“Negativo ”, esta foi a reacção do ministro angolano das Relações, Exteriores, Manuel Augusto, à notícia ontem avançada pelo jornal luso Expresso, que cita uma carta com uma proposta angolana ao Estado português, com três pontos, para resolver o caso judicial que em Portugal envolve o nome do antigo vice-presidente da República de Angola, Manuel Vivente (MV).
Falando a OPAÍS, Manuel Augusto disse tratar-se de “adivinhações do Expresso”. E prosseguiu: “nós reafirmamos a nossa posição de princípio baseada no seguinte: respeitamos a separação de poderes; fazemos recurso dos acordos de cooperação judiciária, quer bilateral, quer multilateral(no âmbito da CPLP); consideramos que o caso está politizado, pelo que acreditamos que vai prevalecer o bom-senso por parte do Estado Português (poderes legislativo, executivo e judicial)”.
Segundo o Expresso um princípio do acordo pode estar na leitura e interpretação da resposta à carta rogatória que Angola enviou a Portugal, no âmbito do processo que envolve o ex-vice-presidente angolano Manuel Vicente, acusado de corrupção activa e branqueamento de capitais.
Angola teria pedido transferência do processo a fim de o jul- Manuel Augusto chama de “adivinhações” às informações veiculadas pelo jornal português Expresso, que diz que Angola teria proposto um compromisso ao Governo luso no caso Fizz, que envolve Manuel Vicente gar no país, ao abrigo do convénio assinado no âmbito da CPLP. Avança o Expresso, que afirma ter tido acesso a carta, a referida resposta coloca três pontos, que podem abrir a porta ao desbloqueamento do processo, pois confirma que o ex-vice- presidente goza de facto de imunidade.
De acordo com o texto da resposta, citado pelo jornal, Angola reconhece que, de acordo com a lei angolana, o vice-presidente “responde pelos crimes estranhos ao exercício das suas funções cinco anos depois do fim do seu mandato” e fá-lo-á perante o Tribunal Supremo.
Todavia, ressalva o referido texto, ainda segundo o periódico lisboeta: apesar da Lei da Amnistia publicada em 2016 em Angola, que isentaria em princípio Manuel Vicente dos crimes por que é acusado, “apenas perante um caso concreto e no âmbito da sua completa e adequada tramitação se poderá saber qual o seu desfecho, sendo certo que a conclusão, sem mais, pela aplicabilidade concreta da lei da Amnistia é precipitada”.
Finalmente, a resposta à carta rogatória faz a sua interpretação da lei portuguesa, fazendo notar que “se bem interpretamos a legislação portuguesa, a transmissão do processo para as autoridades angolanas não impede que as autoridades portuguesas possam porventura, e verificados os pressupostos legais, vir a recuperar o direito de proceder penalmente”.
Histórico de transferência de processos de Portugal para Angola
Entretanto, no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) existem alguns precedentes de delegação de processos criminais no sentido Portugal-Angola, e nos quais Portugal não teve dúvidas sobre a boa administração da Justiça. Os casos com Angola são o caso Jorge Gonçalves e um outro chamado caso “TAP-Sonair”, que o mesmo DCIAP delegou em Angola.
Quanto ao caso Jorge Gonçalves — cujo processo começou no início dos anos 90 em Portugal e culminou em 2001 em Luanda —, estavam em causa factos relativos às sociedades Sores e Vila Franca em processos relacionados com a anterior profissão de Jorge Gonçalves (despachante oficial) Jorge Gonçalves era suspeito de ter desviado mais de 900 mil euros daquelas sociedades, tendo sido aberto processo-crime em Portugal, que não pôde ter seguimento porque o Jorge Gonçalves fugiu para Angola em 1992; Neste contexto, o Ministério Público Português pediu a extradição, o que Angola recusou porque o Jorge Gonçalves tinha dupla nacionalidade; Em Junho de 2000 Portugal transmitiu o processo às autoridades angolanas.
O Tribunal Provincial de Luanda absolveu Jorge Gonçalves da prática do crime de abuso de confiança em 2001; Com o envio das respectivas certidões legais para Portugal, ficaram sem efeito os mandados de captura emitidos contra o Jorge Gonçalves.