O presidente da Fundação 27 de Maio, o general na reserva Silva Mateus, garantiu ao jornal OPAÍS que “não pode haver ossadas falsas de José Van-Dúnem e Sita Vales, porque elas nunca foram entregues” – desmentindo um documento, escrito em Portugal, que alega que a CIVI- COP forjou os resultados dos exames
Assinalou-se no último Sábado, 27 de Maio, o 46° aniversário dos conflitos de 1977 no país, com a deposição de coroas de flores nas campas das vítimas daquele fatídico incidente, no cemitério do Alto das Cruzes. Em declarações ao OPAÍS no final da cerimónia, o presidente da Fundação 27de Maio, Silva Mateus, disse que, “em resumo, as declarações contidas na referida carta, enviada ao Presidente da República, são falsas”.
O general na reserva frisou que as referidas acusações não correspondem à verdade, uma vez que o Governo, por via da Comissão de Reconciliação em Memória das Vítimas de Conflitos Políticos (CIVICOP), não entregou ossadas nem resultados de análises nenhuma, fazendo alusão aos restos mortais de Sita Vales e José Van- Dúnem. Já Cornélio Calei, membro da CIVICOP e que representou o Governo na referida cerimónia, explicou que os subscritores da referida carta não apresentaram, até hoje, elementos probatórios que sustentem a sua acusação.
Aliás, acrescentou que apenas souberam da mesma carta por via da imprensa e das redes sociais. Ademais, afirmou que a CIVI- COP não manteve nenhum contacto com os familiares de Sita Vales e de José Van-Dúnem, uma vez que os mesmos nunca se dirigiram àquela comissão. Sobre as acusações de que os actos praticados pela CIVICOP não representam, de facto, uma reconciliação, Cornélio Calei salientou que os descontentamentos devem ser apresentados em sede das reuniões da comissão, e não nas redes sociais.
“Até porque as vitimas e seus familiares estão representados na CIVICOP por via da Fundação 27 de Maio”, esclareceu. Também presente na cerimónia, o representante dos antigos com- batentes das extintas FALA, então braço armado da UNITA, apreciou o acto e disse ser de elevada importância a sua execução. Apesar disso, disse ser um ensaio que deve merecer maior participação, uma vez que se está a trabalhar para que haja reconciliação nacional. “Aqui mesmo nota-se que ainda não se deram passos concretos para que haja uma verdadeira reconciliação nacional”, notou, augurando que este propósito venha a ser materializado.
No último Sábado, foram depositadas coroas de flores nas campas de Saidy Mingas, Paulo da Silva Mungugo “Dangereux”, Eugénio Veríssimo da Costa “Nzagi”, José Manuel Paiva “Bula Matadi”, António Manuel Garcia Neto, Alves Bernardo Baptista “Nito Alves”, Jacob Caetano João “Monstro Imortal”, Arsénio José Lourenço Mesquita “Sianouk” e Ilídio Ramalhete, entre outras vítimas do 27 de Maio.
Memorial tem verba cabimentada no OGE
2023 O Memorial Nacional em homenagem às vítimas dos conflitos políticos ocorridos no país, no período entre 11 de Novembro de 1975 e 4 de Abril de 2002, com realce para os do 27 de Maio, já conta com verba inscrita no Orçamento Geral do Estado (OGE) deste ano, acto que poderá permitir o arranque da sua construção ainda nos próximos tempos. A informação foi avançada na última Sexta-feira, 26, em Luanda, pelo coordenador da Comissão de reconciliação em Memória das Vítimas de Conflitos Políticos (CIVICOP), o também ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Marcy Lopes, na abertura da reunião daquele órgão criado, em 2019, pelo Presidente da república, João Lourenço.
Marcy Lopes não se referiu ao montante que o Estado vai desembolsar para a execução desta empreitada, mas, de acordo com uma consulta feita pelo Jornal de Angola ao OGE deste ano, publicado na página do Ministério das Finanças, será de cerca de 3 mil milhões de kwanzas, ou seja 2.947.949.398,00. A construção e conclusão do memorial às vítimas de conflitos políticos, cuja primeira pedra já foi lançada, corresponde à última fase deste processo. O coordenador da CIVICOP lamentou, na ocasião, o facto de, apesar das várias acções desenvolvidas pelo Estado, no quadro deste pro- cesso, surgirem, ainda assim, nos últimos tempos, informações a atacar a credibilidade do processo e dos trabalhos realizados pela comissão.
Marcy Lopes lembrou, à propósito, que o Executivo angolano é o primeiro e o principal interessado na realização deste processo, de for- ma exitosa, idónea, credível, cumprindo todos os procedimentos técnicos, legais e de outra natureza técnica, que se impuserem, para permitir que os resultados sejam os mais credíveis e idóneos possíveis. ressaltou que o Governo angolano adquiriu equipamentos necessários que permitem ao Laboratório de Criminalística de Luanda realizar exames médico-forenses com elementos próprios, tendo sublinhado que foram estes os meios que permitiram a realização, com êxito, dos trabalhos que culminaram com a identificação “das pessoas referidas”, homenageadas e, consequentemente, a realização de um funeral condigno e adequado à sua dimensão.
“Os respectivos exames foram realizados com responsabilidade e entregues aos familiares, de modo a possibilitar a realização de exames paralelos pelas famílias”, destacou o coordenador da comissão, para quem as famílias têm a faculdade de procurar por outros especialistas para obter resultado comparado em relação ao apresentado pelo Laboratório. Marcy Lopes assegurou que os trabalhos da CIVICOP continuam e o objectivo é obter o maior número de resultados positivos possíveis. Disse já terem sido realizados vários exames médico-forenses, que permitiram a identificação de vítimas, cujos restos mortais foram entregues aos respectivos familiares, acto que, como adiantou, foram antecedidos das correspondentes homenagens.
POR: João Feliciano