cada povo é regido por um princípio cultural particular, próprio ou singular que os destingem dos demais.
Ora, cabe deste modo a cada estado saber contextualizar, criar ou promulgar, normais que peculiarmente se adaptem a eles.
Logo, como pode ser possível estabelecer uma norma universal, onde todos os povos governos e pessoas devem obediência, sem que cada um destes aglomerados venha a ter a sua voz apagada? Autores (como Paula Becker, Dr. Jean-Aimé A.
Raveloson, DEMOCRACIA O QUE É) afirmam que: “As Nações Unidas estão a ser apoiadas por um grande número de Organizações Não-governamentais que, através da colaboração com protectores de direitos humanos activos em todo o mundo, publicam relatórios sobre atropelos dos direitos humanos e, com isto, conseguem obrigar governos a não tolerar mais violações dos direitos humanos.”
Ora, como todos podemos ser obrigados a obedecer Declaração Universal dos Direitos Humanos e ainda assim sermos consideramos como parte de um mundo de 194 países com mais de 85% democráticos (neste caso 123)?
Considera ainda que para o caso em que um estado atropele os direitos humanos, existe o Tribunal Internacional em Haia/Países Baixos que tem competências para pronunciar sentenças. Considera que isso não se limita apenas a organismos internacionais.
Pois a COVID _19 já nos mostrou que nossa pertença liberdade, privacidade e poder de decisão, só são autônomas por prazo temporário.
Vê-se que nossas palavras têm, em todos os casos apenas peso em quase todos os estados, quando elas se adequam aos interessantes e caprichos de quem governa.
Mesmo os deputados que como diz a norma, articulam a vontade da população, visto que esta é por ele representado, são mais voltados a cumprir suas agendas partidárias do que as vontades e os interesses dos povos.
Afinal, quantos tentam informar a população sobre o seu trabalho através de sessões abertas, reportagens nos médias e eventos dirigidos e, ao mesmo tempo, apoiam a ela na criação da sua vontade política?
Voltando a covid, quantos povos, grupos, sindicatos e afins, foram devidamente consultados, sobre suas preferência, gostos e escolhas em relação ao processo de vacinação?
Um dado que se discute é sobre quem são verdadeiramente os “Demos” (povos) a quem a democracia ostenta dar poder.
O que se vê? São maioritariamente os da classe média, os ricos e dominantes, os nobres e povos de alta escolarização.
E onde ficam os demais? Por que causa os povos considerados indígenas da Amazônia não têm lugar nas reuniões climáticas ou nos congressos em que se discutem políticas de gestão e cuidados da mesma (Amazônia)? Quem é consultou as sociedades civis de Israel para saber se estariam dispostos a ocasionar um pretexto de guerra contra os Hamas?
Quem perguntou aos agricultores Ucranianos de todas as classes, se optariam ou não a ideia de unirem-se a NATO diante de um clima de grande tensão?
Talvez seja por isso que PierreJoseph Proudhon afirma que “ hoje mesmo temos a prova de que não se pode ser livre na mais perfeita democracia.”
Em 1873, no livro Estatismo e Anarquia, Mikhail Bakunin afirma que “por governo popular – democrático – (…) entendem o governo do povo por meio de um pequeno número de representantes eleitos pelo povo (…) uma mentira que esconde o despotismo da minoria dirigente, mentira ainda mais perigosa por ser apresentada como a expressão da pretensa vontade popular.” Alexander Berkman ressoou uma crítica semelhante no periódico Mother Earth, de outubro de 1917: “a democrática autoridade do governo da maioria é o último pilar da tirania.
O último, e o mais forte (…) o despotismo que é invisível porque não é personificado, poda a paixão de Sansão e o deixa sem vontade.
Ai do povo onde o cidadão é um soberano cujo poder está nas mãos de seus mestres! É uma nação de escravos solícitos.”
Em fim do caso, diz Errico Malatesta, em texto de 1924: “até mesmo na mais democrática das democracias, é sempre uma pequena minoria que domina e que impõe pela força a sua vontade e os seus interesses. (…) Enfim, de facto existe democracia?
Eu tenho minhas dúvidas. Afinal, bem disse Errico Malatesta: “Assim, desejar realmente o ‘governo do povo’ no sentido em que cada um possa fazer valer sua própria vontade, suas próprias ideias, suas próprias necessidades, é fazer com que ninguém, maioria ou minoria, possa dominar os outros; dito de outra forma, é querer necessariamente a abolição do governo (…).”
Por: Sampaio Herculano
*Finalista do Curso de História pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho