É inquestionável o carácter mutável das línguas vivas, quer dizer, naturais. Aliás, é uma das leis fundamentais da ciência que se ocupa do estudo descritivo da língua, a linguística — ciência cujo expoente moderno é Ferdinand Saussure. As línguas naturais nascem, evoluem e morrem, seguem, aparentemente, o ciclo dos seres vivos.
Os falantes, embora não consigam explicar, excepto os especialistas, têm a noção mínima dessa variação. Em conversas do dia-a- dia é possível notar que as pessoas não falam sempre da mesma forma, sobretudo quando não são do nosso meio social.
A variação linguística tem sido objecto de estudo da Socio-linguística, visto que a língua é igualmente um facto social, segue a dinâmica da própria sociedade. Também não haveria nenhuma razão para contestação, contanto que os falantes são seres que compõem a próprio sociedade nos seus diversos estratos.
Então, não há nada de extraordinário aqui. A ideia da não variação linguística faria sentido se a sociedade fosse homogénea, no entanto, como Karl Marx observou, há divisão da sociedade em classes; nessa divisão os privilégios e as oportunidades são diferentes, também o falar o é.
Não somos iguais, a estratificação social é clara em relação a isso, ainda que haja normativos legais que afirmem o contrário. As diferenças linguísticas que se verificam entre os falantes da mesma língua deveriam ser um motivo forte para não acreditar na igualdade.
Se a língua não variasse, as pessoas falariam da mesma forma, escolheriam os mesmos vocábulos em todos os contextos, portanto, sem divergências na finalidade que se pretende do uso da língua, entreter, corrigir, informar, instruir, etc.
A autenticidade da língua, numa visão assente na distinção das finalidades, deve-se precisamente pelas múltiplas possibilidades de uso, ou seja, por não haver apenas uma forma de se falar. Há falares diferentes, não devem ser considerados vírus da língua. É importante ressaltar aqui um aspecto crucial do uso da língua: a geração de sentidos no que que- remos comunicar. Comunicar é dizer o que pensamos através da língua, sinais, etc.
A língua varia segundo o lugar, o tempo, a classe social, o estilo, etc. Assim, é possível afirmar que a língua abarca um conjunto de variações que a enriquecem. Portanto, se a língua não variasse, não seria possível distinguir linguisticamente os poetas dos não poetas, os académicos dos não académicos, um angolano de um português, etc. Mais do que um elemento de comunicação, a língua é um factor de distinção, e o seu carácter mutável revela a sua autenticidade.
POR:MANUEL DOS SANTOS