A proposta de Lei dos Estatutos dos antigos Presidentes e Vice-Presidentes da República apreciada recentemente pelo Conselho de Ministros e submetida à Assembleia Nacional para consequente aprovação, apresenta inovações comparadas a experiências de potências mundiais (África do Sul, EUA, França e Brasil), sendo a versão enviada a que melhor se adequa ao caso angolano
A nova versão do actual Regulamento da Lei 16/17, de 17 de Agosto, que aprova o Estatuto dos Antigos Presidentes e Vice-Presidentes, apreciado na passada Quinta-feira, 30 de Março, na terceira reunião ordinária do Conselho de Ministros, visa conformar o ordenamento jurídico à Constituição, em particular ao disposto no artigo 133º sobre o regime jurídico dos antigos Presidentes da República.
Esta iniciativa legislativa visa ainda adequar os direitos, deveres e imunidades dos antigos titulares do Poder Executivo e respectivo órgão auxiliar singular no exercício da função executiva. Com isto, segundo uma fonte ligada ao dossier, a proposta deter- mina, no seu artigo 2º, nº 1, que a presente lei é aplicável a todos os antigos Presidentes da República que tenham completado pelo me- nos um mandato. Salvo nos casos em que a lei determine o contrário, as disposições da presente lei são igualmente aplicáveis aos antigos Vice-Presidentes, diz o nº 2 da mesma lei que exclui do âmbito do presente diploma os antigos Presidentes da República que tenham sido destituídos do cargo ou que tenham renunciado ao mandato.
Direitos dos antigos Presidentes Neste capítulo, a proposta determina que estes têm direito a subvenção vitalícia correspondente ao salário base do Presidente da República em funções, que na versão em vigor está fixado em 80 porcento, sendo cumulável a pensão de aposentação ou reforma a que tenham direi- to, sem prejuízo de outras remunerações ou subsídios previstos em diploma próprio. Tem ainda direito a seguro de saúde, extensivo ao cônjuge e aos filhos menores ou equiparados, médico pessoal, moradia de família atribuída pelo Estado, e respectivo pessoal de apoio nos termos definidos em diploma próprio.
Ainda viaturas protocolares, e de apoio, fornecidas e assistidas pelo Estado, oficiais às ordens, segurança – garantida pelos órgãos competentes do Estado. Têm ainda direito a gabinete de trabalho e quadro de pessoal de apoio ao gabinete, subsídio de fim do mandato e subsídio anual para manutenção da mora- dia, que deverá ser definido em diploma próprio.
Se o mesmo optar por morar em residência própria, deve ser assegurado o seu apetrechamento e garantido o subsídio anual de manutenção. A manutenção e funcionamento do gabinete do antigo Presidente da República previsto na presente pro- posta de lei são garantidas por dotações do OGE, nos termos defini- dos em diploma próprio. Ainda no capítulo dos direitos, o mesmo aplica-se aos Vice-Presidentes da República.
Tratamento protocolares
Neste capítulo, foram mantidas as condições protocolares compatíveis com a função anteriormente desempenhadas, nomeadamente a precedência nos termos definidos pela legislação aplicável, a oficial às ordens, protecção pessoal extensiva ao cônjuge e passaporte diplomático extensivo ao cônjuge e filhos menores.
Imunidades No tocante às imunidades, os antigos Presidentes e Vice-Presidentes continuam a gozar, com as devidas adaptações, das imunidades conferidas aos membros do Conselho da República, nos termos das disposições combinadas do nº 1 do artigo 133º e do nº 4 do artigo 135 da CRA.
Impedimentos
Nos termos da presente proposta, os antigos Presidentes e Vice- Presidentes da República estão impedidos de prestar trabalho para entidades privadas nos três anos imediatos ao fim do mandato. Excluem-se, também, do disposto anterior, a docência, a prestação de serviços em entidades de investigação científica e às actividades filantrópicas e similares. De acordo com a presente pro- posta de lei, os direitos garantidos cessam com o exercício de qual- quer actividade no sector priva- do, excepto em caso de prestação de serviços em fundações, associações, e outras pessoas colectivas de direito privado sem fins lucrativos, e actividades de investigação científica ou docência.
Deveres
Neste quesito, os antigos Presidentes e Vice-Presidentes estão sujeitos aos deveres de sigilo e confidencialidade sobre as informações e documentos a que tenham tido acesso durante o exercício do cargo, sem prejuízo do regime de segredo de Estado.
