A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou ontem no Fórum Económico de Davos que Bruxelas vai propor uma adaptação temporária das regras das ajudas de Estado e avançar com um fundo soberano europeu para manter a atractividade da indústria europeia
Discursando na 53.ª reunião anual do Fórum Económico Mundial, em Davos, na Suíça, Ursula von der Leyen dedicou grande parte da sua intervenção à “transição verde” rumo a uma economia neutra em carbono, fazendo um balanço dos esforços que as grandes economias mundiais estão a fazer a nível de investimento em tecnologias limpas, e assumiu a preocupação na Europa com o plano de subvenções norte-americano, no montante de 369 mil milhões de dólares.
“Não é segredo que alguns dos incentivos às empresas contemplados na Lei de Redução da Inflação (adoptada no ano passado pelos Estados Unidos) estão a causar alguma preocupação.
É por isso que estamos a trabalhar com os nossos amigos dos Estados Unidos para encontrar soluções, por exemplo para que as empresas da UE e os carros eléctricos fabricados na UE possam também beneficiar da Lei de Redução da Inflação”, disse.
Apontando que o “objectivo deve ser evitar qualquer perturbação do comércio e investimento transatlântico”, a presidente do executivo comunitário defendeu que as partes devem trabalhar “para as segurar que os respectivos esquemas de incentivos sejam justos e se reforcem mutuamente”.
“No centro da nossa visão partilhada está a nossa crença de que a concorrência e o comércio são as pedras angulares da aceleração das tecnologias limpas e da neutralidade climática.
E isto significa que nós, europeus, devemos também fazer melhor para fomentar a nossa própria indústria de tecnologias limpas”, disse.
Reportando-se ao Pacto Ecológico Europeu, Von der Leyen explicou os quatro pilares do plano da UE para atingir a neutralidade climática em 2050, e, relativamente aos incentivos para o investimento em tecnologias limpas e o financiamento da sua produção, defendeu então que, “para manter a atractividade da indústria europeia”, a UE necessita de ser mais competitiva relativamente às ofertas e medidas de incentivo que estão actualmente a ser praticadas fora da União.
“É por isso que vamos propor a adaptação temporária das nossas regras em matéria de auxílios estatais, para acelerar e simplificar as coisas.
Os cálculos serão mais fáceis.
Os procedimentos serão mais simples. As aprovações serão mais rápidas.
Por exemplo, ofereceremos modelos simples de benefícios fiscais, assim como apoios direccionados para instalações de produção dentro de cadeias de valor de tecnologias limpas, para contrariar os riscos de deslocalização ligados a subsídios concedidos fora da União”, adiantou.
A presidente da Comissão prosseguiu afirmando-se consciente de que “as ajudas estatais serão apenas uma solução limitada, que apenas alguns Estados-membros poderão utilizar”, pois nem todos os países dispõem da mesma margem orçamental para ajudar as suas empresas, uma questão que tem suscitado preocupação entre muitos países da UE, que receiam uma distorção cada vez maior dentro do mercado único, face ao poderio económico de Alemanha e França.
“Se quisermos evitar um efeito de fragmentação do mercado único e apoiar a transição para tecnologias limpas em toda a União, precisamos também de aumentar o financiamento da UE.
A médio prazo, estabeleceremos um fundo soberano europeu, como parte da revisão intercalar do nosso orçamento (plurianual) no final deste ano”, revelou então.
Segundo Von der Leyen, “esta é uma solução estrutural que irá aumentar os recursos disponíveis para a investigação, inovação e projectos industriais estratégicos que são essenciais para alcançar o objectivo de emissões zero”.
“Mas como isto levará tempo, procuraremos uma solução transitória para fornecer apoio rápido e direccionado, onde for mais necessário.
Para este fim, estamos actualmente a trabalhar arduamente numa avaliação das necessidades”, disse. A dirigente alemã fez também várias referências às práticas da China, defendendo que, “quando o comércio não é justo”, as respostas da UE “devem ser mais fortes”.
“A China fez da promoção do fabrico e inovação de tecnologias limpas uma prioridade chave no seu plano quinquenal.
Lidera a produção global em sectores como os veículos eléctricos e os painéis solares, que são fundamentais para a transição.
Mas a corrida à neutralidade de carbono deve ser baseada em condições de igualdade”, disse, acrescentando que esse não é o caso.
Von der Leyen apontou que “a China está a encorajar abertamente as empresas de energia intensiva na Europa e noutros locais a deslocalizarem a totalidade ou parte da sua produção para a China, o que estão a fazer com a promessa de energia barata, baixos custos de mão-deobra e um ambiente regulador mais acomodatício”.
“Ao mesmo tempo, a China subsidia maciçamente a sua indústria e restringe o acesso das empresas da UE ao seu mercado.
Ainda precisaremos de trabalhar e negociar com a China, sobretudo para fazer esta transição.
Por isso, precisamos de nos concentrar na redução dos riscos em vez de nos dissociarmos. Isto significa utilizar todos os nossos instrumentos para lidar com as práticas desleais – incluindo o novo regulamento de subsídios estrangeiros.
Não hesitaremos em abrir investigações se acreditarmos que os nossos contratos públicos ou outros mercados são distorcidos por tais subsídios”, declarou.
Von der Leyen deixou uma mensagem de confiança na capacidade da UE para liderar a transição verde: “A Europa já tem tudo: talento, investigadores, capacidade industrial.
E a Europa tem um plano para o futuro. É por isso que acredito que a história da economia da tecnologia limpa será escrita na Europa”.