O porta-voz do Caminho-de-Ferro de Luanda considerou perigosa a situação que ocorreu na última segunda-feira, em relação à morte do jovem de 27 anos de idade, que em vida respondia pelo nome de Bernardo Afonso, que foi colhido na linha férrea no momento em que “brincava de esquivar o comboio”.
Considerou um comportamento costumeiro em Viana, onde jovens se deitam no meio da linha férrea enquanto o comboio passa.
Augusto Osório afirmou que a situação é perigosa, inicialmente para integridade física, porque brincam num local proibido, dentro do ninho ferroviário do CFL, apesar de existir morro de vedação – este que tem sido vandalizado todos os dias, cuja situação resulta em colhimento e, muitas vezes, mortes.
Para evitar situações do género e não só, o Estado angolano está a construir um novo morro de vedação em toda a linha do CFL, até à entrada do Aeroporto Internacional Dr. António Agostinho Neto, bem como a construção de 15 passagens superior de atravessamento da linha férrea.
De acordo com Osório, para além destas medidas de prevenção para mitigar os riscos de colhimento, o CFL e outras instituições estão a trabalhar na sensibilização e educação cívica das comunidades, de modo que a sociedade tenha a percepção do perigo que representa desenvolver qualquer actividade no interior da linha férrea.
O CFL tem trabalhado com as escolas, organizações comunitárias de bairro, instituições religiosas e, a par disso, são promovidas acções de proximidade com a comunidade, onde são convidadas crianças residentes ao longo do corredor ferroviário para visita às instalações do CFL.
“Tendo em conta que quando se regista um colhimento numa primeira fase lamentamos a morte, a dor que causa nas famílias, a perda de um ente querido, no CFL, também se regista perda, muitos comboios costumam ser cancelados e na sua maioria os maquinistas chegam a ficar traumatizados”, disse.
Crescente número de jovens que enfrentam a vida sem propósito
De acordo com o especialista em comportamento humano, Euclides Filomeno, esta tragédia que envolveu o jovem Bernardo Afonso expõe, mais uma vez, um problema alarmante que vivemos em Angola: o crescente número de jovens que enfrentam a vida sem propósito, que se deixam levar pelas circunstâncias e que optam por um discurso de vitimização social.
Jovens com esta idade, disse, deveriam estar focados em criar caminhos próprios, assumir responsabilidades e superar os desafios de forma consciente.
“No entanto, muitos se recusam a responsabilizar-se pelos seus actos, preferindo culpar os outros – a família, os amigos, ou a sociedade – pelos seus fracassos e escolhas”, sublinha.
Euclides Filomeno acha que esta cultura de fuga à responsabilidade perpetua ciclos de imaturidade emocional e comportamental, que acabam por conduzir a situações extremas como a de Bernardo.
Por isso, defende ser urgente fomentar, na juventude, a capacidade de assumir os seus actos, enfrentar as consequências e encontrar soluções para os seus problemas, ao invés de procurar culpados.
Por outro lado, esta problemática está intimamente ligada ao ambiente familiar, segundo o especialista, pois muitos destes jovens crescem sem validação emocional suficiente, especialmente por parte dos pais.
“A validação – o reconhecimento dos sentimentos, das qualidades e do valor do indivíduo – é um alicerce fundamental na formação de uma personalidade segura e resiliente.
Quando esta validação é inexistente ou insuficiente, os jovens acabam por procurar aprovação na sociedade ou entre os amigos, tornando-se dependentes de validação externa para se sentirem valorizados”, disse.
Mesmo em casos onde os pais se sacrificam e fazem de tudo para proporcionar uma educação digna, não estão isentos de erros, de acordo com Euclides.
A ausência emocional ou a falta de orientação consistente, muitas vezes agravadas pelas circunstâncias sociais, podem deixar lacunas na formação dos filhos.
“E, ainda assim, há jovens que, mesmo recebendo todo o suporte, perdem-se no meio de uma sociedade que não os ensina a ter propósito, foco e responsabilidade pelos seus próprios actos”, aponta.
Finalizou dizendo que a tragédia de Bernardo não é um caso isolado, mas um reflexo de uma sociedade que precisa urgentemente de mudar.
A restauração das famílias, o fortalecimento dos laços afectivos e a promoção da auto-responsabilização entre os jovens são passos fundamentais para evitar que histórias como esta se repitam.