Em véspera do lançamento da sua mais recente obra discográfica, intitulada “Carolina do Ebo”, previsto para o mês de abril, Jaime Palana Kipungo, “Man Prole” é autor dos sucessos “Scania 111”, “Kimbombeia”, “Kizombas” e tantos outros. Considera o novo rebento como sendo de grande dimensão no contexto histórico e cultural. Convidado a falar sobre a música angolana, relça que, até certo ponto, tem estado a evoluir com aqueles que apostam fortemente no semba e noutros estilos nacionais
Como está em termos de projectos para o novo ano que se iniciou?
Dizer que o ano 2024 está a iniciar bem, fruto de um grande trabalho e sacrifícios consentidos entre 2015 e 2023.
Anos em que tenho estado a trabalhar num novo disco, denominado “Carolina do Ebo”. Digo isso porque foi mesmo um grande sacrifício, que também foram até certo ponto benéficos.
Em 2015, eu tencionava gravar o disco e partindo dessa data comecei então a me virar à procura de patrocínios.
Em consequência deste esforço, tive a sorte de encontrar um amigo e conterrâneo, oficial das Forças Armadas, que me deu a primeira mão, enquanto procurava produzir as bases deste mesmo disco.
Estava em mente a produção dessas bases, mas, como não dispunha de nenhum recurso, então, esta pessoa amavelmente apareceu.
Contou-me a história da irmã que perdeu a vida por doença e eu fiquei muito sentido.
Partilhei a dor dele e em consequência disso, decidimos homenageá-la, razão pela qual o disco está a se chamar “Carolina do Ebo”.
É uma possibilidade a qual tenho que agradecer bastante, pelo gesto tão caridoso e amoroso que fez com que eu criasse as bases todas da música.
Como foi o processo de gravação do disco?
Em 2019, depois das bases terem sido concluídas, tive que me deslocar a Lisboa e nessa deslocação tive uma outra personalidade, o engenheiro Bravo Neto, que fez como que fosse a Lisboa e deu-me estadia durante sete meses.
Durante esse período, fiquei a trabalhar com Betinho Feijó. Foram pessoas muito caridosas e nunca me ei-de esquecer delas.
Conforme disse anteriormente, este processo resultou em “Carolina do Ebo”, que neste momento, com a ajuda da Fundação Brilhante, por intermédio do Doutor Bruno Agostinho, estou por terminar o disco.
Devo dizer que, neste momento, no que ao lançamento do disco se refere, estão criadas todas as condições.
O que falta fazer para a saída do disco?
Restam apenas algumas questões técnicas que tinham que ser resolvidas no mês de Novembro. Mas, como todos nós sabemos, o mês de Novembro vem sempre com dificuldades devido à quadra festiva. Algumas pessoas têm que gozar férias, há quem comece a trabalhar em Fevereiro, Março, enfim.
Dizer que as coisas estão alinhavadas. Estão quase todas concluídas.
Quantas faixas terá o disco e qual é a editora responsável pela obra?
A edição cabe a Betinho Feijó, a partir de Portugal. Nós estamos a trabalhar online e as coisas estão a correr as mil maravilhas.
Neste momento, restam apenas algumas questões técnicas que eu estou a rever, para que o disco seja lançado o mais breve possível.
Quantos temas terá o CD e quais são?
Temos “Carolina do Ebo”, que dá título ao disco, “Mano Yangue”, o “Kanote”, um tema que está a servir de promoção para a venda do disco e toca bastante nas estações radio, “Serenata Africana”, o “Kilapanga”, cantado em umbumdu, o “Minga Zembele”, um tema novo, o “Kwele Kwele”, uma música que eu canto em lingala, com a ajuda de certos amigos do Congo Democrático, “Margarida”, muitas músicas boas.
Temos o semba, o kilatas, novos ritmos que eu tenho estado a revolucionar. São ritmos provenientes do município do Libolo.
São muito bonitos e eu julgo que futuramente as novas gerações vão adorar. Tenho como estilos musicais a kizomba, a sawaya, ritmos característicos do Sul de Angola e muito mais.
