De acordo com uma fonte do Gabinete do Vice-Presidência da República, investigadores do SIC estiveram na instituição para analisar a autenticidade dos documentos que suspeitavam terem sido forjados por Celeste de Brito, antes de o processo ter sido transferido para a Procuradoria Geral da República
POR: Paulo Sérgio
A empresária Celeste de Brito, proprietária do Natrabank e do grupo Tamara, é acusada de ter forjado correspondência com o actual vice-presidente da República, Bornito de Sousa (na altura ministro da Administração do Território), com vista a facilitar a entrada dos expatriados suspeitos de pertencerem a uma alegada rede de burladores tailandeses que pretendia endividar o Governo angolano. Antes de ser detida, entre os dias 23 e 24 de Fevereiro do corrente ano, a empresária foi intimada “verbalmente” a comparecer nas instalações da Direcção Nacional do Serviço de Investigação Criminal (SIC), no dia 11, onde foi confrontada com alguns documentos que alegavam ter (ela) forjado. No dia seguinte, a 12 do mesmo mês, Celeste de Brito informou esta ocorrência a Alcino dos Prazeres Izata, assessor de Bornito de Sousa. “Pediram-me para não falar, mas penso o contrário, pelos seguintes motivos: primeiro, porque acho que não faz sentido nenhum e, segundo, porque julgo ser uma intimidação”, afirmou, sem sequer imaginar que viria a ser detida, dias depois, em companhia dos cidadãos estrangeiros sob acusação de terem cometido os crimes de associação criminosa, burla por defraudação e de falsificação de documentos.
Contou que os investigadores procuraram saber dela a relação que tinha com Bornito de Sousa, tendo-lhes explicado que tinha o E-mail pessoal dele e sobre os emails que alegou trocado quando surgiu a oportunidade de trazer os supostos investidores tailandeses da Centennial Energy para investirem 50 mil milhões de dólares em projectos de cariz social e humanitário em Angola. Segundo ela (aos investigadores), na altura, o governante ainda exercia a função de ministro da Administração do Território (actual Ministério da Administração do Território e Reforma do Estado). “A primeira carta de intenção que eu recebi, ainda estava em Taiwan, na China, e eles fazem referência à carta de confirmação. Ora, se é carta de confirmação, quer dizer que já haviam recebido daqui o request”, contou a Alcino Izata. Acrescentou de seguida: “Se eles tivessem alguma carta do vice- presidente da República, mesmo que fosse verdadeira ou falsa, não usaríamos o Fundo de Apoio Social (que é afecto ao ministério acima mencionado) nem a extinta Unidade Técnica de Investimento Privado, UTIP (órgão ligado à Casa Civil do Presidente da República)”. Em contrapartida, disse a Alcino que os investigadores cona frontaram com uma carta, sem data, que atestava que ela forjou e enviou ao governante para pedir garantias para este caso.
Na ocasião, disse ter esclarecido aos polícias que “o programa em que estou matriculada internacionalmente e o KYC (“Know Your Client, que em português traduz-se para Conheça o seu Cliente) com o qual trabalho”, considera crime trabalhar com garantias do Estado. Procedimentos como KYC são considerados de suma importância em qualquer negócio onde altas quantias de dinheiro podem ser utilizadas para mascarar a sua origem. “Não trabalho com garantias do Estado. Não trabalhei nunca com garantia do Estado. Antes ao contrário. O que apresento como proposta, a pessoa que vem trabalhar com o Estado é obrigada a dar participação dos lucros ao Estado e nunca a pedir garantias”, frisou. Disse ainda que após prestar tais declarações, questionou aos investigadores por que razão não foi formalmente notificada, quem a estava acusar e como é que o processo foi aberto. As autoridades, segundo ela, se limitaram a dizer- lhe que a denúncia surgira na Internet. “Disseram-me que não deveria tocar no assunto porque haveriam de descobrir, mas que existia uma carta-denúncia na Internet. Eu disse ao senhor que tenho o correio electrónico do vice-presidente”, contou a Alcino Izata.
