A proposta de lei de Alteração da Divisão político-Administrativa do país, que prevê dividir as províncias do Cuando Cubango e a do Moxico, voltou a ser discutida, na especialidade, na Assembleia nacional, e vai à votação final global no próximo dia 14, apesar das controvérsias entre os principais grupos parlamentares, o MPLA e a UNITA
Na Legislatura passada, o Executivo apresentou à Assembleia Nacional uma Proposta de Lei de Alteração da Divisão Político-Administrativa do país, tendo suscitado, na altura, um aceso debate entre os diferentes representantes políticos e da sociedade civil.
De iniciativa legislativa do Titular do Poder Executivo, a Proposta de Lei de Alteração da Divisão Político-Administrativa do país tem como principais objectivos, segundo o proponente, promover o desenvolvimento equilibrado do território nacional, combater as assimetrias regionais e aproximar os serviços públicos aos cidadãos.
Durante a discussão, ontem, nas Comissões de Trabalho Especializadas da Assembleia Nacional, o ministro de Estado e Chefe da Casa Civil do Presidente da República, Adão de Almeida, esclareceu que a extensão territorial e o distanciamento entre os órgãos e as pessoas, a forte pressão demográfica e o excesso de pressão demográfica sobre os órgãos, existentes no actual modelo de Divisão Político- Administrativa, não tem tornado possível o exercício da acção governativa eficiente, no que a proximidade dos órgãos aos cidadãos diz respeito, razão pela qual o proponente apresenta a proposta em causa, no sentido de ver resolvidas algumas questões.
“Nós temos um país que tem uma Divisão Político-Administrativa que, nos seus contornos essenciais, é de 1972. Fizemos algumas alterações pontuais ao longo do período pós-independência, mas os contornos essenciais da nossa Divisão Político-Administrativa é de 1972”, referiu, apontando também o crescimento substancial da população angolana.
Sublinhou que o Executivo pretende ainda, com a medida, reorganizar o plano municipal, isto é, atribuir aos níveis administrativos inferiores ou intramunicipais (comunas e distritos urbanos) uma nova categoria, transformando- os para terem mais competências e mais capacidade de intervenção, no sentido de desafogar a dependência às sedes municipais.
UNITA continua céptica
Apesar de alguns deputados seus se terem manifestado a favor da proposta, o maior partido na oposição quer que o Executivo esclareça quanto vai custar a Nova Divisão Político-Administrativa do país, e pede para que o partido no poder, MPLA, priorize o seu programa de governação, que é a implementação das Autarquias Locais.
O deputado Liberty Chiyaca e presidente do grupo parlamentar da UNITA defendeu um estudo aprofundado para melhores resultados, e para se evitar a instabilidade administrativa. “Como é que vamos conseguir aproximar os serviços públicos ao cidadão se o modelo de governação é o mesmo? A distância entre o problema e a resolução vai ser sempre a mesma, do município ao presidente e do presidente ao município”, defendeu.
MPLA esperançoso na melhoria das condições de vida
O partido no poder, MPLA, aplaude a iniciativa do Titular do Poder Executivo, acreditando que uma das soluções para vencer os desafios actuais que o país enfrenta passa pela nova divisão político- administrativa do território nacional.
A deputada Lourdes Kaposso defendeu a necessidade de se promover o bem-estar, solidariedade social e a elevação da qualidade de vida do povo angolano, designadamente das populações mais desfavorecidas. “A Quiçama, por exemplo, é uma zona aqui em Luanda, que merece um cuidado especial.
Há muitas populações desfavorecidas. Dou os parabéns que a Quiçama fará parte de uma nova província, porque é muito complicado, do ponto de vista de proximidade, até mesmo do ponto de vista de motivação dos jovens. Eu acredito que, se nós fizermos essa divisão, a população da Quiçama conseguirá ter mais proximidade entre os líderes e os liderados”, disse.
Votação final global
Ainda ontem, ficou decidido, durante a conferência dos presidentes dos grupos parlamentares, que a Proposta de Lei de Alteração da Divisão Político-Administrativa do país irá à votação final global no dia 14 de Agosto, na 8.ª Reunião Plenária Extraordinária da 2.ª Sessão Legislativa da V Legislatura da Assembleia Nacional.
