No bairro do Caluco, arredores da cidade do Cuito, ergue-se um projecto de electrificação que vai produzir as famosas energias limpas, que, segundo projecções das autoridades locais, vai permitir mais de 10 mil ligações domiciliares, aumentando, também, a capacidade de oferta na província do Bié.
No terreno, homens e máquinas esmeram-se para que, até ao primeiro trimestre de 2025, tudo esteja a posto e se introduza, em termos de capacidade instalada, 14, 62 megawatts de energia limpa, na base de compromissos as- sumidos pelo Estado angolano na arena internacional, que sugere a opção por energias amigas do ambiente.
É a pensar na electrificação de Angola, com destaque para as províncias do corredor do Lobito, que o Estado norte-americano investe 1, 5 mil milhões de dólares. No Cuito, ultimam-se os preparativos rumo à garantia de energia eléctrica para milhares de famílias, sendo certo que a energia produzida lá vai beneficiar, igual- mente, milhões de pessoas fora do Bié, uma vez que o produto – tão esteja à disposição – vai ser automaticamente introduzido no sistema nacional.
Enquanto tal não acontece, o engenheiro angolano de construção civil Gélson Fernandes, director de projecto do parque, vai motivando a sua equipa de trabalho, a fim de que tudo quanto foi previsto no projecto, à luz do contrato milionário entre o Estado, representado pelo Ministério da Energia e Águas, na qualidade de dono da obra, e a MCA, seja, efectivamente, alcançado.
Ele explicou, momentos antes de ter sujeitado a equipa de reportagem deste jornal a uma visita guiada a parte considerável dos mais de 200 hectares do parque, que a execução do projecto anda por aí à volta dos 95 por cento de nível de execução.
Ou seja, nesta altura, procede-se apenas aos acabamentos. Cabos de baixa e alta tensão estão a ser todos instalados, edifícios para monitoramento quase prontos e, por ora, procede-se à ligação de quadros.
Ou melhor, todos os circuitos estão a ser ligados – conforme levantamentos feitos por este jornal no local. Ao lado de membros da sua equipa e da sempre bem disposta Maúda Bandeira, consultora/assessora de comunicação, levou-nos a conhecer o importante projecto, explicitando a sua especificidade do ponto de vista técnico.
Ao longo do percurso da visita, ora interagia com os funcionários, ora da- vnos a conhecer a natureza do trabalho e sublinhava a importância de cada acção em execução por técnicos multidisciplinares (pedreiro, electricista, carpinteiro, para citar apenas estes).
A dado momento, o engenheiro Gelson ateve-se próximo a uma escavação, cuja configuração se assemelhava a de um «pé de ga- lo». Tal destina-se à colocação de cobre e carvão para a instalação de pára-raios.
De entre outros equipamentos a serem montados, destaca-se os PB, aparelho responsável por receber a produção dos painéis e, consequentemente, mandá-la para a cabine eléctrica e, daí, para as linhas de transporte, até chegar aos consumidores.
Estão instalados 28.125 painéis solares bifaciais. Em rigor, em termos de instalação de painéis, conforme explicações técnicas, ficam apenas por colocar 725, reflectidos em sete linhas. Estão já instaladas algumas câmeras de vídeo-vigilância.
“O projecto está a bom ritmo. Os trabalhos decorem ao ritmo acelerado. Temos uma previsão de entregar a obra no primeiro trimestre de 2025”, vincou, ao sinalizar que estão a ser estendidas linhas de média tensão na ordem de 7 quilómetros e meio, cujo nível de avanço anda por aí à volta de 55 por cento.
Avaliado em 20.883.772 (vinte milhões e oitocentos e oitenta e três e setecentos e setenta e dois) euros, depois de concluído, cuja previsão, como se aferiu, aponta para o primeiro trimestre de 2025, constituir-se-á como que uma «lufada de ar fresco» para muitas famílias no município do Cuito, província do Bié.
