Segundo os colegas, só ela devia ter roubado o telemóvel. Desatou-se em choros a ré. Era um ambiente quase similar ao da mulher adúltera.
Levaram-na à área pedagógica, essa, por sua vez, fez a sua parte, interrogando-a, mas a menina resistiu e jurou de pés juntos não ter furtado telemóvel algum. Estávamos no recreio, já me tinha encaixado à ociosidade.
Não havendo solução de onde vinham, decidiram levá-la ao director de turma, ou seja, trouxeram-na a mim.
A aluna via-se num labirinto, toda sua reputação, sem observância da presunção de inocência, volatizava.
Recebi-os enquanto estava no ócio, relataram-me toda ocorrência. Pedi que todos saíssem e me deixassem a sós com a ré.
Irritou-se comigo a dona do telemóvel por lhes ter separado. Todavia, foi uma atitude mais sensata, pois vinha do meu âmago.
Fui conversando com a ré, sem, na primeira instância, questionar-lhe sobre o telemóvel.
Ralhar com ela não fiz e muito menos chamei-lhe nomes pejorativos.
A conversa era amistosa, não obstante as acusações, mostrei-lhe amor.
Era uma filosofia aristotélica, a mesma consiste em tocar no íntimo do aluno com amor.
Depois de ter estado à Aristóteles, pedi-lhe que tivesse confiança em mim, caso tenha furtado o telemóvel, mostrasse. Ninguém ficaria a saber. Assegurei-lhe.
A menina resistiu, assumindo categoricamente não ter furtado o telemóvel. Dei-lhe um tempinho, pedi que pensasse bem.
Minutos depois, o serpentear das lágrimas no rosto eram-lhe visíveis, perguntei-lhe por que razão chorava.
Ela, meio trémula e com vexame, assumiu ter sido a autora do furto. Pedi-lhe que ficasse à vontade.
Questionei-lhe onde estava o telemóvel, respondeu-me que tinha levado a um esconderijo.
A aluna pediu que mantivesse a discrição sobre a sua confissão. Aceitei o pacto.
Devolveu-me o telemóvel, guardei-o por 48 horas, depois desse tempo, levei-o à escola, chamei a moça a quem o telemóvel pertencia, entreguei-lho.
Alegre e grata, questionou-me onde e com quem tinha encontrado. Disse-lhe que o mais importante era o reaparecimento. Felicíssima, agradeceu-me novamente.
Até ao momento, a menina que tinha furtado o telemóvel tem toda sua honra salvaguardada. Sempre que me vê, não esconde a admiração que nutre por mim.
Às vezes, precisamos ser túmulos: não expondo o que entrou.
Portanto, aqui reside o sacerdócio para o qual fui chamado: ensinar com amor.
Por: ANTÓNIO RAIMUNDO