Sobre siameses em Angola não é o primeiro caso, a 5 de Setembro de 2015, no município do Lobito, província de Benguela, nasceram gémeas unidas pelo abdómen e que partilhavam o mesmo fígado. Foram separadas no Hospital Geral e, hoje, com 2 anos e 7 meses de idade, gozam de plena saúde
Texto de: Zuleide de Carvalho
Na manhã de 5 de Setembro de 2015, Maria Sandombe entrava na sala de partos da Maternidade do Lobito com dores que indiciam a vinda das gémeas, que desconhecia serem siamesas. Nas ecografias feitas, escapou aos médicos a união abdominal das bebés.
Horas depois de a bolsa ter rebentado, registou-se que os bebés não estavam na posição correcta, uma vez que tentavam sair do útero de pés. Foi levada ao bloco operatório para a cesariana. Na sala de espera, com a sua mãe e a sogra, Enoque Sikuete Kapari, o marido, recebe a notícia de que as gémeas já tinham nascido e que eram siamesas (unidas pelo abdómen), dizendo- lhe que uma estava morta e, pela ligação que tinham, mantinha a outra viva.
As avós, que eram acompanhantes, puseram-se aos prantos, enquanto Enoque preferiu orar. Passada cerca de uma hora, tomaram conhecimento de que ambas estavam vivas, mas fragilizadas, e foram submetidas ao suporte de oxigénio, enquanto a maternidade tratava da sua transferência para o Hospital Geral de Benguela.
A dedução da enfermeira de que uma delas estava morta deveu- se ao facto de esta não ter chorado aquando do seu nascimento, nem ter mostrado dinamismo, diferente da outra.
Mãe ficou 5 dias sem saber que eram gémeas siamesas
Para não preocupar Maria, os médicos e enfermeiros omitiram a condição das filhas, dizendolhe apenas que estavam no berçário ao lado, quando, na verdade, já tinham sido transferidas à cidade de Benguela. Maria permaneceu 5 dias na Maternidade do Lobito, sem saber que as filhas nasceram unidas pelo abdómen e que partilhavam o mesmo fígado.
Entretanto, passado este tempo, foi-lhe contada a verdade pelo marido e a reacção não podia deixar de ser esta: “chorei, e pensei que se era só a pele que estava colada, não devia ficar tão assustada”, declarou. Criou-se uma equipa multidisciplinar para avaliar o quadro clínico e os riscos da cirurgia de separação.
A 12 de Setembro daquele mesmo ano, no Hospital Geral de Benguela, os cirurgiões Eduardo Kedisobua, angolano, e Osmery Castilho, cubano, operaram com sucesso as gémeas siamesas. Por ter sido uma vitória, a cirurgia, os pais decidiram baptizar as gémeas com os nomes Victória Eduarda e Victória Osmery, também em homenagem aos cirurgiões. Hoje, separadas há dois anos e sete meses, as Vitória de Benguela são crianças saudáveis que seguem à irmã, Dicla Amélia Kapari.
‘Uma tempestade nas nossas vidas’
Eduardo Kedisobua, um dos cirurgiões que separaram as gémeas, garante que as meninas gozam de boa saúde. Após a operação de separação, as gémeas ficaram com uma hérnia. Todavia, o organismo das crianças recuperou de forma autónoma, curando as hérnias de ambas.
Logo, as siamesas Vitória, de Benguela, não precisaram nem precisarão de nova cirurgia. Para os pais, a data do nascimento das filhas, gémeas siamesas, nunca lhes sairá da memória, pois, um dia que era suposto ser de imensurável felicidade, revelou-se extremamente doloroso, angustiante e traumático.
Enoque Kapari, o pai, recorda que “o 5 de Setembro é um dia difícil, tinha apenas 25 anos, foi um peso, uma tempestade nas nossas vidas… não estávamos preparados. Naquele dia, tornei-me mais homem”.
A intervenção cirúrgica de separação de gémeas siamesas benguelenses foi o terceiro caso registado em Angola e o primeiro ocorrido nesta província, sendo um trunfo na história do maior hospital provincial.