Quais são os músicos que participam neste disco?
Músicos são muitos. Em Angola, podemos citar o Nanutu que participou em duas músicas, sem me cobrar nenhum tostão.
É uma pessoa muito especial a quem agradeço de todo o meu coração.
Temos o Mestre Tedy, solista da Banda Movimento, que tocou no tema “Kanote” e sem deixar de falar do falecido Charlles, que esteve na direcção e montagem das bases musicais, a partir da Banda Chamavo.
Que Deus o tenha! Tenho também a participação de muitos artistas da Banda Chamavo.
É o caso do Zé Luís, Alex Kiwi, que tocou o órgão, a quem agradeço bastante.
As coisas estão muito bem maravilhadas, principalmente na música ‘Babilónia’ e noutras músicas em que participa. Tenho também a destacar o Isaac, viola baixo, também foi da Banda Chamavo.
São esses músicos que participam e isso, sem me esquecer do Betinho Feijó. É o homem que se destaca bastante, quer na produção, quer nos acabamentos e outros aspectos.
Esteve durante alguns meses em Portugal a gravar. A obra vai ter participação de artistas deste país?
Portanto, tive também a participação de artistas portugueses, que tocaram os metais.
Também tem outros, só que não tenho aqui a ficha técnica, poderia divulgar os seus nomes, mas neste momento não estão aqui na minha mente.
Quando o disco chegar, as pessoas terão a oportunidade de conhecer todas essas figuras que foram tão carismáticas e trabalharam tão lindamente no disco “Carolina do Hebo”.
O disco terá 12 faixas musicais, cantadas em português, ngoya, kimbumbu.
Por exemplo, “Babilónia” é um dos temas cantado em português e ngoya.
O “Scania 111”, em ngoya, “Margarida”, em kimbumbu, “Minga”, também em kimbundu. Temos o “Kwéle Kwéle”, interpretado em lingala, “António” em ngoya.
Em que incidirá o seu próximo projecto, após o lançamento do disco?
A grande prioridade neste momento é mesmo o disco. Estou com muita ansiedade de poder lançá-lo e poder seguir com outros pormenores que este mesmo disco poderá pedir.
Como está Man Próle quanto a concertos?
Nem tantos, mas tenho estado a actuar. Desde que coloquei as novas músicas em promoção, tem havido alguns espectáculos.
Tenho sido convidado para outras províncias, especialmente a do Cuanza- Sul e desde que vim de Lisboa, em 2019, estive no Uku Seles, por duas vezes, estive também Sumbe, por duas vezes, em Calúlu, no Fest Calúlu, no Fest Quibala.
Estou sempre neste circuito. Em relação a espectáculos aqui na capital, também tenho sido convidado algumas vezes mas, são poucos. Acredito que, depois de lançar o disco, as coisas possam vir a mudar.
“Devo dizer que o ano 2023 foi do reinício da minha carreira musical”
Com certeza. Depois do lançamento do disco, seguir-se-ão, por exemplo, as vendas. De uma ou de outra maneira, quando se trata de um disco do tipo de música que cantamos, tratando-se de nós próprios, no contexto físico, é importante que comprem este disco para ficar nas prateleiras, servindo de recordação.
Nunca é tarde para alguém adquirir uma obra de grande dimensão no contexto histórico e cultural. É importante que as pessoas comprem o disco, para que tenham algo como relíquia amanhã.
Em jeito de balanço, como foi para si o ano de 2023 em termos de actividade?
2023, por mim, foi um ano de muito trabalho e de vitória. Trabalhei imenso e depois de ter vindo de Lisboa encontrei algumas dificuldades no que a finalização do disco diz respeito.
O Senhor é tão generoso, (…), felizmente, neste mesmo ano, a quando das minhas entrevistas à comunicação social, fui chamado por uma pessoa que consentiu o sacrifício que tenho estado a fazer.
