O novo relatório do UNICEF revela que 67 milhões de crianças não tomou uma ou mais vacinas durante três anos devido à interrupção dos serviços, causada pela tensão dos sistemas de saúde e desvio de recursos escassos, conflito e fragilidade, bem como diminuição da confiança. A não se ter cuidado, a próxima vaga de mortes poderá ser de mais crianças com sarampo, difteria, entre outras doença
Com base num relatório sobre imunização publicado recentemente pelo UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), a que o jornal OPAÍS teve acesso, a percepção pública da importância das vacinas para as crianças diminuiu durante a pandemia da Covid-19 em 52 dos 55 países alvo do estudo.
Houve uma diminuição da percepção da importância das vacinas para as crianças em vários países, após o início da pandemia, onde, na maioria dos países, as pessoas com menos de 35 anos e as mulheres foram mais propensas a relatarem menos confiança nas vacinas para crianças após o início da pandemia.
“A confiança na vacina é volátil e específica de acordo com o tempo, pelo que é necessária uma recolha de dados adicional e uma análise mais aprofundada para determinar se os resultados são indicativos de uma tendência a longo prazo”, diz o UNICEF, que garante que apesar das quedas, o apoio global às vacinas continua a ser relativamente forte.
O estudo “Situação Mundial da Infância 2023: para cada criança, vacinação” revela ainda que em quase metade dos 55 países estudados, mais de 80% dos inquiridos consideraram as vacinas como importantes para as crianças.
No entanto, o relatório alerta para a confluência de vários factores que sugerem que a ameaça de hesitação vacinal pode estar a crescer.
Estes factores incluem incerteza sobre a resposta à pandemia, acesso crescente a informação enganosa, declínio da confiança na perícia, e polarização política. “No auge da pandemia, os cientistas desenvolveram rapidamente vacinas que salvaram inúmeras vidas.
Mas apesar deste feito histórico, o medo e a desinformação sobre todos os tipos de vacinas circularam tão amplamente como o próprio vírus”, disse Catherine Russell, directora executiva do UNICEF.
Número de casos de sarampo superior A responsável enfatiza que estes dados são um sinal de alerta preocupante, pelo que não se pode permitir que a confiança na vacinação de rotina se torne noutra vítima da pandemia.
Caso contrário, a próxima vaga de mortes poderia ser de mais crianças com sarampo, difteria ou outras doenças preveníveis.
De forma alarmante, o declínio na confiança vem num período de maior recuo sustentado da imunização infantil em 30 anos, alimentado pela pandemia da Covid-19.
A pandemia interrompeu a vacinação infantil em quase todo o lado, especialmente devido às intensas exigências dos sistemas de saúde, ao desvio de recursos de imunização para a vacinação contra a Covid-19, à escassez de trabalhadores de saúde e às medidas de isolamento domiciliar.
O relatório de hoje[ontem] apresenta um total de 67 milhões de crianças não vacinadas, entre 2019 e 2021, com níveis de cobertura vacinal a diminuir em 112 países.
As crianças nascidas pouco antes ou durante a pandemia estão agora a ultrapassar a idade em que normalmente seriam vacinadas, sublinhando a necessidade de uma acção urgente para recuperar o atraso daqueles que não foram vacinados e evitar surtos de doenças mortais.
“Em 2022, por exemplo, o número de casos de sarampo era superior ao dobro do total no ano anterior.
O número de crianças paralisadas pela poliomielite aumentou 16 por cento em 2022, numa base anual.
Ao se comparar o período de 2019 a 2021 com o período de três anos anterior, houve um aumento de oito vezes no número de crianças paralisadas pela poliomielite, salientando a necessidade de assegurar que os esforços de vacinação sejam sustentados”, lê-se no relatório.
Para enfrentar esta crise de sobrevivência infantil, o UNICEF apela aos governos para que redobrem o seu empenho em aumentar o financiamento para a imunização e trabalhem com os diferentes actores, para desbloquear os recursos disponíveis, incluindo os fundos remanescentes da Covid-19, de modo a implementar e acelerar, urgentemente, os esforços de vacinação.
Das 67 milhões de crianças que falharam à vacinação de rotina entre 2019 e 2021, 48 milhões não receberam uma única vacina de rotina, também conhecida como “dose zero”.
“As vacinas salvaram milhões de vidas e protegeram as comunidades de surtos de doenças mortais”, disse Catherine Russell. “Sabemos demasiado bem que as doenças não respeitam fronteiras.
As vacinas de rotina e sistemas de saúde fortes são a nossa melhor hipótese de prevenir futuras pandemias, mortes e sofrimento desnecessários.
Com os recursos ainda disponíveis da campanha de vacinação contra a Covid-19, chegou o momento de redireccionar esses fundos para reforçar os serviços de vacinação e investir em sistemas sustentáveis para cada criança”, finalizou.