João Lourenço começou por regozijar-se com a visita do Chefe do Governo português, que acontece cerca de três meses depois do encontro mantido entre ambos, em Lisboa, por ocasião das comemorações dos 50 anos da Revolução dos Cravos «25 de Abril».
O Presidente da República destacou a solidez e continuidade da relação entre Angola e Portugal, independentemente das mudanças políticas em ambos os países.
“Os dois países estiveram sempre juntos nos bons e maus momentos e é assim que a relação vai continuar”, afirmou.
João Lourenço sublinhou ainda que a parceria entre Angola e Portugal é uma relação entre Estados, não entre partidos políticos, o que garante estabilidade e consistência no relacionamento ao longo dos quase 50 anos de cooperação.
Ressaltou que, embora o foco tenha sido historicamente o investimento público, actualmente, há uma ênfase maior no investimento privado, essencial para uma economia de mercado.
“Ainda há muito por se fazer em termos de infra-estruturas públicas, mas queremos ver aumentar o interesse dos investidores privados em ambos os países”, acrescentou.
O Presidente reconheceu que o número de empresas angolanas a investir em Portugal é ainda reduzido, mas afirmou que Angola está a dar passos para elevar a sua presença internacional.
“É do interesse das autoridades que as empresas cresçam e se internacionalizem”, disse João Lourenço.
Conflitos em África e no mundo
O Presidente da República não deixou de olhar para os conflitos em África e no mundo, tendo considerado as relações internacionais de “complexas”.
Referiu-se aos conflitos no Leste da RDC, no Sudão e em outras regiões do continente berço, tendo alertado para os perigos destas contendas, sublinhando a necessidade de uma visão realista e pragmática para a sua resolução.
João Lourenço enfatizou que a procura por um mundo de paz e entendimento entre as nações deve ser o pilar dos esforços para resolver os grandes problemas mundiais.
Segundo o Chefe de Estado, guerras, terrorismo, extremismo violento, alterações climáticas, epidemias, fome e miséria representam sérias ameaças à sobrevivência humana.
Em relação aos conflitos na Ucrânia e Médio Oriente, o estadista angolano defendeu o diálogo como ferramenta indispensável, conforme estabelecem as normas internacionais.
Apelou ao fim da guerra contra a Ucrânia, condenando a ocupação e anexação de partes do seu território, e instou à construção de uma paz duradoura na Europa.
Referindo-se aos ataques de 7 de Outubro contra cidadãos israelitas, o Presidente da República condenou a resposta desproporcional contra civis palestinianos na Faixa de Gaza, tendo ressaltado a necessidade de se implementar as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, a fim de se criar um Estado da Palestina, coexistindo pacificamente ao lado de Israel.
“Relação entre Angola e Portugal está viva”
Por sua vez, o Primeiro-Ministro de Portugal, Luís Montenegro, afirmou que as relações de cooperação entre Angola e Portugal estão cada vez mais dinâmicas, visando o progresso económico e social de angolanos e portugueses.
Salientou que os documentos assinados são uma prova de que a relação está viva e em constante evolução.
“É uma relação de todas as oras, das horas difíceis e de sucesso”, afirmou. Montenegro destacou que Portugal está disposto a ajudar Angola na criação de infra-estruturas que possam alavancar tanto investimentos públicos quanto privados.
“Estamos juntos no relacionamento político, na economia, na capacidade de formar quadros, na valorização da nossa língua e cultura.
Estamos juntos para construir o futuro”, disse o Chefe do Governo português. Ademais, elogiou o papel mediador de João Lourenço em diversos conflitos em África, de mais a mais no leste da RDC e no Sudão.
Montenegro destacou a postura conjunta de Angola e Portugal nos organismos internacionais, como a CPLP e as Nações Unidas, visando alcançar a paz através do diálogo e com base nas resoluções da ONU.
Assinados 12 acordos de cooperação bilateral
Angola e Portugal firmaram, ontem, doze instrumentos jurídicos, visando o fortalecimento da cooperação bilateral.
A cerimónia contou com a presença do Presidente angolano, João Lourenço, e do Primeiro-Ministro português, Luís Montenegro, e ocorreu no contexto da visita oficial de três dias do Chefe do Governo português a Angola.
Entre os acordos assinados, destaca-se o Memorando de Entendimento entre o Ministério do Planeamento de Angola e o Ministério das Finanças de Portugal, que abrange a dinamização e valorização das parcerias público-privadas em Angola, além de formação e assistência técnica sobre gestão da dívida pública e tesouraria do Estado.
Outro acordo significativo é o contrato de financiamento da represa no município de Chicomba, na província da Huíla, no valor de mais de 60 milhões de euros.
Além disso, foi firmado um protocolo para a implementação de um programa de cooperação técnico-policial e protecção civil, assim como um protocolo de cooperação entre os ministérios da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social de Angola e de Portugal, abrangendo o período de 2024-2027.
Os documentos incluem, também, um Memorando de Entendimento sobre cooperação na área da Administração Pública e um Protocolo de Cooperação entre o Centro de Formação Profissional das Pescas de Angola (CEFOPESCAS) e o Centro de Formação Profissional das Pescas e do Mar de Portugal (FOR-MAR).
Adicionalmente, foi assinado um Memorando de Cooperação entre a Agência Reguladora de Medicamentos e Meios Tecnológicos de Angola (ARMED) e o INFARMED de Portugal, focado na regulação farmacêutica.
Também foi formalizado um acordo de parceria relativo a um curso de doutoramento em metodologia do ensino primário e um Memorando de Entendimento para a formação e gestão do pessoal docente.
Outros acordos incluem um Protocolo de Cooperação entre o Instituto de Fomento Turístico de Angola e o Instituto do Turismo de Portugal, no âmbito do Programa REVIVE, e um Memorando de Entendimento entre o Instituto Nacional de Investigação em Saúde (INIS) de Angola e o Instituto Nacional de Saúde (INSA) de Portugal.
“Angola não vai pedir indemnização a Portugal por crimes coloniais”, afirma PR
O Presidente da República, João Lourenço, afirmou, ontem, que Angola não solicitará indemnização a Portugal pelos crimes cometidos durante o jugo colonial.
A afirmação do estadista angolano foi feita durante uma conferência de imprensa, após a assinatura de acordos de cooperação entre Angola e Portugal, no contexto da visita oficial do Primeiro-Ministro português, Luís Montenegro.
João Lourenço enfatizou que “se Angola, durante os 49 anos de independência, nunca colocou esta questão, nós não a colocaremos nunca”.
O Chefe de Estado comparou a questão das indemnizações coloniais com a complexidade das disputas de fronteiras, que mudaram ao longo dos séculos e, se levantadas hoje, trariam muita discussão e nenhuma solução concreta.
Segundo o Presidente, os países colonizadores não teriam a capacidade real de oferecer uma reparação justa. “Isto é impossível, não difícil”, afirmou, acrescentando que Portugal não foi a única potência colonizadora, citando outros países como Espanha, França e Inglaterra, e alertou que pedir reparações de todas estas nações resultaria numa “revolução inimaginável”.
Lembrar que a discussão sobre indemnizações foi levantada pelo Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, durante as comemorações dos 50 anos da Revolução dos Cravos, em 25 de Abril.
Na ocasião, Rebelo de Sousa reconheceu a responsabilidade de Portugal pelos crimes cometidos durante a era colonial e sugeriu o pagamento de reparações pelos erros do passado.