A situação na Terra Santa, cidade de Jerusalém é de uma violência indescritível, depois que Donald Trump decidiu transferir a sua embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, significando o gesto o reconhecimento desta cidade ser a capital unitária de Israel.
POR: Eugénio Mateus
“A Palestina é um caso de muita história e pouco território”, dizia o historiador e jornalista moçambicano Tomé Mbuia João. Esta visão ficou patente durante a entrevista concedida a OPAÍS pelo embaixador da Palestina em Angola, Najah Addulrahman, que no preâmbulo da conversa sobre a situação prevalecente em Jerusalém discorreu precisamente sobre os aspectos históricos da querela entre israelitas e palestinianos acerca da legitimidade da posse do lugar santo para três religiões monoteístas importantes que são o cristianismo, o judaísmo e o islamismo.
“Quando os judeus chegaram do Egipto e atravessaram o Rio Jordão, já lá estavam os palestinianos e, ao recebê-los, nós os consideramos como as pessoas que haviam atravessado o rio Jordão”, disse o embaixador, esclarecendo que o nome hebreu resulta da evolução de um vocábulo muçulmano para indicar aquele que tinha atravessado o rio Jordão, no caso.
Abddulrahman introduz novos dados históricos para sustentar a sua visão acerca da legitimidade da reivindicação da posse de Jerusalém, afirmando que o Estado de Israel nunca existiu no transcorrer dos tempos históricos. Para o embaixador palestino, “O profeta Moisés viveu no Egipto e Abraão era do actual Iraque”, reconhecendo, contudo, que “Jesus Cristo foi um judeu que nasceu na Palestina” e é respeitado pelos palestinianos, assim como todos os demais profetas que o antecederam.
Trump e a Palestina
A decisão do Presidente norte- americano Donald Trump de transferir a embaixada dos EUA para Jerusalém tem como implicação fundamental o reconhecimento desta cidade ser a capital de Israel em termos unitários, isto é, contraria a actual divisão em Jerusalém Oriental e Ocidental. Para o diplomata palestiniano, a manutenção da divisão de Jerusalém entre a parte Oriental e Ocidental até que não é problemática, sinalizando o facto de esta cidade ser um ponto de convergência sagrado para três importantes religiões, o islamismo, o cristianismo e o judaísmo, um ponto de reencontro na fraternidade apregoada pelos seus deuses.
Segundo o embaixador, na Palestina não há distinção entre muçulmanos e outras confissões religiosas, pois há um convívio salutar que engaja mesmo o líder da autoridade palestiniana Mahmoud Abbas que está sempre presente nas datas de celebração importante de cada religião. Sublinhou o facto de haver judeus palestinianos de Nablus que rejeitam a tomada da Palestina por Israel, abdicando mesmo da nacionalidade judia e se fazem representar no parlamento palestiniano. Segundo o embaixador Najah Addulrahman esta decisão de Trump é contrária ao espírito de várias resoluções das Nações Unidas que condenam a ocupação dos territórios palestinianos, onde Israel constrói vários colonatos, criticados e condenados pela comunidade internacional. “
O que dissemos é que a América violou todos estes acordos e resoluções”, disse o embaixador que é peremptório ao vincar que “A declaração do Presidente Donald Trump é ilegal e não tem nenhum efeito, é irresponsável e contradiz os princípios internacionais”, pelo que a Palestina não descarta levar os EUA às instâncias da ONU, mormente à Assembleia Geral.
Guerra doutrinal
O embaixador Addulrahman vislumbra a eclosão, nos próximos tempos, de uma “guerra doutrinal e não política” como consequência da atitude americana em relação à questão palestiniana, assim como a inflamação do terrorismo, pois a população palestiniana maioritariamente muçulmana, estimada em milhão e meio de habitantes, jamais permitirá que seja despojada da sua capital religiosa, Jerusalém.
Também acusa Trump de procurar alterar a história, até mesmo de ser uma personalidade histórica. “Trump não lê a História”. Quanto à retoma das intifadas, o embaixador palestiniano manifestou- se nos termos de que os palestinianos não têm motivo para felicitar Donald Trump, pelo que as intifadas são um direito natural dos palestinianos se defenderem nas actuais circunstâncias. O embaixador palestiniano tem um vislumbre de que o presidente americano quer mais do que uma intifada, quer “uma guerra, mas ele não terá esse prazer”, garantindo que o seu país concertará esforços para reconquistar a sua terra, a sua dignidade como povo.
Implicações da declaração de Trump
“Obviamente que vai complicar o processo de paz”, disse o embaixador, para quem a declaração do Presidente dos Estados Unidos da América significa que “já não existe Jerusalém Oriental, tudo foi entregue a Israel” ao arrepio das leis internacionais. Por este facto considera Donald Trump um político desfasado que verá recair sobre si as consequências da sua política “que não convence a humanidade e o mundo ainda vai se afastar dele”.
Posição de Angola
O embaixador Najah Addulrahman disse que embora as autoridades angolanas ainda não se tenham pronunciado sobre o assunto, “contamos sempre com uma posição de apoio do Governo angolano, isto porque é já uma posição tradicional”, considerando mesmo Angola como “um amigo estratégico para a causa palestiniana”. Ao nível da cooperação bilateral, o embaixador ressaltou a assinatura para breve de protocolos de cooperação nos domínios do ensino, agricultura e economia. No domínio da comunicação social apontou a cooperação entre a agência angolana de notícias Angop e a congénere palestiniana Wafa.