Num passo significativo para a protecção de infra-estruturas e serviços essenciais, a Assembleia Nacional aprovou, na última quarta-feira, na generalidade, a Proposta de Lei dos Crimes de Vandalização de Bens e Serviços Públicos.
A nova legislação, que prevê penas de prisão de três a 25 anos para os responsáveis por actos de vandalismo contra equipamentos eléctricos, electrónicos, de comunicação, hídricos ou de saneamento, foi aprovada por unanimidade pelos 182 deputados presentes.
A proposta, de iniciativa do Executivo, destaca a necessidade de uma resposta robusta às frequentes violações que comprometem a segurança e a eficiência dos serviços públicos.
Conforme previsto na proposta de lei, as penas poderão variar dependendo da gravidade do dano e da natureza dos bens ou serviços afectados.
Para actos de vandalismo que causem danos significativos a infra-estruturas essenciais, como linhas férreas, rodoviárias ou náuticas, por exemplo, a pena pode chegar até aos 25 anos de prisão. Já para casos de menor impacto, as sanções variam entre três e oito anos de reclusão.
Além disso, a lei inclui medidas severas contra indivíduos ou grupos que financiem ou incentivem tais actividades criminosas, com penas que podem chegar a 15 anos de prisão.
A aprovação desta lei reflecte um compromisso firme do Executivo angolano em preservar a integridade e a funcionalidade dos bens públicos, essenciais para o desenvolvimento sustentável do país, conforme defendeu o secretário de Estado para o Asseguramento Técnico do Ministério do Interior, Carlos Albino.
O governante assegurou que a criminalização de tais actos é justificada tanto por razões de segurança nacional, quanto pela necessidade de garantir a sustentabilidade dos investimentos em infra-estruturas públicas.
Deputados aprovaram a medida
Na sua declaração de voto, o deputado da FNLA, Rui Malopa, justificou o voto favorável daquela bancada com o facto de a proposta de lei constituir “um instrumento muito valioso de que o Estado vai dispor, doravante, no combate às práticas de conduta e comportamento dos cidadãos que lesam o interesse público”.
“Este instrumento vai inibir a acção de todos aqueles que, no passado, levaram as carteiras de salas de aulas de instituições de ensino público para os seus colégios, que destroem torres de alta tensão, que desviam equipamentos médicos, de todos que se locupletaram do erário público em detrimento da maioria, passando a ser responsabilizados”, asseverou.
UNITA diz chega às vandalizações
Por sua vez, o deputado da UNITA, Joel Pacheco, fundamentou o voto favorável por “ter chegado a hora de pôr fim a condutas nocivas que atentam contra o bem e serviços públicos”.
“Votamos favoravelmente para que, no debate na especialidade, se possa enriquecer o diploma, tendo em conta que tem que se olhar para outros ângulos que julgamos ser importantes, tais como as prováveis causas que estimulam esse comportamento e estudar outras vias igualmente necessárias para se pôr cobro a esse mal”, rematou.
MPLA quer resposta energética à prática
Já o deputado do grupo parlamentar do MPLA, Pedro Neto, justificou o voto favorável pela consciência da necessidade de uma resposta mais proactiva e enérgica a este mal que grassa a sociedade, assente no combate baseado na prevenção e em ferramentas jurídico-legais, com o objectivo de “sancionar de forma competente os infractores”.
Pedro de Morais Neto vincou que “os prejuízos económicos e sociais são inestimáveis para as empresas públicas e não só”, defendendo, “sem desprimor para a importância da lei”, a necessidade de “usar a prevenção social como forma de reduzir as práticas condenáveis, através da implementação de políticas sociais consequentes”.
Especialistas defendem penas severas
O penalista João Gurgel ressaltou a importância de uma análise cuidadosa e equilibrada sobre a justeza da nova legislação, que impõe penas de três a 25 anos de prisão para crimes de vandalismo contra infra-estruturas públicas.
Na opinião deste jurista, o agravamento das medidas punitivas deve ser avaliado em função da gravidade da infracção e do impacto sobre os bens patrimoniais vandalizados.
