Adquiriram terrenos no espaço que, em tempos idos, serviu de bacia de retenção das águas do rio Cuanza e das chuvas, no escoamento para os mangais, vulgo salinas do Benfica. Agora dividem a ocupação das suas casas com as chuvas, sendo que alguns preferiram o abandono a partilha de suas propriedades
Por: Alberto Bambi
Alguns habitantes da zona limítrofe entre os bairros Jacaré II e Macuya, no município de Belas, em Luanda, estão a abandonar as suas habitações por causa das inundações provocadas pelas águas das chuvas, que atingem totalmente os seus aposentos e haveres. “Nessa área do bairro, quando está a chover, não dá para dormir, nem ficar distraída, porque, de repente, você se espanta a água já está a sair da cozinha para a sala e daí para os quartos”, disse a cidadã que se identificou apenas por Tina, tendo acrescentado que em 2016 e no ano passado teve de escolher entre salvar a documentação e os seus filhos.
Teresa, vizinha de Tina, que reside no Jacaré há mais tempo, interrompeu a amiga para emendar, declarando que tais ocorrências eram cíclicas e a intervenção da comissão de moradores tardava a chegar, porque os dirigentes dos subúrbios do Jacaré e Macuya tinham por hábito ignorar as suas responsabilidades, sob alegada confusão de limites. “Mas a nossa área pertence mesmo ao bairro Jacaré, porque é a última na passagem para Macuya”, assegurou Dona Tina, ao retomar o discurso.
Ela acrescentou que o vizinho ao lado abandonou a casa durante as chuvas de Março de 2017 e, até 31 Janeiro de 2018, dia desta reportagem, ainda não tinha voltado a parecer para ver o estado da sua casa. A moradora, que receia que a infra-estrutura abandonada se torne num recinto preferido de delinquentes, referiu que tal comportamento foi adoptado por uma série de famílias, ao ponto de algumas preferirem permanecer no bairro durante o período seco, que, segundo elas abrange os meses de Maio, Junho, Julho e Agosto, sendo que os mesmos acrescentam neste período os meses subsequentes até ao fim do ano, por ser a época em que, de algum tempo a esta parte, chove com pouca intensidade na cidade de Luanda.
Francisco Matias ocupou uma residência deixada por um cidadão que abandonou o bairro Jacaré em Março do ano transacto. Até hoje, espera que o proprietário, ou alguém ligado ele, apareça para negociar um possível arrendamento. “Estou até disponível a pagar os meses que já fiquei aqui, mas o dono não aparece, relatou o ocupante, tendo revelado que, apercebendo- se da sua boa-fé, muito recentemente, três cidadãos se fizeram passar por parentes do proprietário, mas não tiveram sucesso, porque ele cobrou a cópia do BI do invocado senhorio.
Preços baixos atraíram a população
Francisco Matias revelou a OPAÍS que a zona da lagoa, como é actualmente designada a área onde passou a residir, se tornou consideravelmente habitada em 2017, por causa dos baixos preços praticados por intermediários e donos dos referidos terrenos, que chegaram a estipular mesmo entre cem e 150 mil Kwanzas pr um espaço de 600 metros quadrados, vulgarmente designado de 20 por 30.
“Curioso, ainda é que a muitos foi permitido pagar esta quantia em duas prestações”, detalhou Francisco Matias, asseverando que as parcelas de terra são comercializadas preferencialmente no tempo seco. O interlocutor deste jornal confessou que tentou comprar um espaço, mas optou por residir aí sob regime de arrendamento de baixo custo, a fim de ganhar tempo para economizar o dinheiro para adquirir um terreno na área mais elevada do bairro.
Teimosia na base do sofrimento
Um membro da comissão de moradores do bairro Jacaré alegou que as famílias da área da Lagoa só estão a sofrer por insistência voluntária. “Hoje estão a lamentar pelo sofrimento que as chuvas estão a causar, mas, quando chegaram aqui, nós avisamos para não construírem ali, não quiseram ouvir-nos, ainda nos chamaram nomes, é só mesmo por teimosia que estão a sofrer”, sentenciou o membro da comissão que preferiu o anonimato, alegando que não tinha sido autorizado pelo coordenador para prestar qualquer depoimento.
Escusando-se também de avançar pormenores sobre a inscrição dos referidos moradores ou cadastramento de suas residências na base de dados da comissão, a fonte optou por um silêncio absoluto, introduzido pela expressão” até já falei demais”.
Transporte suscita contornos Pelo facto de os candongueiros cobrarem 300 Kwanzas do Benfica ao bairro Jacaré, os moradores da circunscrição do município de Belas, preferem tomar o táxi para o vizinho subúrbio de Macuya, via Benfica-Autódromo de Luanda e Mundial, cujo percurso fica orçado em 100 Kwanzas, no caso de se servirem de carrinhas ou camiões.
“O Táxi era mais barato quando se passava pela Unidade de Guarda Presidencial (UGP), mas, desde que estes interditaram o acesso ao bairro, os taxistas são obrigados a dar uma grande volta, que acaba por duplicar o trajecto inicial”, contou Domingas, de 55 anos de idade, observando que não devia espantar o facto de os homens do volante cobrarem por duas viagens.
Por causa dessa situação, os habitantes dessa região de Luanda pedem ao Governo que asfalte ou terraplane regularmente as estradas que dão acesso ao seu Jacaré, a fim de diminuir o esforço que a população empreende de manhã cedo e no fim da tarde e princípio da noite.
Energia e água quase chegaram
O velho de 87 anos de idade que responde por Bernardo Muquixi foi o primeiro coordenador do bairro Jacaré. Tudo o que ele queria durante os seus cerca de 20 anos de exercício do cargo era ver os habitantes deixarem de andar grandes distâncias para terem água e luz. “Porque naquele tempo, nós tínhamos de ir buscar água potável no Benfica e salobra no Tanque Serra, mesmo as pessoas que tinham tanque de água aqui, tinham de pagar muito para ter o líquido precioso em casa”, lembrou, tendo adiantado que os custos para a aquisição do líquido vital continuam altos, por que muitos estão a destruir ou adaptar os tanques para compartimentos de reserva de bens.
O ancião, que recordou ainda ter mantido contactos com o então administrador da Samba, Costa Gabriel, e o da comuna do Benfica, Raúl, informou que foi por via dessas entidades governamentais que o bairro, em 2005, ganhou um fontanário accionado por um gerador de energia.
“Mas esse fontanário só funcionou durante um ano e avariou o gerador, logo a seguir a mecânica da fonte de água, até hoje estamos assim”, lamentou o coordenador Muquixi, lembrando que, em Dezembro do ano passado uma empresa apareceu para devolver o referido bem para a comunidade do Jacaré, mas tudo o que conseguiu foi pintar a estrutura a azul.
No que toca à energia eléctrica, fala- se da entrada em cena de proprietários de postes de transformação (PT´s) que cobram por entrada, aos beneficiários, um valor de 150 mil Kwanzas.
Vale lembrar que os condutores de camiões-cisterna comercializam a água a mil e 500 Kwanzas por mil litros de água, sendo que para encher um tanque de 20.000 litros se gasta 30. 000 AKZ.