O advogado da empresa Angola Drill Company (ADC) SA entrou como assistente no julgamento que envolve os generais Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”, com o propósito de reivindicar a titularidade do terreno onde foi erguido o edifício CIF One Luanda e, em contrapartida, ficar com alguns dos 25 andares que o constituem
Heráclito Pedro, o defensor da referida empresa, requereu ao tribunal a junção aos autos de 16 documentos que sustentam a tese de que a sua constituinte é parte interessada no processo. E, por outro lado, que solicite a documentação sobre a titularidade do terreno para provar que é a legítima proprietária, de modo a juntar em outros processos que está a mover contra o Estado angolano por ter chamado para a sua esfera a titularidade de todo o património que pertencia ao grupo China International Found (CIF) Angola por alegadamente terem sido erguidos com fundos públicos.
A juíza presidente da causa, Anabela Valente, anuiu, na última sessão, aos pedidos da assistência, embora o foco do julgamento seja a acusação da prática dos crimes de burla por defraudação, falsificação de documentos, associação criminosa, abuso de poder, tráfico de influências, branqueamento de capitais e peculato.
Para convencer o tribunal, o advogado Heráclito Pedro contou que consultou o processo e verificou que não constam no processo os elementos probatórios da entrega dos bens ao Estado angolano, nem a mencionada homologação judicial.
Segundo apurou o jornal OPAÍS de uma fonte, o envolvimento da empresa CIF no referido terreno, que já serviu de parque de estacionamento para os funcionários das antigas instalações do Supremo Tribunal Militar e da Procuradoria Militar, ocorreu quando decidiu investir em Angola.
Ao circular pela Avenida do 1.º Congresso do MPLA, no município da Ingombota, próximo da antiga Assembleia Nacional, o magnata sino-britânico Sam Pa, detido na China desde Outubro de 2015 por crimes económicos e financeiros, interessou-se no terreno e terá abordado o antigo Chefe da Casa Militar do Presidente da República, general Kopelipa.
Cedência do terreno por via GRN aos chineses da CIF
Na época, este general havia sido nomeado, por despa- cho presidencial, para dirigir o Gabinete de Reconstrução Na- cional (GRN), que tinha como uma das missões manter contacto com o grupo CIF, por estar envolvido em muitas obras em curso no país.
Ao ouvir de Sam Pa que pretendia construir no local aquele que viria a ser um dos edifícios mais altos da capital do país, de 25 andares, o general Kopelipa terá anuído, autorizando-lhe a fazer o devido aproveitamento do terreno. Porém, de acordo com a nossa fonte, o malogrado Adérito Correia, um dos acionistas da referida empresa, terá informado ao então Chefe da Casa Militar que o terreno pertencia à sua família.
Só que, como as construtoras contratadas pela CIF Angola já tinham avançado com as fundações do edifício em causa, acabaram por dar sequência, tendo, para o efeito, celebrado um acordo com a empresa angolana Drill Company, na qualidade de titular do direito de superfície, no qual terá ficado plasmado que esta ficaria com alguns andares em troca da cedência do terreno.
Suposta burla à moda chinesa Depois de se concluírem as obras de construção, os gestores da CIF não honraram o acordo, deixando o sócio da referida empresa sem outra opção senão recorrer à justiça. Quando o Estado confiscou todo o património desse grupo empresarial chinês em Angola, os herdeiros de Adérito Correia intentaram uma nova acção judicial com o mesmo propósito por vislumbrar uma possibilidade de reaver a sua contrapartida.
Como o referido edifício já foi registrado como propriedade do Estado angolano, a Angola Drill Company moveu uma acção de reivindicação de propriedade contra o Estado e outra de anulação do registro de propriedade do terreno, por considerar que foram violadas as normas processuais na tramitação deste dossiê.
“Sucede também que, desde o ano de 2022, estão em curso duas ações propostas pela Angola Drilling Company contra o Estado angolano, ambas já contestadas pelo Ministério Público (MP). Verificamos, assim, a omissão nos autos destas acções que, de alguma forma, interferem ou condicionam a decisão a ser aqui proferida”, frisou Heráclito Pedro.
Segundo o causídico, na contestação apresentada na acção de reivindicação, a 4 de Novembro de 2022, o MP alegou, em defesa do Estado, a existência de uma declaração de entrega de bens reconhecida no tarialmenteno 2.º Cartório, um termo de entrega e recepção dos bens com certificado de autenticação e uma sentença homologatória daqueles documentos. Além disso, alegou a existência do registro predial do CIF One, no caso, a favor do Estado, suportado nos docu- mentos mencionados.
Entretanto, na sentença homologatória consta que o Ministério Público requereu a homologação dos acordos celebrados entre o Estado, na pessoa do Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), e o arguido Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, em representação da CIF Angola.
Heráclito Pedro disse que fizeram diligências junto do Serviço Nacional de Recuperação de Activos (SENRA) para consultar o processo de investigação patrimonial com o número 2/2020, a fim de dissiparem as dúvidas, mas lhes foi recusado, com a alegação de que todo o expediente deste caso já se encontra em posse do Tribunal.
Neste processo, em que, além dos dois generais, têm como arguidos o advogado Fernando Gomes dos Santos, o cidadão Yiu Haiming e as empresas China International Found (CIF), Plansmart International Limited e Utter Right International Limited, não está em discussão a titularidade dos imóveis, mas sim o consentimento dos crimes acima mencionados.
Ex-director da milionária CIF Angola diz estar na “penúria”
Adriano Suculete, advogado de Yiu Haiming, ex-director da CIF Angola, declarou, em tribunal, que o seu constituinte foi “despedido abusivamente” há alguns anos e que, neste momento, encontra-se sem família e sem meios de subsistência.
Para agudizar ainda mais a situação, segundo o causídico, o cidadão chinês está limitado a ficar apenas em Luanda, pois lhe foi aplicada há cinco anos, à semelhança dos generais Kopelipa, Dino e o advogado Fernando Gomes dos Santos, a medida de coação de liberdade sob termo de identidade e residência.
Yiu Haiming tentou demarcar-se de qualquer responsabilidade que possa recair sobre a mesma, alegando que na data dos factos ainda não fazia parte dos seus quadros de funcionários e que já não faz parte. “Todos os actos técnicos legais eram praticados pelo advogado contratado pelas duas empresas [Plansmart International Limited e Utter Right International Limited] que tinham uma única gestão”, frisou o advogado.
Segundo Adriano Suculete, o seu constituinte foi contratado para dirigir o grupo em 2017 e, durante a sua gestão, não praticou nenhum acto passível de ser responsabilizado civil e criminalmente. “Ele não é responsável civil e criminalmente pelos actos praticados pelos sócios ou por outros membros da administração actual ou anterior”, enfatizou.
De modo a sustentar o seu ponto de vista, alegou que nos autos consta uma deliberação datada de 2016 que faz referência de que os sócios do CIF, representados por uma só entidade, celebraram um contrato de trabalho com Yiu Haiming que passou a vigorar apenas no ano seguinte, com duração de alguns meses.
Porém, o seu trabalho em prol da empresa foi sendo notável, pelo que acabou sendo renovável durante vários anos, até a data em que foi afastado e viu todos os seus privilégios serem “diluídos” em consequência de uma acção judicial que culminou com a apreensão de todos os bens da sua empresa. De salientar que os dados em posse do tribunal indicam que, em função destes crimes cometidos pelos arguidos, o Estado angolano foi desfalcado em mais de mil milhões de dólares.