O educador infantil, António Marcolino, considera que a falta de creches e infantários estatais compromete a fase de arranque das aprendizagens da criança, ao ponto de condicionar o seu desenvolvimento cognitivo.
“Quando a criança não passa por instrução pré-escolar pode ver o seu desenvolvimento cognitivo condicionado, porque, antes dos cinco anos de idade, os miúdos passam por duas fases, designadamente a sensório-motor, que acontece de zero aos dois anos e a da pré-operatória, dos dois aos sete anos.
Isso quer dizer que, nessa faixa etária, a criança deve aprender mais por aquilo que os seus órgãos de sentido alcançam”, explicou o especialista, realçando que é o período menos preenchido com processos de orientação.
António Marcolino apontou as actividades de manuseio como sendo as mais aconselháveis para a considerada primeira fase de aprendizagem, onde a criança deve ver, pegar, apalpar, cheirar e, em certos casos, provar, enquanto vai ensaiando o seu sistema auditivo.
“E como se pode verificar, a segunda fase de desenvolvimento da criança vai atingir os seus primeiros passos da idade escolar, sobretudo da Iniciação, 1.ª e 2.ª classes, e o miúdo, nessa altura, já faz algumas perguntas com alguma lógica, para descobrir a razão do mundo que o rodeia, o que lhe permite aprimorar, paulatinamente, a linguagem”, salientou o educador.
Segundo o entrevistado, não é por acaso que no primeiro ciclo do ensino primário (na 1.ª e 2.ª classes) se recomendam muitos exercícios de observação e manuseio, que devem seguir com brincadeiras orientadas que facilitem as aprendizagens.
Por causa disso, o instrutor de infância recomenda que se apetrechem as poucas creches existentes no país que ainda absolvem os infantis das famílias teoricamente mais carenciadas com brinquedos e outros materiais didácticos propícios para a prossecução dos estágios de desenvolvimento.
Outra situação avaliada pelo professor teve a ver com o facto de a inserção de um filho na creche ser, actualmente, como uma oportunidade, quando podia ser como um direito.
Por isso, ele encoraja o Governo a expandir a rede das referidas instituições de ensino, bem como dos jardins-de-infância.
Urgente iniciação nas escolas estatais
António Marcolino está também preocupado com a falta da classe de iniciação na maioria das escolas públicas, porque, para si, esse fenómeno reduz ainda mais as alternativas para compensar a falta de creches.
“Com salas da Iniciação nas escolas estatais, os professores ainda tinham a possibilidade de recuperar algumas instruções que as crianças não tiveram na creche, como são os casos da orientação de identificação de objectos, de cores e definição de movimentos e luzes”, realçou António Marcolino, para quem a criança era reciclada aí, antes de seguir para a 1.ª classe.
Questionado se um ano lectivo da Iniciação era suficiente para preencher o vazio de uma creche cujo processo de acompanhamento podia durar entre dois e quatro anos, o educador de infância reconheceu que a ideia não é substituir, mas adiantou que a identificação de algumas carências, nesse ciclo estudantil, fornece aos educadores grandes possibilidades de reverter o quadro das necessidades dos infantis.
Estágios desajustados
António Marcolino considerou o desajuste etário dos estágios de desenvolvimento como a primeira consequência que a criança pode sofrer, quando lhe falta a instrução pré-escolar ou outro acompanhamento do género.
“Esse déficit pode ocorrer, sobretudo, na fase das operações concretas e das operações formais que ocorrem a partir dos oito anos.
Refira-se que, na terceira fase das operações concretas, que acontece dos oito aos 12 anos de idade, a criança desenvolve alguma capacidade para seleccionar elementos de características semelhantes, ao mesmo tempo que pode relacionar objectos que o meio lhe dá a ver.
O interlocutor de OPAÍS defende a necessidade do cumprimento de todos os estágios de desenvolvimento, na faixa etária certa, para não afectar a fase do operatório formal transitório para a puberdade.