O presidente da Associação de Ajuda às Crianças com Hemoglobinopatia (ONG-AFATHA), Félix Rodão, disse que continua a crescer o número de pacientes com anemia falciforme, cujo diagnóstico clínico ainda é fraco e tem dizimado muita gente. Entre as principais vítimas estão as crianças e adolescentes, que morrem precocemente devido a causas associadas às infecções, malária e malnutrição
A drepanocitose afecta muitas famílias angolanas, pois que anualmente surgem mais de 15 mil novos casos da doença das células falciformes, em todo o território angolano. Neste número, segundo a ONG-AFATHA, não estão incluídos dados das demais 16 provinciais e localidades longínquas, onde o índice de mortalidade entre os menores até 6 anos se situa, actualmente, na ordem dos 70 a 80%.
De acordo com o presidente da Associação que ajuda às crianças com hemoglobinopatia, ONG- AFATHA, Felix Rodão, a doença falciforme manifesta-se, sobretudo, a partir dos três meses de vida e o seu diagnóstico precoce é feito na triagem neonatal com a realização do teste do pezinho ou com o exame da electroforese de hemoglobina.
Considera importante o retorno emergencial dos testes do pezinho nas maternidades, centros e hospitais públicos e privados, com o objectivo de se detectar a doença nas crianças logo ao nascer, bem como que se criem postos de cadastro estatístico em unidades sanitárias.
O quadro endémico da drepanocitose, disse o entrevistado, tende a crescer de forma assustadora, pelo facto de já não existirem no país exames acessíveis para todos — leis de obrigatoriedade de exames natais e pré-nupciais, por exemplo.
“Deve-se pensar na institucionalização de leis e políticas públicas para garantir a obrigatoriedade de testes neonatais nas maternidades e centros materno-infantis, antes da entrega do recém-nascido à família”, avançou.Entre as complicações da doença, estão a anemia crónica, crises dolorosas associadas ou não às infecções, retardo no crescimento e amadurecimento de órgãos, enfartes pulmonares, AVC, inflamações e úlceras.
Fruto da sua sensibilidade, pato- genicidade crónica, desconhe- cimento comunitário, sem ou fracas políticas/programas públicos para mitigação e informação, testes/reagentes para o rastreio ampliado, leis de combate ao estigma, sexualidade orientada e educação em cuidados primários de saúde nas urbanidades, escolas, igrejas, nas unidades sanitárias satélites, a doença de células falciformes e a malnutrição têm- se alastrado e gerado uma série de complicações às famílias.
Para o também médico, por conta do índice de desinformação comunitária e de uma resposta clínica fragilizada a má gestão e posicionamento familiar, sem mencionar o crescente comportamento estigmatizante e de pouca empatia contra a pessoa, a doença é ainda banalizada no nosso país.
Considera também que a taxa de prevalência da doença de células falciformes e da malnutrição em Angola, comparativamente ao da região da África Austral, é elevada. Félix Rodão reconheceu os esforços do Executivo no combate preventivo da cadeia de elasticidade da doença de células falciformes e da malnutrição, uma vez que organizam fóruns de reflexão para que futuramente se efective a criação de mais programas e políticas de inserção e mitigação precoce destes males na sociedade.
Jovens devem fazer teste de falciforme antes de formarem família
No caso da anemia falciforme, além dos doentes, existem também os portadores. A diferença é que, segundo o presidente da referida associação, um doente tem as duas hemoglobinas SS, enquanto o portador tem uma A e outra S (AS). O responsável achou importante passar esta informação porque o casal que é portador da doença (hemoglobina AS) pode gerar filhos com a doença, uma vez que, no acto da fecundação, o bebé possivelmente herdará as hemoglobinas S do pai e da mãe e vir a nascer doente (com SS).
“Este mesmo casal também pode gerar filhos com traços da doença, tendo em conta que a criança vai herdar a hemoglobina S do pai e A da mãe (AS), e nunca manifestar nenhuma complicação durante a sua vida”, disse. Pode ainda ser gerado um filho sem nenhum traço de anemia falciforme, pelo facto de o bebé herdar a hemoglobina A, quer do pai quer da mãe, e resultar em AA. Quanto às pessoas já doentes (hemoglobinas SS), fez saber que esses terão sempre filhos doentes. “Um homem que é SS, se fizer filho com uma mulher portadora, só terão ou filhos doentes ou portadores.
Nunca vão gerar crianças livres dos traços de anemia falciforme”, sublinha. Segundo o entrevistado, não convém que se façam filhos com pessoas do mesmo grupo, para cortar esta cadeia de transmissão ou, melhor, os novos casais devem ganhar o hábito de fazer exames pré-nupciais e evitar sofrimento e separações futuras, por terem gerado filhos doentes. A ONG-AFATHA tem realiza- do várias palestras com noivos e casados sobre a selectividade do par genético, com a intenção de evitar colocar ao mundo crianças com doença falciforme ou com eritroblastose fetal. Apela, de forma ampliada, à criação de programas para o exame da electroforese de hemoglobina aos jovens em idade matrimonial antes do alembamento e casamento civil.
O responsável fez um balanço positivo do plano de actividades desenvolvidas pela associação no período de dez meses, de Janeiro a Outubro do corrente ano, cujo foco foram as crianças, adolescentes e jovens com a doença de células falciformes e a malnutrição. Neste processo, encontraram várias dificuldades. Para a realização das actividades, foram for- temente desafiadores, por vários factores, uns de natureza filantrópica, mas que tiveram de continuar, mesmo com fortes níveis de ruptura de stock e carência da organização, resultante da falta de apoios, parcerias e voluntários ou patrocinadores a abraçarem a causa.