Sexta-feira, o sol espreita entre as cortinas, sacudo a cabeça, esfrego os olhos para ver o que está diante de mim.
Não há nada, é a ilusão de ótica, miopia pura a minha. Abano a cabeça em gesto de negação, vou ao WC para cuidar da higiene.
No interior do compartimento, vou buscando respostas de perguntas que não sei quando as formulei.
A mente, como boa senhora, vai-me dando aos poucos as respostas e com elas vou criando um plano daquilo que poderá ser o dia, o meu dia. Será feliz, será um dia memorável, vamos fazer história — penso em voz alta com a caneca de água na minha cabeça.
A água percorre sobre a minha pele e traça diferentes itinerários. “No final o destino é o chão” — penso e o meu pensamento dá lugar a outro que faz paralelo com outro que me faz compreender que é isso que acontece connosco, seres humanos. Ao longo da vida traçamos os nossos caminhos para alcançar os sonhos e objectivos.
Às vezes alcançámos tais sonhos e noutras não, mas no final é para o chão que vamos todos. Nessa busca pelo sonho às vezes somos humilhados e noutras vezes humilhamos o próximo para alcançarmos porque assim é a vida, ou seja, foi assim desenhada a Matrix, para que vivamos conforme um determinado grupo quer que vivamos.
— Merda, essas coisas da Internet vão inundar a minha mente — digo em voz alta e novamente abano a cabeça, o gesto dispersa água e passo a mão ao rosto. Ponho-me a pensar como será o final do dia. “Vamos bater aqueles gajos, é hoje que vão sentir a nossa garra” — penso em voz alta já no interior do quarto.
Me cubro com a roupa que tinha aprontado e vou a caminho da empresa ciente de que o trabalho que terei para lá chegar será maior do que o trabalho que irei exercer.
“Ser angolano é lutar e conquistar de coração” — diz o refrão da música que toca no interior do candongueiro onde me encontro. “Angolano é mesmo assim, Mwangole”, entoam uníssono as moças à minha esquerda. — Que clima bonito, há muito que não vivíamos assim, sabe? — questiono a uma das moças.
— Os rapazes nos devolveram o sonho — respondeu o senhor à frente de mim, sem deixar as moças dizerem qualquer palavra que fosse. — Vamos bater a Nigéria, e se não batermos na mesma seremos vitoriosos — proclamei.
— Esquecemos as crises e até demos intervalo aos nossos políticos, devem estar bem descansados — disse a moça que estava a ajustar o penteado e retocar o batom.
— Filha, os políticos nos perseguem, você não viu que ontem ligaram nos jogadores a prometer milhões de Kwanzas!? Outro até assustou o rapaz, que pensou que fosse um burlador a ligar! — Tio, até onde eu sei, são empresários que ligaram e não políticos — disse finalmente a moça à minha esquerda.
— Filha, não fica distraída, os nossos empresários são os nossos políticos, aqui eles são jogadores e árbitros ao mesmo tempo. — Mas então qual é o mal?! Eles só querem ajudar — anunciei.
— Ó moço, eu até pensei que fosses mais esperto, mas… eu sei que as aparências enganam — disse o senhor, acrescentando que até a claque enviada tinham um interesse político.
— Essa claque do escritório é para sustentar a ideia de que o Executivo fez, conforme sempre dizem. Se nós ganharmos, vai ser pelo esforço do Executivo e não dos jogadores.
Fica atento vais ver! — disse o senhor acrescentando palavras que não consegui perceber por já estar no meu destino. — Fico cobrador. “De facto o ser humano é um animal político por natureza.
Tem razão o Aristóteles” — pensei após abandonar o táxi e seguir para dar início ao meu expediente.
Por: Dito Benedito