O analista Osvaldo Mboco defende que Angola é um país com estabilidade político-militar, mas não é um imperativo que deva fazer com o país se envaideça. Pelo contrário, deve estar atento e vigilante em relação às movimentações que ocorrem no continente
O Presidente da República João Lourenço, deslocou-se ontem, 31, à cidade de Oyo, República do Congo, onde analisou com o seu homólogo, Denis Sassou Nguesso, a situação do golpe de Estado da madrugada da última Quarta-feira, no Gabão, tendo sido deposto o Presidente Ali Bongo, há 14 anos no poder.
Na sua qualidade de Campeão Africano da Paz e Reconciliação e Presidente em Exercício da Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), o analista em relações internacionais considera necessário esse tipo de articulação entre os dois estadistas, porquanto o Presidente Denis Sassou Nguesso domina o dossier da região afectada, ao passo que o estadista angolano é parte interessada no processo por envolver o bloco que integra a CIRGL.
Enquanto membro da CIRGL e tendo em conta os indica- dores agora presentes, é fundamental do ponto de vista prático que haja uma articulação ao nível do bloco e dos diferentes Serviços de Inteligência, daí o cuidado que teve recentemente João Lourenço ao chamar atenção da necessidades desses serviços estarem vigilantes. “Porque muitas vezes, uma situação que vai decorrer num Estado, o SIE do outro Estado toma conhecimento e é normal que avise o outro Estado o que está a decorrer no seu país.
É necessário a adopção de uma estratégia de defesa colectiva, que engloba até certo ponto os Serviços de Inteligência”, destacou Osvaldo Mboco. Em relação ao apoio popular com que os golpistas contam, segundo o analista, tem a ver com o sentido de a população sentir que os Governos fracassaram, sobre- tudo quanto à criação de melhores condições para as suas vidas.
Daí perceberem que com a retirada do Governo em funções, há uma ilusão de que a vida pode mudar. “Mas não, mais do que isso, pode existir um retrocesso dos direitos e garantias fundamentais. Porque quem chega ao poder pela via do golpe de Estado, normal- mente institui governos ditatoriais”, defende o especialista, que também refere a necessidade de mão pesada aos governos golpistas por parte da União Africana (UA), assim como da Organização das Nações Unidas (ONU).
Sanções
Mboco considera que todos estes acontecimentos destapam e colocam a nu as fragilidades das instituições dos Estados africanos e revelam a falta de sentido de Estado ou o cumprimento das obrigações de elites castranses a quem deve ser reservada a missão de assegurar a defesa do território nacional. “O efeito contágio ou dominó estendeu-se para algumas regiões do continente e transformou- se numa realidade em mudanças inconstitucionais de governo em África, muito pelo facto de não se registarem posições e medidas com maior tenacidade de organizações que obrigassem os golpistas a repor a ordem constitucional alterada”, referenciou. Para o académico, muitas destas organizações ficam apenas impávidas e serenas pelos comunicados que condenam tais actos, quando deveriam tomar posições mais claras e rígidas.
Mão invisível Por sua vez, o também analista e académico Afonso Botáz considera que os golpes de estado são a revolta consequente da violação dos direitos do homem a nível interno de qualquer país, e isto incluí tudo quanto dificulta a sobrevivência do povo. Por um lado, tal acção representa a capacidade de o povo em defender-se e de pleitear os seus direitos, e, por outro lado, serve de aviso e lição para os restantes países africanos.
Assim, por tal acto ter acontecido nas proximidades de Angola, entende que o Governo angolano precisa estar mais atento, revendo as políticas internas e verificar até que ponto as suas agendas violam e perigam os direitos do homem. “Mas não podemos nos esquecer que em todo o golpe de estado a nível dos países africanos tem sempre a mão invisível do ocidente.
A influência do ocidente nos países africanos tem a ver com antecedentes históricos. A maior parte dos países africanos foi colonizado por França e esta tenta de todo modo continuar a manter a sua influência geopo- lítica sobre eles, monitorando os quadros internos”, alertou.
Outros golpes
O continente assistiu, recentemente, o regresso da tomada do poder por via do golpe de Estado no Mali, encabeçado pelo coronel Assimy Goïta, na República da Guiné-Konacri pelo coronel Mamady Doumboya, e no Sudão pelo general Abdel Fattah al-Burhan. No Tchad, o Presidente Indriss Deby Itno morreu em circunstâncias pouco claras e, no dia 24 de Janeiro de 2022, no Burkina Faso, o tenente-coronel Paul Damiba tomou o poder pela via da força. No Níger, em 2023, ocorreu a 26 de Julho de 2023 quando a guarda presidencial deteve o presidente Mohamed Bazoum e o comandante da mesma guarda, general Abdou- rahamane Tchiani, proclamou-se líder de uma junta militar.