Fim de validade do fundo
No dia da aludida reunião na Cidade Alta, completava 40 dias desde que um cheque de USD cinco mil milhões havia, suspostamente, sido depositado no Banco de Negócios Internacional (BNI), mas, segundo ela, os tailandeses não iam ao banco inteirar-se sobre o processo de validação. “Ele (Raveeroj Rithchoteanan) nem sequer foi ao BNI onde deveria fazer a requisição para trocar as chaves. Até hoje o banco de Angola não trocou as chaves. O que quer dizer que não está a vir dinheiro nenhum para Angola”, afirmou. Explicou ao técnico do gabinete de Bornito de Sousa que geralmente este processo dura apenas 25 dias úteis, a contar da data do depósito, no qual já está incluso o tempo concedido ao país beneficiário para reclamações. O que a motivou a tentar alertar as altas individualidades, mas sem sucesso.
“Neste período, já deveriam ter dado entrada dos projectos homologados pelo referido fundo público e pela UTIP para que a linha de crédito fosse aberta. Como não se fez isso, o fundo perdeu a validade”, declarou, contrariando a informação inicial de que o fundo ainda se encontrava aberto. Entre os arguidos que respondem em liberdade neste processo está o general Geraldo Sachipengo Nunda (chefe de Estado Maior General das Forças Armadas Angolana), Norberto Garcia (ex-PCA da UTIP e porta-voz do MPLA), Belarmino Van-Dúnem (ex-director- geral da APIEX), general José Arsénio (Cooperativa Njango Yetu) entre outros. Já os detidos na cadeia de Viana são Raveeroj Rithchoteanan, Monthita Pribwai, Theera Buapeng e Manin Wanitchanon (Tailandeses), Haillé Isaac Million (Eritreu), André Louis Roy (Canadiano), Celeste Marcelino de Brito António e Crhistian Albano de Lemos (Angolanos).
Alegada tentativa de convergência de interesses
De referir que está por esclarecer, entre outros assuntos, se Alcino Izata cumpriu a promessa de que se reuniria com o então PCA da UTIP, Norberto Garcia, para abordar este assunto e, na semana seguinte, a convocaria para outra reunião. “Vamos ver como é que podemos convergir os interesses entre as Forças Armadas, a sua empresa, a UTIP e o próprio Governo. Portanto, nós vamos trabalhar de forma concertada”, disse Alcino Izata no audio em posse deste jornal e que um funcionário da Vice-Presidência considera autêntico. Celeste de Brito sublinhou, na ocasião, que dera entrada, na UTIP, de uma “carta de divórcio” para desfazer a parceria, dois dias antes do encontro com Izata. “O que descarrilou cá dentro não tem problema, dá para nós arranjarmos, mas o que se está a criar no exterior do país é que será difícil contornar”, disse, aparentemente mais calma.
Por isso, sugeriu, de seguida, que deveriam contornar e os expatriados só trabalhariam com a UTIP e as instituições com as quais têm acordo firmado. “Portanto, todos os projectos, se forem das FAA, podem ser acomodados pelo fundo (que elaga ser o FAS) ou pela UTIP, através de projectos sociais”, disse. Alcino Izata acrescentou que fora isso que haviam acordado (ele e Celeste) inicialmente e que eles, as altas entidades, não a podiam tirar do negócio, por ser ela quem os trouxe. Garantiu que conseguiria atrair outros investidores para atender aos demais. Exibiu alguns documentos da Fundação. Cenntenial Energy (depreende- se do que diz) e garantiu que, para além do proprietário desta empresa, há um professor seu que tem mais do que o triplo do que o tailandês Raveeroj Rithchoteanan e pode fazer o mesmo tipo de investimentos. De acordo com uma fonte da Vice-Presidência da República, os investigadores do SIC estiveram nesta instituição para analisar a autenticidade dos documentos que suspeitavam terem sido forjados por Celeste de Brito, antes de o processo ter sido transferido para a Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal DNIAP, órgão da Procuradoria Geral da República, pelo facto de alguns dos envolvidos gozarem de tratamento especial. Disse ainda que a acusada e os tailandeses pretendiam, a todo o custo, ser recebidos pelos vice-presidente, ao que este negou, por não pretender envolver-se neste assunto.