Sobral Fernandes e Esperança da Silva são duas das cinco mulheres que desempenham a função motoristas na empresa TCUL. Apesar da discriminação e as ofensas que sofrem, diariamente, não perdem a simpatia e contribuem para o desenvolvimento social.
POR: Afrodite Zumba
Sobral Fernandes e Esperança da Silva são funcionárias da empresa de Transportes Colectivos e Urbanos de Luanda (TCUL), há mais de 9 anos. Inicialmente começaram como cobradoras e depois de dois anos foram escolhidas para participar de uma formação para motoristas, na própria instituição. Segundo elas, a direcção adoptou esta iniciativa porque algumas das senhoras que exerciam esta actividade estavam a ser encaminhadas à reforma.
A formação durou cerca de um ano e seis meses. Neste período absorveram vários conhecimentos teóricos e práticos que as ensinaram a terem uma condução defensiva, de modo a salvaguardar a sua vida, a dos passageiros e de todos os utentes da via pública. No entanto, em momento algum lhes passou pela cabeça que diariamente estariam propensa a tanta descriminação. Sobral Fernandes contou a OPAÍS que no seu primeiro dia de trabalho, na nova função como motorista, fez o trajecto do Tunga à Mutumba.
No interior do autocarro estavam mais de 100 passageiros. Uns ficaram admirados ao vê-la ao volante e fizeram comentários que fizeram com que o nervosismo se apossasse de si. “ Mulher a conduzir? Agora é que vamos parar todos na baía. Esta senhora vai levar o autocarro até na praia? Vamos morrer hoje”, Lembrava sorridente. Entretanto, ignorou tais palavras e encarou o desfio. A presença de sua colega “dona Esperança”, que no referido dia serviu de sua guia, elevou a sua autoestima e a encorajou a cumprir a sua missão até ao destino. Actualmente, diz sentir-se tão confortável que quando está ao volante conduz com maestria a semelhança de Leonardo Da Vinci e Pablo Picasso em frente dos seus quadros.
“ Levanto a música para não ouvir insultos”
Apesar da sua experiência de sete anos, não faltam reclamações e comentários discriminatórios. A entrevistada diz que frequentemente alguns passageiros, sobretudo do sexo masculino, reclamam que conduz lentamente, e que o seu lugar deveria ser na cozinha ou em casa a cuidar dos filhos. Entretanto, explica que as regras da sua empresa não permite que transite a uma velocidade superior a 60 Quilómetros/hora. “Não excedemos esta velocidade porque no autocarro a maioria dos passageiros faz a viagem de pé. Imagine que transite em alta velocidade e faça travagens repentinas, o que sucederá, questionou, alegando ser um trabalho que exige muita responsabilidade. De forma a não ouvir as ofensas e retrucar com os passageiros, a nossa entrevistada disse que durante o trajecto Sanatório-Benfica, que executa diariamente, aproximadamente em 40 minutos, coloca música no autocarro. “ Os homens chamam-me de burra, dizem que tenho ilusão e as mulheres dizem que não querem ser transportadas por mim”, lamentou.
Porto seguro na família
É no seio da sua família e na convivência com os colegas que encontra forças para não desistir. Diariamente saí de casa, às 3h30, acompanhada do esposo, para que às 5h00 estar no local de trabalho onde permanece até às 12h00. Os pequenos ficam a dormir e quando acordam já não a encontram. Para compensar esta ausência, em algumas Sábados, acompanham- na. “Sentam no banco de trás e comentam com passageiros que a mãe está a conduzir”, detalhou. A actividade profissional é cansativa. No entanto, não a impede de cumprir as tarefas domésticas. Arruma, cozinha, cuida do marido e dos quatro filhos e ainda reserva tempo para se embelezar. “ Um dia cuido da roupa do meu esposo e dos meus filhos no outro cuido de mim. Vou ao salão, cuido da aparência para estar bonita e sentir-me bem”, disse.
A mulher sempre “ carregou”
“A mulher transporta uma vida durante nove meses no seu útero porquê não pode transportar passageiros”, está é a questão apresentada por Esperança Silva, motorista da TCUL também há sete anos. Segundo ela, apesar das críticas procura desempenhar com bom ânimo o seu trabalho, transportando os passageiros da Vila de Viana à Centralidade do Sequele, num trajecto que demora cerca de uma hora. “ Não há nada que nós mulheres não possamos fazer.
Quando mentalizamos algo, e fazemos com amor dá certo”, defendeu. No entanto, considera que apesar de a mulher continuar a lutar pela sua autoafirmação perante a sociedade, exigindo igualdade de género, os homens devem ser respeitados.“ Não há nada que não possamos fazer. Quando mentalizamos algo e fazemos com amor, dá certo”, sublinhou. Casada, mãe de três filhos, Esperança Silva disse que tudo faz para que haja harmonia no seu lar.
É na porta de casa que deixa a “mochila dos problemas e o stress do trabalho”. Quando transpõe a porta procura transmitir alegria e dar carinho aos filhos. “ Eles ajudam-me muito e quando não fazem determinada tarefa eu mesma faço”, disse sorridente. Ao concluir incentivou a todas as mulheres a não desistirem dos seus sonhos e a enfrentarem os desafios.