É o caso do Doutor Bruno Agostinho a quem eu agradeço mais uma vez. Devo dizer que o ano 2023 foi do reinício da minha carreira musical, da minha carreira artística.
Qual foi a banda que o acompanhou na gravação dos temas?
As primeiras bases estiveram a cargo da Banda Chamavo, sob direcção de Charlles Mbuya. Portanto, foram uns dos génios na preparação das bases musicais.
Foram eles que me impulsionaram a ter a coragem de me deslocar até Lisboa e ter gravado o disco “Carolina do Hebo”, conforme está. Gostei e agradeço ao Betinho Feijó, que até à data presente está totalmente engajado.
É uma pessoa que também está a acreditar na produção e está a trabalhar com muito amor. Agradeço muito a sua coragem.
Qual é o ponto da situação actual da Banda Chamavo e como estão hoje os seus integrantes?
A Banda Chamavo, lamentavelmente, está extinta. Pela dimensão que tinha, eu, o António Paulino e o Robertinho, pensamos e acreditamos que um dia há-de voltar, há-de reerguer-se.
Foi uma banda muito grande e todo o mundo acarinhava.
Uma banda genuinamente de semba, kizomba e de outros géneros de música de base africana.
Quem tiver dinheiro, quem estiver em condições de cativá-la, nós agradeceríamos imenso para que voltasse a ser ouvida. Sentimos muito.
Esta é a maior intenção dos seus integrantes?
Este é o maior desejo dos elementos que a integravam. Hoje sentimos muito esta ausência da banda. Recordamo-nos dela e o público cobra-nos bastante.
Ainda que não seja dirigida por nós, aparecendo uma banda como aquela, seria muito melhor.
Que mensagem deixa ao público que sempre acreditou em si e na banda?
Que estejam sempre firmes. Eu estou aqui e todo o cuidado tem sido pouco, sobretudo no que diz respeito à minha condição física, na qualidade de ser um servidor de uma certa população fascinada com a música angolana.
Devo dizer que, se vivo até à data presente, é graças a vossa existência e o apoio que nos têm dado quando cantamos para todos vocês.
Da mesma forma, agradecer também a todos aqueles que apoiam a música nacional, a música que nos identifica como Nação.
Que deixemos de imitar outros estilos que em nada nos identificam. Procuremos apostar um pouco mais nos nossos próprios ritmos de modo a que amanhã sejamos respeitados e tenhamos uma forma de distinção cultural.
Não queira dizer que seja subir ou denegrir a cultura de outros povos, mas devemos defender os nossos hábitos e costumes para que sejamos respeitados na nossa própria terra, sob pena de virem os estrangeiros amanhã e dizer que esta terra não é vossa.
Como era constituída a banda e quem eram os vocalistas?
A Banda Chamavo era constituída por eu Proletário, António Paulino, Robertinho, Pira Kanda e Manuel Domingos, vocalistas.
Integrava os instrumentistas Habana Maior (tumbas), Carlos Charles (guitarra solo), Pedro Santos (guitarra ritmo), Isaac Capachita (viola baixo), André Alfredo (teclado) e Kaká Cristiano (bateria).
Qual é a percepão que tem da música angolana actualmente?
É o que acabo de dizer, a música até certo ponto tem estado a evoluir com aqueles que apostam fortemente no semba, no kilapanga, em tudo aquilo que nos identifica.
Interessa-me muito pouco aquela música alheia produzida em Angola, uma música importada que não nos interessa muito.
Precisamos apostar na nossa própria cultura, temos exemplos dos outros povos. Apostam muito na sua própria música e dão muito pouco espaço à música estrangeira.
Falando dessa situação, também podemos entrar um pouco na questão dos direitos de autor.
Se nós não estivermos a consumir a nossa música e estivermos a consumir a música estrangeira, os direitos de autor vão beneficiar os estrangeiros e não o nacional.
Neste contexto, o nacional vai-se empobrecendo, ficando sem poder amanhã investir no seu próprio país, por não ter espaço. Parecendo que não, é muito grave, caso venha a ser estudado profundamente