As queixas nunca param de nos chegar aos ouvidos. Há muita aflição cuja cura é o comprometimento com o estudo do funcionamento da língua.
Em princípio, a língua é o meio no qual é falada esta é uma constatação de facto, da realidade, não um delírio.
No entanto, o realce da abordagem é normativo, a norma-padrão, em que nós nos vemos como pecadores, incapazes de nos redimir.
Também a necessidade da normapadrão de uma língua, haja vista as flexibilidades ou variações que apresenta, não é uma questão de muito debate.
Escolher conscientemente a norma a ser usada numa situação comunicativa pressupõe conhecimento explícito sobre a própria língua, o seu carácter de “contextualização”, portanto, ser capaz de reflectir sobre a própria língua.
E, em se tratando de usar, com um grau de exigência maior, a normapadrão tem sido um bicho-desete-cabeças para nós, referente à regência verbal.
Sobretudo porque o problema do ensino da língua portuguesa e da norma-padrão adoptada, no nosso país, é gigantesco.
Os anos de escolaridade não têm repercussão significativa no discurso linguístico oral e escrito dos estudantes e profissionais em geral.
Vamos uma constatação dialógica: Bom dia, senhor! “Onde” vai?
Bom dia! Vou “em ” Benguela.
A sua documentação, por favor! Preciso a confirmação dos seus dados.
Está bem. Vou pedir “na” minha mulher para trazer a minha carteira.
Certo. Pode aguardar na aqui mesmo, aproveite assistir “o” jornal das dez.
Aqui diz que o senhor trabalha “no” ministério de Educação… Observando as recomendações da norma-padrão, o bom uso da língua, no que respeita à regência verbal, as palavras destacadas apresentam desvios, pelo que os verbos empregados regem determinadas preposições que devem ser respeitadas.
O primeiro caso «onde vai?», o verbo ir rege as proposições “a e para”, então seria «Aonde vai ou para onde vai?»; no segundo caso «vou em Benguela», deveria ser «vou a Benguela»; o terceiro caso «vou pedir na minha mulher», o verbo pedir, nesse contexto, teria que reger a preposição “a”, «vou pedir a minha mulher….»; no quarto caso, o verbo assistir rege a preposição “a”, naquele contexto, «assistir ao jornal»; no quinto caso, temos o verbo trabalhar que pede a preposição “para”, «trabalhar para o Ministério da Educação».
Os casos constatados são apenas uma gota no oceano de casos que são flagrados diariamente, o que abre margem a uma reflexão sobre a norma-padrão que se tem e o seu ensino.
Em suma, a regência verbal constitui bicho-de-sete-cabeças sob a perspectiva da norma padrão, pois os flagras dão-se desde os discursos de simples estudantes a discursos de entidades, um fenómeno que é explicado no âmbito da “Sociolinguística”, sendo que a língua é um facto social e cultural.
Por: Manuel dos Santos