No espaço do Memorial Agostinho Neto cabem alguns milhares de transeuntes. No dia 2 de Abril parecia grande demais para algumas dezenas que lá se deslocaram por uma causa. Mas no final todos disseram que está na hora de juntos olharmos com “olhos de ver” para um problema negligenciado: o autismo
POR:André Mussamo
O mausoléu António Agostinho Neto está desde Segunda-feira parecido com um foguetão azul mergulhado na atmosfera. Esta foi a forma encontrada para acompanhar a onda planetária de vários monumentos e edifícios relevantes serem iluminados de azul, como manda a iniciativa “Light it up Blue”, do projecto norte-americano Autism Speaks. Tudo isso, a propósito da jornada de 2 de Abril que é celebrada como o Dia Mundial da Consciencialização do Autismo, uma perturbação do desenvolvimento infantil que é ainda infelizmente um problema desconhecido para muita gente no mundo. Para juntar o útil ao agradável, o vasto espaço do memorial dedicado ao fundador da Nação, por toda a tarde de 2 de Abril até ao início da noite, quando acendeu os seus holofotes, serviu de parque infantil para um segmento de crianças que no dia-a-dia têm pouca oportunidade de se soltarem e desatar a brincar até dizer basta.
Os familiares, esses tiveram “um dia de muito trabalho”, porquanto crianças autistas “devem ser vigiadas” quando brincam dada a natureza do seu distúrbio que as leva às vezes a ignorar o perigo, a sentirem medo de coisas óbvias ou a fecharem-se no seu mundo. No final, o sentimento era de satisfação tanto para os que acabavam de fazer “plantão” como para aqueles que afluíram ao mausoléu para ouvir falar da causa. Os familiares revelaram a sua satisfação e o quanto tinha sido confortante partilharem uns com os outros as suas experiências, aliás um caminho que a Igreja Católica encoraja no seu pronunciamento a propósito da efeméride. “Todos os membros da família devem ser levados em consideração, não apenas os pais, mas também outras crianças, cujo desenvolvimento requer o máximo cuidado e atenção. Quantas vezes elas experimentam um sentimento de inadequação, ineficácia e frustração”, refere o Vaticano na sua nota.
“Deixei de pensar que eram crianças malucas”
Solange, Fernanda e Maria são alunas da escola Nossa Senhora Mãe do Bom Conselho na Praia do Bispo. Entraram no Memorial Agostinho Neto no âmbito do cumprimento dos seus deveres escolares. Revelaram que de início quando olharam para aquele grupo de petizes a ideia que lhes ocorreu é que se tratavam de “crianças anormais”. Mas depois de ouvir as explicações e uma rápida leitura a um folheto distribuído na ocasião “deixaram de pensar que eram crianças malucas”. “Até alguns são simpáticos”, contou uma das três meninas que não perderam a oportunidade de tirar algumas selfies para guardar e exibir. Revelam que aprenderam muito e que seria bom se lhes fossem proporcionadas outras oportunidades do género.
Figuras mundiais juntam-se à causa
As Nações Unidas celebram a efeméride sob o lema “capacitando mulheres e meninas com autismo”. O secretário-geral da ONU, António Guterres, aproveitou a data para lembrar a reafirmação do “compromisso de promover a plena participação de todas as pessoas com autismo na sociedade e garantir o apoio necessário para que estas possam exercer os seus direitos e liberdades fundamentais”. Nas comemorações do Dia Mundial da Consciencialização do Autismo, a ONU quer envolver mulheres e meninas com as organizações que as representam na formulação de políticas e decisões para abordar os desafios que elas enfrentam.
A Assembleia Geral da ONU realiza hoje uma série de eventos com destaque para debates com especialistas e activistas para discutir questões específicas de mulheres e meninas com autismo. Os temas em abordagem incluem os desafios e as oportunidades para o pleno exercício dos seus direitos em áreas como casamento, família e paternidade com igualdade de oportunidades. O Vaticano assinalou a data com um apelo a um “maior empenho” dos Governos e das instituições na inclusão social das pessoas que sofrem de autismo. São pelo menos 70 milhões em todo o mundo, de acordo com a Organização das Nações Unidas. O Papa Francisco uniu-se ao Dia Mundial da Conscientização do Autismo, convidando a rezar pelos que sofrem este transtorno, durante o Regina Coeli deste dia 2 de Abril, na Praça de São Pedro do Vaticano.
Segundo a imprensa especializada, o Vaticano divulgou uma mensagem por ocasião deste dia, assinada pelo Prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, Cardeal Peter Turkson, no qual assinala que “a Igreja, com suas obras, dá testemunho da sua atenção e solicitude para com as pessoas com autismo”. Para ele, “é fundamental que as nossas comunidades cristãs sejam casas nas quais todo o sofrimento encontre compaixão, nas quais toda família com o peso da dor e do cansaço possa sentir-se compreendida e respeitada em sua dignidade”. Sublinha que “é essencial estar activamente ao lado daqueles que são afectados pelos transtornos do espectro do autismo e as suas famílias, sobre as quais pesa uma quantidade enorme de trabalhos, às vezes insuportáveis”. Assim, o Cardeal Turkson propôs “construir uma aliança sólida entre sectores como a Saúde e a Educação”, de modo a “garantir a continuidade dos cuidados e da assistência ao longo da vida”.