Histórico dirigente do MPLA, Lopo do Nascimento, considerou, ontem, em Luanda, ter chegado o momento de se contar “a verdade histórica de algumas áreas da história de Angola”, sem especificar concretamente em que aspectos
Texto de: José Dias
Lopo do Nascimento fez este apelo à Associação Tchiweka de Documentação (ATD) quando apresentava, no Memorial António Agostinho Neto, o seu testemunho sobre a figura de Lúcio Lara, no quadro da conferência denominada “Lúcio Lara – Trajectória de um combatente”, no mês em que em vida completaria 89 anos.
“Gostaria de pedir à ATD que continue, apesar das dificuldades com que se debatem, de modo a que possamos introduzir a verdade histórica de algumas áreas da história de Angola. Porque há muita coisa que foi dita que correspondeu a uma época que era preciso ser dita, mas que não é a verdade verdadeira. Eu faço um apelo à ATD, que faça esse percurso de contar a verdade histórica, porque há coisas que foram contadas que, realmente, não foi assim que as coisas se passaram”, frisou.
Lopo do Nascimento destacou Lúcio Lara como uma figura angolana de extrema elevação, modéstia e humildade, tendo chegado inclusive a rejeitar cargos de relevância no governo pós-Independência. “Fui colega, camarada e companheiro de Lúcio Lara, a partir de 1974. Convivemos em três áreas geográficas diferentes, e em cada uma delas tive a oportunidade de descobrir uma personalidade e aprender muitas coisas, não apenas do ponto de vista político, mas comportamental”, ressaltou.
Segundo o político, Lúcio Lara era um verdadeiro camarada que estava na política não para servirse, mas para servir, no seu carácter modesto, de companheirismo e de solidariedade que o caracterizavam.
“Após a Independência, quando se constituiu o Governo, Lúcio Lara foi indicado para ministro da Educação, mas recusou dizendo que não queria nenhum cargo governamental.
Queria continuar a trabalhar no partido. Não queria ir para o Governo, o que mostra a sua maneira de ser. Não era um individuo que estava ali para se servir ou aproveitar- se de nada”, resssaltou.
Lúcio Lara – comandante educador
Por seu turno, João Teta, no seu testemunho sobre “Lúcio Lara – designou- o como o comandante educador”. Revela que Lúcio Lara idealizou um programa integral de formação de pioneiros para os desafios da luta de libertação nacional e pós Independência.
Foi com o slogan segundo o qual “o ensino de qualidade é garantido, antes de tudo, pela qualidade do professor”, que Lúcio Lara arquitectou o projecto do “Internato 4 de Fevereiro”, que albergava centenas de pioneiros aos quais foi administrado um processo de ensino rigoroso, com os melhores quadros do MPLA da 2ª região, entre engenheiros, sociólogos, médicos, e de outras áreas de formação.
“O camarada Lúcio Lara foi um dos arquitectos deste conceito. Educar integralmente para libertar, libertar do obscurantismo e o preconceito, libertar do individualismo e do egoísmo. O arquitecto dessa filosofia de ensino era o camarada Lúcio Lara”, enfatizou.
Segundo João Teta, a paixão de Lúcio Lara pela educação e formação de um homem novo, comprometido com a causa da libertação do seu povo do jugo colonial e da exploração do homem pelo homem, foi manifestada pela criação da OPA – Organização do Pioneiro Angolano -, que ele conduziu, bem como os dez princípios do pioneiro do MPLA.
Debate
Nos debates, muitas inquietações foram levantadas pelos participantes, os quais defenderam que a iniciativa de homenagear devia ser do próprio partido, MPLA, e não de uma associação.
Teresa Coehn, uma das intervenientes, disse ser obrigação do MPLA homenagear todos aqueles que entregaram as suas vidas pela causa da liberdade do povo angolano que considerou terem caído no esquecimento.
Sobre o repto lançado por Lopo do Nascimento, apelou às pessoas que participaram no processo de luta de libertação ainda vivas, a terem coragem de vir a público e contar a verdadeira história do MPLA.
Sobre Lúcio Lara Lúcio
Rodrigo Leite Barreto de Lara nasceu a 9 de Abril de 1929 na província do Huambo, antiga Nova Lisboa. Na guerrilha era também conhecido por Tchiweka. Muito cedo, envolveuse nas movimentações nacionalistas em curso desde 1950, em Angola e entre os angolanos no exílio.
Foi eleito secretário da Organização e dos Quadros na primeira conferência nacional do MPLA, em Dezembro de 1962, tendo passado mais tarde a secretáriogeral. Nesta função, foi o “operacional” junto de Agostinho Neto, sobretudo a partir da sede do MPLA em Brazzaville. À data da morte de Agostinho Neto, Lara era o mais alto membro do Bureau Político e vice-presidente do MPLA.
Nessa condição, assumiu interinamente as funções de presidente do partido, e, por extensão, da República Popular de Angola. Convocou, com carácter de urgência, o 2º Congresso do MPLA, a 11 de Setembro de 1979, e trabalhou intensamente para a eleição de José Eduardo dos Santos, que ocorreu a 20 de Setembro do mesmo ano.
Recusou todas as propostas que lhe foram feitas para assumir efectivamente a liderança do país. Faleceu em Luanda, em 27 de Fevereiro de 2016.