Marcela estava entusiasmada, finalmente tinha conseguido entrar para a faculdade, depois de tanto tempo de espera e a juntar economias tinha agora a sua grande oportunidade. Queria formar-se em Direito e ser jurista, porque lhe tinham dito que os advogados ganham bem, em tempos idos tinha tido uma inclinação por serviço social, mas depressa verificou não estar talhada para tal responsabilidade pois não se via a trabalhar com poucas condições e sem reconhecimento.
POR: Kâmia Madeira
Direito, medicina, engenharia, gestão essas sim eram áreas de progressão e crescimento….. As primeiras semanas foram de adaptação, muitas disciplinas e um ritmo ao qual já não estava habituada, acordar cedo, ir para a faculdade, assistir às aulas e comer quando desse… começavam a ser frequentes os dias em que sem dinheiro suficiente escolhia entre ter mais um fasciculo ou almoçar. Tornava-se evidente também o tipo de responsabilidade que os seus colegas tinham, uma grande parte faltava ou chegava atrasado e nunca se preocupava com prestar realmente atenção aos ensinamentos dos professores, alguns que mais não faziam do que debitar informação dos seus fascículos elaborados há anos e sem actualizações ou ministrar aulas a jacto referindo sempre que se o discente adquirisse o livro de sua autoria teria sem dúvida melhor entendimento. Marcela pensava que nas faculdades se discutiam as grandes ideias e se ajudava a criar uma consciência de cidadania e intervenção, pois como nova geração o papel seria o de investigar e apontar soluções, ledo engano, afinal mais importante era falar sobre que vestuário de marca se comprou ou a que festa se foi, indicando qual o beat que está a bater e discutir que cantora namora com que cantor. As associações de estudantes, célebres em outras partes do mundo, por liderar movimentos reivindicativos e por preocuparem-se pelas condições estudantis estavam reféns de compromissos políticos que as levavam a pensar mais em ascensões partidárias do que efectivamente no bem comum. Alunos com profissões que frequentavam o ensino superior para obter subida de escalão na empresa e poder auferir mais, eram frequentes assim como professores que cobravam por aulas de reforço e para aprovar discentes. Marcela foi perdendo paulatinamente o encanto, ponderando se tudo o que tinha poupado valeria a pena, ser investido num sistema de ensino que não valorizasse o rigor e a qualidade. Um sistema que não desafiava os alunos e nem estimulava a competição, que não apresentava estatísticas e nem elaborava rankings, mas que aspirava a figurar na lista de universidades do continente…. Entendeu por fim de que nada valia tirar direito, engenharia ou medicina se no fim nem um estágio era assegurado e que o conhecimento prático não saía do papel. Percebeu também que boas escolas, se constroem e são um conjunto e que saber ler e escrever não significa saber interpretar e que para crescer um país precisa de quadros qualificados e engajados e não de pessoas que apenas querem ganhar bem.