Segundo registos da Polícia de Viação e Trânsito, no período compreendido entre Janeiro e final de Outubro de 2017, o total de vítimas mortais nas estradas da província de Benguela remete a 222 cidadãos
Benguela está no pódio nacional da sinistralidade rodoviária. Localmente, apesar de serem sobejamente conhecidas, as vias terrestres mais propensas a acidentes e suas causas, o número tende a não reduzir. Assim, o acto central nacional da efeméride do Dia Em Memória às Vítimas de Acidentes de Trânsito celebrou-se nesta província do litoral de Angola, às 12h, com um minuto sem tráfego numa das estradas.
O intendente Francisco Tchango, chefe do departamento de segurança rodoviária da Direcção Provincial de Viação e Trânsito em Benguela, comunicou que até ao fim do último mês faleceram 222 pessoas em estradas Benguelenses.
Saliente-se que, só no mês de Outubro, 27 indivíduos perderam a vida nas vias rodoviárias de Benguela, de 102 acidentes de viação que causaram também 148 feridos. As estatísticas provinciais, relativas aos últimos dez meses de 2017 apontam 887 feridos, resultantes de 745 acidentes que mancharam as estradas com o sangue de 222 pessoas, a maioria entre 13 e 45 anos de idade.
Troços perigosos e causas dos acidentes mortais
Curiosamente, a Estrada Nacional número 100, que liga o município sede, Benguela, ao Lobito, é das poucas no país controlada por radar. De igual modo, é a que mais acidentes fatais tem registado na província.
E, por mais incrível que pareça, a causa principal dos acidentes mortais, e não só, ocorridos em Benguela, é o excesso de velocidade e, não obstante a presença dos radares, sucedem nesse mesmo percurso asfáltico. Confirmando tais informações, o intendente Tchango expressou que no índice de sinistralidade rodoviária actual “destaca- se o município de Benguela, com 41% desses acidentes, seguindo- lhe o Lobito e a Catumbela.”
“Há muitas pessoas a acelerar, desrespeitando os limites estabelecidos”, acusou o intendente. Como segunda causa dos acidentes, apontou “a falta de perícia, de precaução” e “o mau atravessamento da via.” Nos registos dos três primeiros trimestres de 2017, em que sucederam 195 óbitos de vítimas nas estradas de Benguela, 93 desses falecidos resultaram de atropelamentos mortais. Assim, “os atropelamentos provocam mais óbitos”.
“Os pedestres fazem a travessia em locais não recomendáveis, sem a segurança devida” e, juntado- se-lhe “o excesso de velocidade dos automobilistas”, a combinação é mesmo letal, tal como os números comprovam. Os taxistas estão implicados em inúmeros acidentes, como ocorreu no mês de Outubro, em que duas munícipes perderam a vida, no troço considerado mais perigoso, Benguela – Lobito, onde também faleceu Carlos Gomes, em Agosto último, na altura P.C.A. do C.F.B. Na perspectiva da Polícia de trânsito, segundo Francisco Tchango, os municípios do litoral benguelense lideram a taxa de acidentes, por serem as zonas mais populosas, concentrando a maioria dos estabelecimentos cujos utentes realizam um quotidiano muito intenso. “Colisões de veículos com motas acabam sempre em vítimas mortais”. Regressando às municipalidades do interior da província, o intendente Tchango realçou o Caimbambo como sendo aquele que mais acidentes regista, porque possui uma estrada nacional com muita circulação feita “por veículos pesados, de mercadorias e transportes públicos”. Quanto às vítimas e os causadores da sinistralidade rodoviária, são os motoristas de “veículos de duas rodas, o tipo que mais circula nestas áreas”, declarou. Todavia, esta realidade é preocupante porque os motociclistas “não estão munidos de carta de condução”, nem de “conhecimentos suficientes para circular na via pública” logo, “vão cometendo erros, que muitas vezes acabam em acidentes mortais”, considerou Tchango.
Parte considerável dos casos mortais não chegaram a tribunal
A Polícia registou 222 mortes nas estradas, de Janeiro ao Outubro de 2017, e o tribunal provincial de Benguela, recebeu, até Novembro, 144 casos de sinistros rodoviários, apenas 23 homicídios dos quais com culpa grave. O que leva a inferir que familiares, por vezes, não instauram processos nos tribunais quando perdem entes queridos nas es-tradas.
Como é o caso da família de Manuel Cambandje, morto por um camionista que se pôs imediatamente em fuga. Dos 144 processos que deram entrada no tribunal provincial de Benguela, 35 retratam acidentes com ofensas corporais com culpa grave. Do número total, 77 tiveram sentença, culminando em 57 condenações, 13 absolvições e 7 amnistias.
A dor de quem perdeu um ente querido na estrada
Manuel Camati ainda chora a perda do primo que em vida chamou- se Manuel Cambandje, falecido a 2 de Janeiro de 2017, com apenas 23 anos. Deixou esposa e filho, na altura com um ano. Manuel Cambandje era mototaxista de profissão e pescava de vez em quando.
No dia seguinte ao Ano Novo passou a tarde com a família alargada, no bairro Quioche. Ao cair da noite, resolvendo regressar à casa, para junto da esposa e do filho, nas proximidades do bairro 11 de Novembro foi colhido, na sua motorizada, por um camião que se pôs em fuga. Narrando a trágica circunstância do homicídio do primo, Camati relatou o que ouviu dos residentes nas imediações da zona do acidente mortal: “quando pensava atravessar a via, deparou-se com um camião que o rompeu mortalmente”.
Os cidadãos que naquela noite acorreram ao local, despertados pelo grave estrondo do acidente, recuperaram do cadáver os documentos que lhes ajudaram a perguntar no bairro mais próximo se eventualmente o conheciam, enquanto a Polícia removia o corpo. Na manhã seguinte, um vizinho entregou os documentos do falecido à esposa, que à família que com ele convivera na tarde anterior, comunicou que Manuel Cambadje não chegara a casa porque fora morto na estrada.
“Quem atropelou fugiu”, lastimou Camati. No dia seguinte, ao tomar conhecimento, “nem procuramos fazer mais nada, o fugitivo está foragido, não pusemos o caso no tribunal, não sabíamos se ainda se podia fazer uma investigação criminal.” Camati refriu que a sua família, ainda enlutada, está mais alerta nas estradas de Benguela pois, “os perigos são enormes, as vias não são iluminadas e as vidas vivem sob risco permanente”, lamentou.