Um outro tema que gerou discussão acesa foi a pretensão de se introduzir na especialidade a pro- posta de divisão Político-Administrativa da província de Luanda, de iniciativa do MPLA, o que não chegou a reunir consenso.
Especialistas divergem sobre Divisão de Luanda
A proposta de dividir a província de Luanda em duas novas unidades territoriais tem igualmente gerado opiniões divergentes entre especialistas e analistas. Enquanto alguns vêem a medida como uma oportunidade para melhorar a eficiência dos serviços públicos, outros alertam para os possíveis riscos e custos adicionais.
Sob iniciativa do grupo parlamentar do MpLA, na semana passada, foram colhidas contribuições e opiniões dos membros dos Conselhos de Concertação Social da província de Luanda em relação à nova proposta de Lei de Divisão político-Administrativa da cidade capital, cujo pano de fundo é dividir a circunscrição com vista à aproximação dos serviços públicos, bem como uma governação de maior proximidade.
O facto tem estado a gerar acesos debates em relação ao tema. O especialista em ordenamento do território e desenvolvimento regional, Olívio Sakai, por exemplo, argumenta que a divisão pode trazer benefícios significativos para a região.
“As teorias do desenvolvimento regional, como as de Perroux e Douglas North, demonstram que a proximidade dos serviços aos cidadãos acelera o desenvolvimento regional”, explicou. Olívio Sakaia defende que a criação de pólos de crescimento e a descentralização administrativa são fundamentais para o progresso.
Entre os desafios apontados, este especialista mencionou a necessidade de novas infra-estruturas, como edifícios governamentais, administrações municipais, eixos rodoviários, além de instalações fundamentais, como museus, tribunais e hospitais.
Desafios e custos logísticos
Olívio Sakai destacou também a necessidade de se manter a história e identidade cultural das comunidades, promovendo indústrias locais e melhorar a mobilidade e segurança pública. Reconheceu, porém, os desafios logísticos e administrativos da proposta, como a necessidade de verbas no orçamento geral do Estado (OGE), a alteração da legislação vigente e a definição de um nome para a nova província.
O especialista sugeriu que a nova divisão poderia incluir uma “província da Quiçama ou Luanda-norte”, abrangendo áreas como panguila, funda, icolo e Bengo, Zangos e Quiçama.
Preocupações económicas e críticas
Em contramão, o economista Heitor Carvalho criticou a proposta, apontando uma “falta de discussão aprofundada” e a pressa na implementação. O economista salientou que questões económicas de tamanha importância devem ser tratadas com calma e ponderação.
Heitor Carvalho levantou preocupações, por exemplo, sobre o financiamento da nova província, questionando de onde viriam os recursos necessários para cobrir os custos adicionais. “não há mais receitas ou fundos; haverá mais despesas, o que impactará directamente todos os angolanos”, afirmou.
Para o economista, deveria ocorrer uma análise detalhada do projecto por pelo menos cinco anos, para se avaliar os seus prós e contras. “Só por um milagre é que esta proposta não vai dar errado”, ironizou.
Aspectos legais e institucionais
Por sua vez, o jurista Osvaldo Salupulo destacou que, constitucionalmente, a criação de novas unidades territoriais é uma competência do Ministério da Administração do território (MAT) e não de partidos políticos, como é o caso do MPLA.
“A proposta do MPLA deve ser vista como uma mera intenção política, não uma medida legislativa”, afirmou. Osvaldo Salupulo sublinhou que qualquer iniciativa de divisão administrativa deve passar por consultas públicas, organizadas pelo MAT, para garantir que as opiniões dos cidadãos sejam consideradas.
O jurista levantou também preocupações sobre o possível aumento das desigualdades e os custos adicionais para o Estado, como o aumento do número de administradores municipais e distritais.
“A intenção parece ser a separação da cidade dos subúrbios, o que poderia acentuar as desigualdades existentes”, alertou. A proposta de divisão de Luanda em novas províncias continua a gerar debate, com pontos de vista contrastantes sobre seus possíveis benefícios e desafios. A necessidade de uma análise mais detalhada e de um processo de consulta pública parecem ser um consenso entre os especialistas.
POR: Neusa Filipe e João Feliciano