A Polícia Nacional expulsou 46 efectivos em 2023 e 32 no primeiro semestre de 2024, envolvidos em corrupção e outras práticas indecorosas. A corporação continua a debater-se com a questão da disciplina por parte dos agentes, que volta e meia estão envolvidos em actos que não dignificam o serviço que prestam
Dois efectivos do Departamento de Investigação e Ilícitos Penais (DIIP), órgãos afectos à Polícia Nacional, foram detidos recentemente, em flagrante delito, no município de Cacuaco, em Luanda, quando tentavam extorquir 100 mil Kwanzas a uma empresa que presta serviço de protecção e segurança.
Estes efectivos do DIIP, destacados no bairro Mayé Mayé, no distrito do Sequele, entre os quais um sub-chefe e um agente de investigação, exigiram o pagamento de tal quantia financeira para liberarem uma arma de fogo que havia sido apreendida, segundo dados oficiais.
De acordo com testemunhas, tudo começou quando um vigilante de segurança da empresa em causa envolveu-se numa situação problemática, que desencadeou em confusão. O vigilante acabou por efectuar alguns disparos, mas sem causar quaisquer danos.
Na sequência do desentendimento em que este vigilante estava envolvido, efectivos do Departamento de Investigação e Ilícitos Penais (DIIP) intervieram, levando consigo a arma usada pelo vigilante. Na tentativa de a empresa reaver arma apreendida pelo DIIP, foram surpreendidos com a solicitação dos documentos do artefacto.
Por não terem conseguido provar que a arma usada estava devida- mente documentada, para a terem de volta, os efectivos do DIIP pediram 300 mil kwanzas, quantia essa que terá baixado até 100 mil kwanzas, após um curto período de negociação.
Na última sexta-feira, 16 de Agosto, o dia combinado para a entrega dos valores, enquanto se dava essa acção, o sub-chefe e o agente de investigação do DIIP acabaram detidos por efectivos afectos à Inspecção da Polícia Nacional.
A cena ocorreu numa das ruas do bairro Mayé Mayé e foi presenciada por transeuntes, na maioria moto-taxistas, criando, inclusive, um alvoroço.
Os acusados estão detidos nas celas da DIIP, onde respondem pelos crimes de associação criminosa e extorsão, sendo que, por essa altura, aguardam pela conclusão da instrução do processo para ser remetido ao Ministério Público.
Um total de 950 processos disciplinares
Estes dois agentes do caso recente registado em Cacuaco engrossam o número de agentes da PN que respondem por processos disciplinares, cujo desfecho muitas vezes acaba com despedimento.
Segundo o director-ajunto da direcção de Comunicação Institucional e Imprensa da Polícia Nacional, Manuel de Lemos Rodrigues, os 78 casos resultaram de 950 processos disciplinares, dos quais se aplicaram 22 despromoções, 28 multas, 23 repreensões, tudo em 2023. Já no presente ano, até ao primeiro semestre, foram demitidos 32 efectivos e multados 50.
De acordo com o subcomissário Mateus Rodrigues, a Polícia Nacional vai continuar a tomar medidas implacáveis nos casos em que a inspecção registe infracções, e as punições vão desde as detenções, corte de salário e expulsões.
Apelou mais uma vez aos cidadãos para que tenham a cultura de denúncia, pois sem isso fica impossível a Polícia autuar, deixando o número 117 para o efeito. Mateus Rodrigues apresentou estes dados, respondendo às preocupações dos camionistas aquando do incumprimento da medida de se desmantelar os controlos.
Mateus Rodrigues começou por esclarecer que, no léxico da Polícia, a palavra “controlo” não existe, é mais um termo militar. Segundo disse, o que a Polícia faz são medidas policiais que vão desde a criação de esquadras, Comandos Municipais e patrulhamento para prevenção rodoviária e de segurança pública, mas o uso de cones para barrar a entrada e saída de viaturas, como acontecia na localidade de Maria Teresa, Cuanza-Norte, e outros pontos, está proibido.
Por exemplo, disse, em zonas em que ocorre muita sinistralidade tem de haver polícia e isso vai continuar. O esclarecimento surge na base de denúncias de automobilistas, sobretudo camionistas que se dizem vítimas de extorsão nos controlos.
Extorquidos até 20 mil kwanzas por viagem
A prática é mais comum nalgumas estradas nacionais. Camionistas e condutores de carrinhas queixam-se de estarem a ser excessivamente “multados” pelos agentes reguladores de trânsito, e até extorquidos valores que chegam aos 20 mil kwanzas por viagem.
Manuel dos Santos, mais conhecido por “Defesa”, é proprietário de quatro camiões e, neste momento, viajou para a República Democrática do Congo.
Antes de partir, em conversa com este jornal, contou que, via de regra, quando têm viagem Luanda/Fronteira do Luvu, vão preparados para pagarem nos postos policiais. Lamentou ainda o facto de, em sua opinião, a medida de remoção dos controlos não estar a ser observada.
“O que passou a ser preocupante é a forma como os locais que serviram, ou ainda servem de controlo, sem razões que justificam, acabaram por se transformar em lugares para a extorsão de camionistas”, disse, para quem às vezes os produtos perecíveis estragam, porque chegam a passar noites nos controlos.
O caso retratado não é isolado. José Virgílio, com a sua carrinha, transporta produtos hortícolas de mulheres, da comuna da Funda, Luanda, para o mercado dos Kwanzas, neste percurso, denuncia, pode gastar oito mil kwanzas para distribuir aos polícias, e assim permitirem a prosseguir a marcha.
“Polícia não pode deixar de garantir a segurança rodoviária e pública”
Mateus Rodrigues, face às queixas que lhe foi dado a ouvir, reforçou que “é importante referir que os acidentes de viação são um problema sério em Angola, constitui a segunda causa de mortes, depois da malária, por isso, a polícia tem de trabalhar”.
O também porta-voz da Polícia Nacional assegurou que a preocupação com a segurança pública e rodoviária mantém- se e que a Polícia não vai deixar de exercer essa função, daí que, sublinhou, nalguns casos, as revistas em camiões se impõem, porque muitos passam com liamba dissimuladas debaixo dos produtos agrícolas, armas, e, noutros casos, carregam excesso de peso.
As principais causas desses acidentes incluem o não cumprimento das regras de trânsito, a condução sob o efeito de álcool, a fraca iluminação pública e o mau estado das vias.
Por isso, Mateus Rodrigues deixou claro que a segurança pública, tanto do ponto de vista da criminalidade quanto do rodoviário, deve se manter.
POR:José Zangu