“Imaginemos que um cidadão vá dinamitar uma central hidroeléctrica, causando enormes prejuízos para o Estado e afectar milhares de pessoas… Seria justo aplicar uma pena branda a este indivíduo? Claro que não!”, argumentou o causídico, sublinhado que, embora a severidade das penas deva ser relativa, a intenção é dissuadir os actos que causem significativos danos ao património público.
O penalista argumentou que a justiça das sanções previstas depende da avaliação do legislador. “Os bens suscetíveis de reparação não devem ser equiparados ao bem vida, mas cabe aos 220 deputados da Assembleia Nacional determinar a forma justa de punição. Se eles decidiram que essa é a maneira correcta de punir, temos que aceitar”, afirmou Gurgel.
Acrescentou que é crucial entender a posição do legislador, que visa punir com severidade para evitar a sensação de impunidade entre os prevaricadores.
João Gurgel concluiu destacando que as leis são de conhecimento geral e que os cidadãos que se envolverem em actos de vandalismo devem estar cientes das consequências legais.
“Se o cidadão se coloca na posição de vândalo, ele deve sentir o peso da lei”, disse o penalista. Já para o sociólogo José Lourenço, é essencial que comportamentos marginais sejam responsabilizados criminal ou civilmente, destacando que, em muitos casos, os actos de vandalismo não são isolados, mas organizados por grupos.
“São grupos bem organizados que planeiam estes actos e coordenam meticulosamente com os executantes. Penso que esta lei deve punir, sobretudo, essas pessoas ou grupos de pessoas que instigam estes crimes e os passam para que outros os executem”, defendeu o sociólogo.
Embora reconheça a necessidade de punição, este especialista considera que a moldura penal proposta pela nova lei é bastante pesada.
No entanto, acredita que o legislador agiu com base na gravidade dos danos patrimoniais e no impacto significativo que estas práticas representam para o Estado.
“É uma falta de patriotismo gritante por parte daqueles que assim se procedem”, afirmou José Lourenço, sublinhando também a deficiência do Executivo em formular políticas de educação patriótica para a sociedade.
Reconheceu os malefícios causados por estas práticas, que acabam por prejudicar a maioria da população, mas ressalta que o Estado também possui sua parcela de responsabilidade.
Empresas públicas com prejuízos de cerca de 600 mil milhões de kwanzas
Empresas públicas, como a ENDE, PRODEL, EPAL e CFL, obrigaram o Estado a desembolsar mais 700 mil milhões de kwanzas em manutenção e reposição de equipamentos.
De acordo com o porta-voz dos Caminhos-de-Ferro de Luanda (CFL), Augusto Osório, só nos primeiros cinco meses deste ano, o CFL já consentiu um prejuízo avaliado em mais de 13 mil milhões de kwanzas, incluindo a vandalização dos meios e os custos da paralisação dos mesmos.
“Quando se apedreja uma locomotiva, ela fica parada e, por conseguinte, sem render”, disse o responsável, esclarecendo que, via de regra, os criminosos vandalizam as diversas formas de pregação da linha férrea, apedrejam aos vidros das locomotivas e deposição de lixo ao longo da sua via de comunicação.
Entretanto, esclareceu que o processo de remoção do lixo ao longo da linha, orientado recentemente pelo Presidente da República, não forçará a paralisação dos serviços.
“Será feito mesmo com o serviço a decorrer, obviamente com um nível de comunicação muito elevada e bem coordenada”, explicou.
Outrossim, esclareceu que o CFL tem estado a trabalhar com os órgãos de defesa e segurança, mormente a Polícia Nacional, que se tem empenhado para a identificação e detenção dos criminosos.
Mais de 400 mil milhões de kwanzas na ENDE
Só no ano passado (2023), foram mais de 400 mil milhões de Kwanzas em prejuízo que a Empresa Nacional de Distribuição de Electricidade registou fruto de vandalismo e furtos de equipamentos da rede técnica de energia do país.