Com essa empreitada, a cargo da MCA, sob fiscalização da DAR-Angola, criou-se 166 novos postos de trabalho, sendo que a prioridade, no que se refere ao recrutamento, recaiu para cidadãos locais. Neste momento, apenas 70 técnicos asseguram a conclusão do projecto, mas há uma tendência de redução, sobretudo quando o parque estiver a produzir energia. Apenas 50 funcionários encarregar-se-ão da sua manutenção.
A jovem Amélia Tomé é uma dos tantos jovens que vêem a sua participação na construção do parque fotovoltaico do Cuito como a forma de contribuir para o desenvolvimento sustentável do país. Foi por via de uma inscrição online, em virtude da publicação de uma vaga na rede social LinkedIn, que ela passou a fazer parte do quadro de pessoal da MCA. Depois de entrevistas técnicas online e presencial, a jovem é recrutada.
Inicialmente, como estagiária e, posteriormente, passou à efectiva e, hoje, nove meses depois, ela é directora-adjunta de obra. Numa primeira fase, a jovem engenheira civil confessa não ter sido difícil se adaptar àquelas circunstâncias técnicas, não tivesse ela acabado de sair da academia. Tal era o desafio que lhe esperava, o de participar na construção de um parque de energia solar.
“Foi muito difícil, no início, porque eu não tinha nenhuma experiência. E o tempo que fiquei aqui, ainda estou aqui, continuo a aprender”, confessa, garantindo estar a absorver também conhecimentos fora da sua área de formação académica.
“A parte eléctrica, parte mecânica. Então é como se fosse uma segunda escola. Aqui não há nenhum problema, não há discriminação”, admite Milhões que «produzem» em- pregos A MCA socorre-se de várias modalidades de selecção de candidatos para o seu quadro de pessoal, para construção e montagem de parques fotovoltaicos.
Primeiro, como é sabido, tem firmado convénio com instituições de ensino superior, por via das quais escolhe aqueles considerados de «melhores»; segundo, recorre a instituições como o INEFOP, para além de interessados que levam, volunta- riamente, documentos como forma de manifestar interesse por uma vaga.
A prioridade tem recaído para a «prata local». Alfredo Júlio também conseguiu o seu primeiro emprego, em virtude da construção do par- que fotovoltaico do Cuito-Bié. Ele contou, numa conversa com este jornal, ter ido parar à boleia do INEFOP.
O jovem é formado em carpintaria. Desempregado que estava, num desses dias, ele e mais colegas foram informados da intenção da construtora de recrutar pessoal para o projecto, tendo em conta a empreitada que se lhe tinha pela frente. Nessa altura, o seu nome já constava da lista daqueles com quem a MCA queria contar para materializar o aludido projecto energético. “Pronto, fui seleccionado e comecei a trabalhar”, explica.
De entre os jovens, há aqueles que se sentem bastante satisfeitos por estarem a contribuir para o desenvolvimento de Angola, participando na construção daquele parque. Um desses jovens é Manuel Senga, ajudante de pedreira. Residente no Cuito, tendo tomado conhecimento do recrutamento por terceiros, dirigiu-se ao estaleiro da empresa e remete os seus documentos pessoais.
Dias depois, recebe uma ligação para se apresentar à MCA e começaram. “Assim vi que o meu telefone estava a chamar e ligaram, a partir da obra, que a MCA estava a me chamar”, contou o jovem, que, com aquele jeito, saía do exército de desempregado e passou, deste modo, a dispor de uma renda mensal para sustentar a sua família. “Estou aqui há um ano”, revela.
Assim como Senga, Rufino Cassoma é outro jovem que viu na construção da fotovoltaica do Cui- to a oportunidade para o primeiro emprego. Carpinteiro de profissão, sente-se satisfeito por estar a contribuir para que o país mate- rialize compromissos assumidos internacional, no âmbito da produção de energia limpa, facto que dita o longo percurso do país rumo à transição energética.
