O jornal OPAÍS traz a história de duas senhoras que vivem uma realidade dura por conta do cancro, uma distante dos familiares e sem recursos para se sustentar ou custear as despesas da patologia, e outra que busca suporte no seio familiar, apesar da desesperada procura por emprego para suprir as suas necessidades
A história de Patrícia Bumba Minher, de 41 anos de idade, é de “partir o coração”. A nossa equipa de reportagem não se conteve ao se deparar com ela. Patrícia tem cancro do colo do útero, diagnosticado no ano passado, mês de Setembro, depois de registar sinais como hemorragia intensa e muito cansaço.
Da sua terra natal, Lunda-Norte, veio de emergência para Luanda, e no Instituto Angolano de Controlo de Câncer (IACC), depois de confirmado o cancro, passou a fazer a quimioterapia (já com seis sessões), que por ser uma medicação invasiva teve reacções adversas, sobretudo falta de sangue. Porém, seguiu as orientações médicas e passou simultaneamente para a radioterapia (que já conta com 32 sessões). Em Luanda, ficou hospedada inicialmente na casa da sua futura cunhada, noiva do irmão, mas depois a família arrendou- lhe uma residência.
“A casa não tem condições nenhuma, a renda termina já no próximo mês, dia 1, e não tenho como pagar”, lamentou, Patrícia Minher, com o rosto coberto de lágrimas. Por conta das dificuldades por que passa, Patrícia pensa em trabalhar de modo a conseguir algum sustento, uma vez que a sua família, composta por nove irmãos, a maioria também enfrenta problemas de saúde. Mesmo com a sua condição, disse não ter problemas em desempenhar qualquer tipo de serviço, desde que seja digno.
Mãe de três filhos menores (13, 9 e 5 anos de idade), solteira, teve de os deixar sob os cuidados da avó, que também carece de cuida- dos médicos, e seu irmão, no município de Cambulo, vila do Nzagi. Patrícia Minher disse estar a registar melhorias, uma vez que sente isso. Chegou a questionar ao doutor se poderia ser operada, pelo que inicialmente a resposta foi negativa, já que o cancro tinha ocupado toda a região do útero.
Passados alguns meses, voltou a perguntar ao médico e a resposta surgiu com alguma esperança, factor que a deixou mais animada. ‘Cancro deixou de ser ficção’ Outra paciente, que enfrenta o cancro da mama, é Feliciana Sebastião Quima, de 33 anos de ida- de, que lhe foi diagnosticado em 2021.
Teve um choque e entrou em de- pressão, pois não acreditava que aquilo estava a acontecer consigo. “Apenas via nos filmes e novelas, sabia que o cancro era uma doença de risco, e ao tomar conhecimento que tinha, foi como se tivesse tomado um banho de água gelada”, sublinha. Depois de um tempo, com o apoio familiar, ajuda do psicólogo, os filhos, foi possível continuar a caminhar, apesar de que ainda não se sente firme na sua totalidade. As vezes ainda se isola, sobre- tudo quando faz a quimioterapia.
“O tratamento de quimioterapia é muito forte, já cheguei a pensar em desistir. Estou na quarta sessão, é muito agressivo, passei mal, não queria voltar ao IACC, mas não voltando a situação se agrava mais, o crescimento do cancro é maior”, disse. A patologia está a interferir de forma negativa na relação do casal, Feliciana sente que o esposo está a afastar-se de si, o que de certa forma contribui para o aparecimento do pensamento de desistência.
Forçada a abandonar o emprego por conta da doença
Feliciana trabalhava na área de restauração, era ajudante de cozinha, e antes de saber da sua condição de saúde tinha boa relação com a sua patroa, tanto é que na ausência desta era ela quem ocupava o cargo de chefia. As constantes ausências para ida ao hospital estava a interferir na sua actividade laboral, que chegava a ser três vezes por semana, e começou a ser descontada. Por conta da área de trabalho, foi orientada pelo médico a deixar de trabalhar directamente na cozinha ou mudar de área.
Pediu à chefe que lhe trocasse de sector, passasse apenas a servir e atender as mesas, ou mesmo lavar a loiça, mas infelizmente a sua proposta não foi aceite. “Sempre que tivesse de faltar, comunicava à patroa, ela sabia de tudo, tanto é que me dava algum adiantamento salarial para pagar alguns exames, chegou a apalpar a minha mama, sentiu o caroço, o seu tamanho, e ficou surpresa com a situação. Mas, infelizmente, não entendeu o facto de já não puder estar junto do fogão a cozinhar”, lamentou. De momento, Feliciana tem batido várias portas, para pedir emprego, mas sem êxitos. Sempre que vai solicitar, recebe um não como resposta, quando explica a sua condição.
Por esta razão, já pensou em ocultar a patologia, mas acha desnecessário, uma vez que acabará por ser descoberta quando se ausentar para as consultas e tratamento. Feliciana apela aos empregadores, sobretudo os privados, para que olhem para esta franja e facilitem a sua inserção no mercado de trabalho. “É uma espécie de terapia, quando um doente de cancro volta a trabalhar, a se ocupar com alguma coisa, ajuda bastante no processo de cura”, disse. Para além de cozinheira, Feliciana Quima também tem outras valências, tais como secretária, prestadora de serviço.