O director do gabinete de Comunicação, Marketing e Relações Institucionais da ENDE, Lauro Fortunato, revelou que foram furtados 60 mil metros de cabos, 300 armários de distribuição na via pública, 65 torres de alta tensão e 61 postos de transformação (PT), vandalizados pelo território nacional, nas províncias de Luanda, Bengo, Benguela, Lunda-Sul e Huíla.
Deu a conhecer também o derrube de 87 postes de média tensão, por automobilistas, associado aos danos causados por algumas operadoras de saneamento, na actividade de recolha de resíduos sólidos, sobretudo em Luanda. Em 2024, disse, os prejuízos vão já em mais de 5 mil milhões de kwanzas.
PRODEL perdeu mais de 200 mil milhões de kwanzas
Segundo dados fornecidos pelo gabinete de comunicação e imprensa da Empresa Pública de Produção de Electricidade (PRODEL-E.P), o valor total dos danos causados por vandalismo, relativamente ao ano de 2023, foi de AKZ 107.077.187,60 (cento e sete mil milhões e setenta mil, cento e oitenta e sete kwanzas e sessenta cêntimos).
Já o valor de recuperação ou reposição dos meios foi o equivalente em KZ 172.424.458,21 (cento e setenta e dois mil milhões, quatrocentos e vinte quatro mil e quatrocentos e cinquenta e oito kwanzas e vinte e um cêntimos), o que corresponde, em dólares, 208.041,9 (duzentos e oito Mil e quarenta e um e nove dólares).
Em relação ao presente ano (2024), os danos cifram-se em AKZ 17.280.000,00 (dezassete milhões e duzentos e oitenta mil kwanzas). Relativamente ao custo de recuperação, encontra-se no valor de AKZ 32.197.842,97 (trinta e dois milhões e cento e noventa e sete mil, oitocentos e quarenta e dois kwanzas e noventa e sete cêntimos), o que corresponde, em dólares, em 38.848,80 (trinta e oito mil e oitocentos e quarenta e oito e oitenta dólares).
Os actos de vandalização nas infra-estruturas da PRODEL ocorreram nos aproveitamentos hidroeléctricos do Luachimo, na Lunda-Norte; do Gove, no Huambo; da Capanda, em Malanje, e da Matala, na Huíla.
Ainda nas centrais térmicas de Santa Catarina, na província de Cabinda; da Marimba, na Huíla; de Quileva, na província de Benguela; do Cavaco, em Benguela e do Luau, na província do Moxico.
EPAL com perdas avaliadas em mais de 250 milhões de kwanzas
Segundo dados avançados pelo director de Comunicação, Marketing e Relações Institucionais da EPAL, Vladimir Henda, em declarações à Angop, 250 milhões de kwanzas é o montante em que está avaliado os prejuízos causados pelo garimpo de água na rede pública da EPAL, em 2023.
O responsável revelou que, para além do desperdício de água potável, está o impacto nas finanças da empresa, uma vez que o garimpo cria danos ao meio ambiente, contribuindo para a degradação de infra-estruturas do Estado.
Avançou que os maiores focos de garimpo de água estão nos municípios do Talatona, Kilamba Kiaxi, Viana e Cacuaco.
A par do garimpo de água, disse Vladimir Henda, a instituição tem sido severamente afectada por práticas de vandalização de equipamentos na rede, concretamente furto de contadores, danificação dos dispositivos hidráulicos, como válvula e ventosas, bem como a destruição das casas de bombagem. Adicionalmente, está a dívida acumulada por clientes, estimada em AKZ 120 mil milhões.
215 Casas de pesagem encerradas
No mês passado, a Polícia Nacional em Luanda encerrou 215 casas de pesagem de material ferroso, das 230 existentes em Luanda, de modo a reduzir o número de furtos e danos a bens públicos, destinado à subtracção ilícita de metais não preciosos. Segundo o porta-voz da PNA, Nestor Goubel, o encerramento deu-se no âmbito da operação “Fecho”.
As casas de pesagem de ferro, disse o oficial, têm sido o destino dado aos materiais como cabos eléctricos, retirados de cabines e de postes de energia e tampas de esgoto.