“Para mim representa mesmo um desenvolvimento, não só para a província do Bié, mas até todos os angolanos”, sustenta o profissional. Ele acrescenta que investimento dessa natureza representa, em certa medida, um desenvolvimento sustentável, não tendo, por isso, dúvidas de que o país está no caminho certo.
O jovem diz ter batido à por- ta do emprego na MCA em Março de 2023. Inicialmente, não nutria lá grande esperança de que a sorte se lhe iria bater à porta, mas, volvidos mais de um ano, sente-se satisfeito por ser parte integrante do ambicioso projecto. “Graças a Deus, a direcção da empresa ligou e fizemos o teste e graças a Deus aprovamos”, explica.
Projectos sociais
Não só de parque se vive, há mais vida para lá da construção de infra-estruturas e montagem de placas solares. A empresa também vela pela componente social, tarefa de inteira responsabilidade de Sandra Evangelista. A empresa tem vindo a desenvolver uma série de projectos que visam ajudar várias comunidades.
Para além da construção de infra-estruturas sociais no Cuito, com destaque para uma escola de quatro salas de aula, estão, igualmente, em carteira a construção e consequente apetrechamento de um mercado no município do Bailundo, na vizinha província do Huambo. Para além dos projectos acima aludidos, Sandra Evangelista diz ter uma uma «mão» de cheia de outros. Ressalta-se, pois, o facto de maior parte dos materiais usados sobretudo para o apetrechamento “serem reciclados aqui mesmo no parque”, disse.
Parque electrifica mais de 10 mil casas no Bié
O Governo da Província do Bié tem no investimento de pouco mais de 20 milhões de euros a «lufada» de que se precisa para aumentar a oferta de energia para a população local. O director da Empresa Nacional de Distribuição de Electricidade, João Buco, não entra muito no cerne do projecto, com a alegação de não ser da alçada da sua instituição, todavia salienta que, por aquilo que se projectou, os mais de 14 megawatts vão permitir mais de 10 mil ligações domiciliares.
“Devia ser a PRODEL a falar, mas nós prevemos cerca de 14 mil ligações domiciliares”, revela o responsável, ao sinalizar que a existência de vários projectos de electrificação. Neste âmbito, o responsável ressalta que o Plano de Electrificação da província prevê, de entre outras acções, extensões da rede Cuito/ Catabola e, deste, para Camacupa (de 30 quilómetros), construção de uma estação de 20 MVA em Catabola.
“Ainda no âmbito deste projec- to, decorrem trabalhos de electrificação do município sede do Catabola, onde foram contemplados 26 PT, 10 dos quais de 160 kaveares e 16 de 100 kaveares“, pontualiza. A população local aplaude a iniciativa e, por conta disso, depositam confiança no parque foto- voltaico, ciente de que tal vá inverter um cenário de apagões em alguns bairros no Cuito.
Eles admitem que, nos dias que correm, o quadro de fornecimento melhorou consideravelmente. José Dando sublinhou, numa curta conversa com este jornal, a importância. O jovem socorre-se, pois, de alguma prática para sustentar a tese de que, em muitos casos, a população do local onde se produz a energia nem sempre é a principal beneficiada.
A título de exemplo, na perspectiva de sustentar a sua tese, ele cita o caso do Lomaum, no município do Cubal, província de Benguela, onde a população ainda não se beneficia da energia produzida lá. Entretanto, quando o projecto do Cuito for concluso, vai ser necessário apostar fortemente nas linhas de transporte.
“Porque te- mos muita produção, agora o que falta mesmo é a questão do transporte”, ressalta. A questão levantada por José, ao que parece, foi já acautelada. As autoridades locais asseguram estarem a ser construídas linhas de transporte de média e alta tensão, de modo a que a quantidade de energia eléctrica chegue toda ao consumidor final, no caso o cidadão.
POR:Constantino Eduardo
ENVIADO AO BIÉ