Cessação dos direitos
Está ainda estabelecido na presente proposta que os direitos conferidos pela presente lei cessam com a morte do seu titular, sendo garantida ao cônjuge sobrevivo e aos filhos menores uma pensão no valor total equivalente àquele que teria direito o seu titular.
Suspensão de direitos
Os direitos previstos na presente proposta de lei, não são cumuláveis com outros direitos ou remunerações atribuídas pela assumpção de qualquer posição ou cargo público remunerado pelo antigo Presidente ou Vice-Presidente da República, excepto os previstos expressamente na Constituição e na lei.
Cortes
Foram suprimidas da presente proposta de lei, o direito a passa- porte diplomático aos ascendentes de primeiro grau da linha recta; viagens anuais de férias para o interior ou exterior do país, até então assegurados pela secretaria-geral do Presidente da República. Foi ainda revogado o direito a escolta pessoal permanente, proveniente da Unidade de Segurança Presidencial.
Albano Pedro considera inoportuna Proposta de Alteração da Lei
Em declarações a OPAÍS, o constitucionalista Albano Pedro começou por desvalorizar os comentários que dão conta de que ao propor a alteração da Lei dos Estatutos dos antigos Presidentes e Vice-Pesidentes da República, o actual Chefe de Estado, João Lourenço manifesta uma clara preocupação com o seu futuro.
Para este especialista em direito constitucional, trata-se de um procedimento normativo legal, e que tem respaldo na Constituição. No entanto, considera que a medida é, por enquanto, inoportuna. Albano Pedro sublinha que as alterações à referida lei são feitas, regra geral, nas vésperas do fim do mandato presidencial, numa altura em que o Presidente da República já tem a clara ideia do que poderá eventualmente vir a ocorrer quando cessar funções.
“Não acho que seja importante o Presidente mexer já na questão dos estatutos, a regulação destas matérias, faz-se a faltar um ano para cessação do mandato, e já a pensar no day after”, disse, Alba- no Pedro, para quem a probabilidade de o Chefe de Estado vier a abandonar o poder, em 2027, “é bastante diminuta”. No essencial, clarifica, em comparação à Lei 16/17 de Agosto que aprova o Estatuto dos Antigos Presidentes de Angoa, a proposta define uma subvenção mensal vitalícia correspondente a cem por cento do salário base, e restringe alguns benefícios relativos à atribuição do passaporte. “Quanto às imunidades, a pro- posta mantém o mesmo regime previsto na Constituição, que está equiparada aos membros do Conselho da República”, afirma.
Partidos da Oposição falam em possível inconstitucionalidade
Para a terceira vice-presidente do Grupo Parlamentar da UNITA, Mihaela Weba, afirma que qual- quer Lei que desenvolva esta matéria deve estar em conformidade com a Constituição, sob pena de ser inconstitucional. A deputada explica que só a Constituição é que pode prever mais imunidades para os antigos presidentes. Ademais, explica que a pretensão do Executivo demonstra claramente que o Presidente da República está preocupado com o seu futuro.
“Porque do ponto de vista do direito internacional público, o que aconteceu em Cafunfo é um crime contra a humanidade, e nós sabe- mos quem é o responsável por isso”, afirmou, acrescentando que o Presidente já não tem a possibilidade de ter um terceiro mandato, por imperativo constitucional. Por seu turno, o deputado do Partido de Renovação Social, Rui Malopa, revelou que não tomou ainda contacto com o texto do documento, mas adiantou que a lei em vigor confere alguns direitos, deveres e imunidades aos antigos Presidentes e Vice-Presidentes da República, e, ao que parece, o actual Chefe de Estado não vê no diploma em vigor garantias que lhe possam as- segurar quando amanhã deixar de ser presidente. “Pensamos que a ideia é assegurar que nada o venha criar dificuldades. E, por outro lado, achamos que o Presidente pretende adicionar algumas garantias que confiram um amanhã melhor, mas há que ter o cuidado para não cair em inconstitucionalidade”, defendeu.
Segunda alteração à Lei
De referir que esta será a segunda vez que o Executivo liderado pelo Presidente da República, João Lourenço procede à uma alteração ao Regulamento da Lei 16/17, de 17 de Agosto sobre o Estatuto dos Antigos Presidentes e Vice-Presidentes da República, sendo que a primeira revogou o Decreto Presidencial 223/17 de 27 de Setembro e a nova proposta deverá revogar a actual 32/17 de 17 de Fevereiro.