Tudo começou há menos de um mês, quando, numa viagem a São Paulo para falar de outro festival também de livros, de Brasil, de diálogos e bibliotecas alguém me interpelou.
O Flipoços e o Camões lançaram a Residência Literária em Poços de Caldas, podias concorrer.
Isso não é para mim disse.
Mas fiquei a pensar.
Estive no encerramento do Flipoços 2022.
Partilhei o palco com o imortal Jorge Caldeira e recordo bem a nossa conversa.
Era sobre essa nova cidadania que está a nascer, que vive na língua, que é desmaterializada e nova, e se desenha todos os dias nos falantes que acreditam que o sentido de fronteira mudou para sempre.
Vivemos num tempo em que a cidadania ganha novos contornos, disse o Jorge.
A tecnologia nos coloca em casa uns dos outros e partilhar a mesma língua e a mesma história nos dá confiança, respondi.
Trabalho todos os dias esse conceito: a “cidadania da língua”.
Procuro-lhe sujeitos e predicados, gramáticas e sintaxes, mas nunca o ficcionei. Talvez seja o tempo.
Decidi que ia participar e liguei de novo.
Baixe o regulamento.
Afinal você tem obra publicada no Brasil e o pior que pode acontecer é pensar ainda um pouco mais no que o futuro vai trazer, e isso nunca é tempo perdido.
Há mais de 15 anos que vivo entre cá e lá, atravessando o Atlântico, às vezes sem motivo maior que satisfazer esta urgência que hoje guia todos os passos que dou.
Na dúvida vou sempre. Nunca fico. A vida é demasiado curta para ficar. Em “casa”, já nem tenho dificuldade em explicar a transumância.
Deixou de ser importante para mim que as pessoas a entendam. Faz parte do meu compromisso com a vida e com o tempo que me resta.
Preciso de viver. De conhecer. De estar. De ser em outro lugar. De viver para contar. Desde que me conheço escrevo. Escrevo, logo existo.
Por isso escrevo furiosamente. Como vivo. Na espuma dos dias, histórias de lá e de cá, nos jornais de lá e de cá.
No Notícias do Porto, na Folha de S. Paulo, no País de Luanda. Pensando bem, se a língua é um lugar, tal qual uma cidade, Poços de Caldas também é esse lugar.
E se tudo acontecer em Poços de Caldas? perguntei-me não posso perder isso.
De 29 de abril a 07 de maio não quero fazer mais nada.
Nem estar em qualquer outro lugar.
Por: JOSÉ MANUEL DIOGO