As crianças estão de férias. Brevemente, os universitários também. É então chegada a altura para passeios, diversão, turismo… só que não. É tempo de Cacimbo. Foi ainda durante a pandemia da Covid-19 que se alterou o calendário escolar, fazendo com que as grandes férias de final do ano lectivo coincidissem com a estação de Cacimbo. Na altura, perceberam-se as razões.
Depois de vários meses de paralisação das aulas, era necessário retomar e só havia duas alternativas: retomar naquela altura, alterando o calendário, ou esperar mais alguns meses, mantendo assim as coisas como eram antes da pandemia.
A escolha foi óbvia. A pandemia, entretanto, já terminou, mas parece que a grande herança que nos deixou é este calendário escolar que mais se assemelha um calendário europeu, e que parece que ninguém quer voltar a ajustar.
As férias são a altura perfeita para fazer planos. Conheço vários pais (eu sou um deles) que fazem coincidir as suas férias laborais com as férias dos miúdos, justamente para aproveitar estar com eles mais tempo e dar-lhes a conhecer um pouco mais do nosso grande e belo país.
Parece ser então a altura ideal para o turismo interno, cuja promoção até está nas prioridades do Executivo. Não preciso dizer que Angola tem boas opções para o turismo, algumas delas ainda bastante económicas, o que vem mesmo a calhar nestes nossos já longos anos de cintos apertados até ao último furo. A primeira alternativa para quem tem pouco dinheiro seria explorar as nossas praias.
São tantas, para todos os gostos e, tirando algumas excepções, são livres. Os rios também vão se tornando numa boa atracção, que o diga a zona de Calumbo em Viana que, além da vista e dos passeios de barco, oferece várias opções gastronómicas para quem gosta de um bom garfo.
Com um pouco de mais arrojo e engenho, dá igualmente para conhecer outras zonas do nosso imenso país, os seus resorts, parques naturais, montanhas e grutas.
Seria só chegar e escolher não fosse o facto de estarmos agora no Cacimbo. Esta estação (apesar de ter os seus entusiastas) não convida a grandes aventuras. Os dias são mais curtos, mais frios, geralmente nublados e enevoados.
E acrescento que este tempo é propício ao surgimento de doenças próprias da época: gripes, constipações e outras semelhantes a estas. Portanto, uma época que apenas convida a ficar debaixo das cobertas e a tomar chá.
Os europeus há muito que perceberam o impacto do sol e do calor para o turismo. Não é por acaso que, por lá, as férias de fim de ano lectivo acontecem justamente no tempo de verão, quando os dias são mais longos, mais quentes, e mais convidativos a actividades ao ar livre. As praias enchem-se, os restaurantes e bares têm clientes até tarde, a economia do turismo ganha fôlego.
Nós, por cá, decidimos ir na contramão do que já é sabido, estudado e comprovado há muitos anos. Agora temos férias quando não podemos ir à praia, quando é mais arriscado conduzir por causa do nevoeiro, quando nem apetece sequer sair de casa porque está frio e escuro. E assim, criou-se um maior incentivo para o turismo externo.
Agora, quem pode vai comprar umas divisas e rumar à Europa, levando lá para fora os recursos que podiam ser usados aqui. Um duro golpe para as famílias que não podem ir ao estrangeiro, para os empresários do sector e para a economia do nosso país.
Espero sinceramente que se volte a pensar no calendário escolar que temos e naquilo que queremos para o nosso turismo. É possível voltarmos ao calendário antigo sem estrangular mais um ano lectivo, basta que se façam pequenos ajustes a cada ano até chegarmos ao objectivo.
Gostaria muito de ver o Ministro do Turismo reunido com a Ministra da Educação para corrigir esse pequeno/grande embaraço, tal como já o fez com o Ministro do Interior tão logo percebeu que havia na polícia um obstáculo ao turismo que precisava de ser removido.
Vou aguardando, mas enquanto esse dia não chega e o meu dinheiro não me permite ir à Europa, vou executando o único plano possível para as férias familiares que agora acontecem em tempo de cacimbo: pijamas, cobertores, e uns medicamentos para tratar das gripes. Agora, pergunto: assim está mesmo bom?
Por: SÉRGIO FERNANDES
*Escritor