Nas manhãs frias e noutras, às vezes, ensolaradas, sob o peso de muitas noites mal dormidas se levanta a Mamãe Guerreira e põe-se às pressas nas ruas com os mesmos objectivos de sempre: primar pelos frutos do seu ventre.
Com o mesmo sentido em mente despreza a vergonha, adapta-se às circunstâncias e aceita as várias humilhações, tudo pelos petizes, tudo pela vida.
Entre corridas, porretes e roubos, a Mamãe Guerreira se mantém firme, teimosa, fazendo tudo, até mesmo quase o impossível para comprar nas ruas mais um dia de vida para os seus filhos.
E, em meio às dificuldades dessa vida e à oposição de muitos que desconhecem a profundeza da real razão da sua teimosia em se fazer presente nas ruas dia após dia, a Mamãe Guerreira, de um modo discreto vai deixando o seu legado.
Não se trata de um legado desonroso, como muitos chamam, ou de pobreza, como muitos acham, mas sim um legado de luta, firmeza e perseverança naquilo que é o seu sentido de viver.
E uma vida atenta, consegue ver nisso uma senão várias lições de vida, simples ou complexa, porém, bem lá no fundo, muitos de nós sabemos que são merecedoras de aplausos e elevadas honras!
Muitos são os pés que furiosamente correm atrás dela, com o intento de inibi-la e puni-la severamente pelas suas acções. Sua dignidade e carácter são várias vezes espezinhados, suas lágrimas desprezadas, sua voz silenciada, porque para muitos, nada do que diz justifica a teimosia de se fazer presente nas ruas. E em que isso afecta a senhora?
Em nada, desde que os seus objectivos diários sejam materializados.
A senhora é de poucas exigências e encontra satisfações até mesmo em migalhas da vida, um exemplo de simplicidade, prova viva e material de que a felicidade e o contentamento da vida estão no modo como cada um constrói o seu carácter e como decide seguir esta longa estrada que a vida nos submete com justiça ou injustiça.
Óh! Mamãe Guerreira, quantas lições de vida ainda terás de transmitir a essa sociedade para que ela te compreenda?
Se ao menos pudéssemos ouvir o clamor do teu silêncio! Se ao menos pudéssemos ver as coisas na posição dos teus humildes olhos…, talvez entenderíamos que é por uma causa leal que lutas e aceitas todas as possíveis humilhações!
Há muito que se diga a teu respeito, na verdade, a senhora é um grande livro, uma grande fonte de lição.
Para aqueles que desconhecem ou pelo menos se negam em conhecer a razão da tua luta diária, nada tens a ensinar, mas para muitos da tua classe, que compreendem o porquê da tua luta diária muito tens a ensinar com a tua persistência e, na maioria das vezes, até choram as tuas lágrimas em seus próprios olhos.
Representante do ser humano na capacidade de amar e perdoar.
Quando se trata do bem-estar dos filhos, nada te detém, a senhora é capaz de enfrentar até mesmo o mais temido dos homens e, se for necessário, lutar até a última gota do seu sangue a escorrer pelas veias… isso tem nome, chamo de amor!
Quando um dos frutos do seu ventre se arrepende e vem novamente a busca do seu colo, você o recebe com os braços abertos e lágrimas de alegria, você opta em esquecer o passado e aceitar um recomeço… isso se chama perdão!
Oh Mamãe Guerreira, ensina-nos a viver. Faça com que todos vejamos e percebamos a justa razão pela qual você luta, para que possamos aprender a lutar pelos nossos, tal como a senhora bem faz.
Essa vida não se vive e nem sequer é vista apenas de um único ângulo ou posição.
Respeitar a posição que cada um se encontra pelo facto de muitas vezes desconhecermos certos ângulos da vida é sempre necessário.
Quem cedo madruga, arriscando sua vida todos os dias é porque a razão por detrás é forte e deve ser descortinado.
Talvez seja justo correr atrás e levantar a voz para aquela Mamãe Guerreira que tem tudo para ser a nossa amada mãe, mas antes, devíamos nos certificar de que conhecemos o suficiente a sua posição de vida.
Por trás de uma teimosia que, às vezes, é vista por muitos como um erro, há uma causa e não perdemos nada se pelo menos pararmos um pouco para dar ouvido a essa causa, e daí poderemos nos surpreender com as razões e talvez até começar a olhar para aquela teimosia e procurar uma nova definição para ela.
Se assim fizermos, acredita… saberemos se vale ou não a pena julgar aquela a quem eu chamei aqui de: Mamãe Guerreira, que deixa o seu legado engavetado no desconhecido.
Por: MANUEL RODRIGUES