Atese sobre a necessidade de Angola se livrar da ALROSA é apresentada quase como uma panacéia para todos os males que enfermam o sector dos diamantes, particularmente na produção e a venda das pedras preciosas.
Será este realmente o caso? Angola beneficiará, de facto, com a saída da mineradora russa do País? Estas e outras questões são esclarecidas nesta reportagem especial com a ajuda da Mary Njoki, da agência de relações-públicas GlassHouse PR.
A indústria diamantífera angolana atravessa momentos difíceis. Para se ter uma ideia, em 2023, as receitas de exportação de diamantes diminuíram 20% e a produção 21%.
No ano anterior, a previsão inicial era que o País vendesse 13,8 milhões de quilates de diamantes, conseguiu comercializar apenas 8,75 milhões de quilates.
As sanções contra a ALROSA, que detém 41% das participações de Catoca – actual maior produtor diamantes em Angola – estão, segundo o Governo angolano, entre as principais razões para este resultado.
A perspectiva dessa abordagem, desenvolvida por Mary Njoki, ajudar-nos a dissipar alguns equívocos. As sanções impostas aos russos dificultam o trabalho com alguns parceiros e bancos nos Estados Unidos e na Europa, que querem ter a certeza de que a sua cooperação com a indústria diamantífera angolana não será percebida nem mesmo como um apoio indirecto à ALROSA e ao regime de Putin.
No entanto, não se pode dizer ao todo que esta seja a verdadeira razão do declínio das exportações de diamantes de Angola, especialmente porque uma situação semelhante observa-se, agora, noutros países fornecedores de diamantes ao mercado mundial.
O bom desempenho de Catoca e sua credibilidade no mercado internacional dependem, dizia em Janeiro o PCA da Endiama, Ganga Júnior, da saída dos proprietários da ALROSA da firma.
Até ao momento, mantém-se um diálogo construtivo entre as partes, e ainda não foram tomadas quaisquer decisões sobre a retirada da ALROSA de Catoca.
A expectativa de muitos é que esta cooperação continue a um alto nível no futuro, dada a longa história de parceria e de laços estreitos entre Angola e a Rússia, no domínio da mineração de diamantes, uma das indústrias-chave para ambos os países.
O problema da exportação de diamantes angolanos não é de hoje é motivado por outros factores Angola não é o único país com dificuldades em vender seus diamantes. Outros produtores globais também enfrentam dificuldades.
É factual que, desde o segundo semestre de 2022, os rendimentos de todos os participantes da indústria diamantífera têm diminuído constantemente.
A principal razão, aponta a fonte, é a retracção do maior mercado de joias norte-americano, principal impulsionador das vendas de diamantes lapidados e brutos em todo o mundo – responde por quase metade de todas as vendas de produtos finais – joias com diamantes.
O aumento da inflação e das taxas de juro num contexto de incerteza geopolítica, segundo a Mary Njoki estão a obrigar o consumidor americano a reduzir os gastos em bens de luxo.
A situação é semelhante noutros grandes mercados globais, incluindo a China, onde a recuperação económica póspandemia do COVID-19 tem sido, até ao momento, muito lenta.
Como resultado, a procura mundial por diamantes brutos e lapidados está estagnada, os preços estão a diminuir e os fabricantes estão a ser forçados a acumular inventários e a apertar os cintos.
No meio deste cenário, é muito provável que sejam mais difíceis para a produção nacional de diamantes do que propriamente uma diminuição temporária da procura no mercado mundial de diamantes.
Segundo analistas, os preços dos diamantes fornecidos à Índia, onde estão concentradas as principais fábricas de lapidação, caíram em média 13% no ano passado.
O volume do comércio global de diamantes em 2023 caiu quase um quarto em comparação com 2021 (105 milhões contra 138 milhões de quilates).
Chegou ao ponto de, no Outono passado a Índia, impor uma moratória de dois meses às importações de diamantes, a fim de equilibrar, de alguma forma, as suas reservas.
Especialistas e partes interessadas do mercado admitem, no entanto, que a situação actual é temporária e que muito provavelmente este ano o mercado global de diamantes entrará num novo ciclo.
O tempo dirá se estas previsões se concretizarão. O que pode acontecer aos diamantes angolanos com a saída da ALROSA de Catoca? Não é segredo que há mais de 30 anos, os especialistas russos têm ajudado na organização e apoio técnico dos negócios da Catoca.
A sua experiência e conhecimento desempenharam um papel decisivo na descoberta e lançamento da produção nas principais jazidas de diamantes – Catoca e Luele.
Actualmente, cerca de cem especialistas russos altamente qualificados trabalham na Catoca sob a orientação de gestores angolanos, partilhando com eles a suas experiências.
Na sua maioria antigos funcionários da ALROSA, estes técnicos estão envolvidos em trabalhos de exploração geológica, mineração e processamento.
Agora há significativamente menos pessoal técnico especializado do que há 10-20 anos, porque ao longo desses anos a ALROSA esteve envolvida na formação dos quadros angolanos.
Outro aspecto importante a reter está relacionado com o facto de a ALROSA partilhar sua tecnologia com Catoca. E em quase todos os principais processos de produção. A tecnologia russa é a base da operação da unidade de processamento de Catoca.
A rejeição da parceria com a companhia de diamantes russa, provavelmente levará à necessidade de mudanças em grande escala nos processos tecnológicos, substituição de uma parte significativa do equipamento, treinamento de novo pessoal e a adaptação do pessoal existente, só para citar alguns. Tudo isto exigirá um grande investimentos e é improvável que seja implementado num futuro próximo.
De qualquer das formas, o crescimento das exportações angolanas de diamantes, bem como a actual estagnação, não estarão associados às sanções contra os diamantes russos, e muito menos a uma empresa individual, mas, sim, com os pré-requisitos económicos gerais.
Entretanto, as consequências da retirada da ALROSA de Angola, caso aconteça, são mais difíceis de prever do que parece à primeira vista.
Como demostra a experiência, o esforço conjunto de especialistas angolanos e russos permite implementar os projectos mais ousados e ambiciosos.
Por: MERY NJOKY
* Assessora de Comunicação da ALROSA