O Ocidente parece mais interessado em minar a influência da China em África do que em realmente auxiliar o continente a prosperar. Há uma inversão notável da lógica do discurso e as acções do Ocidente em relação à importância e aos benefícios potenciais da parceria entre o Ocidente e a África.
Embora uma série de investimentos tenha sido anunciada no âmbito da Partnership for Global Infrastructure and Investment (PGII) e da Global Gateway, potencialmente trazendo aspectos positivos para a África – especialmente em países como Angola, que abriga o corredor do Lobito, um dos principais projectos da PGII – o foco central destes projectos de financiamento de infraestrutura parece ser conter a influência da China.
Em grande parte, são projectos concentrados na disputa geopolítica. “A China incomoda muita gente”, desabafou o renomado economista Alves da Rocha numa entrevista.
Principalmente para o Ocidente, que passou a caracterizar, por meio das suas lideranças e representantes, a relação China-África como baseada no colonialismo ou neocolonialismo.
Isso foi expresso de maneira embaraçosa pela então Secretária de Estado, Hillary Clinton, em 2011, e mais recentemente por Rosaria Bento, a nova embaixadora da União Europeia em Angola, que logo na sua primeira entrevista a um jornal afirmou que “O modelo da China não é de cooperação, é de exploração pura e dura”.
Este tipo de narrativa é expressada para confundir a compreensão do nosso próprio processo histórico. Afinal, foi a China quem escravizou e colonizou a África, incluindo Angola?
Quem apoiou golpes de Estado em todo o continente e guerras por interesses próprios após as independências, notavelmente a longa e nebulosa guerra civil em Angola?
Quem virou as costas para Angola e se recusou a realizar a Conferência Internacional de Doadores num momento crucial da história do país?
Quem impõe condições políticas como contrapartida para financiamentos ao desenvolvimento? Quem foi e continua a ser o parceiro mais importante na reconstrução e no crescimento económico de Angola? Quem frequentemente interfere nos processos políticos internos dos países africanos, incluindo em Angola?
Os angolanos estão bem cientes disso. É evidente que os Estados e povos africanos aprenderam, por meio de comparações e contrastes com as potências ocidentais, que a China é um parceiro muito mais confiável para o futuro de África.
Como afirmou o antigo Ministro das Relações Exteriores (atual Secretário do MPLA para as Relações Internacionais), Manuel Augusto: “Confiamos na China, e não há nenhuma especie de ‘colonialismo’ ou ‘neocolonialismo’”.
A China busca salvaguardar os seus interesses nacionais legítimos, mas, ao contrário da União Europeia ou dos Estados Unidos, não parece olhar para Angola como um espaço exclusivo de actuação em que nenhuma outra potência “concorrente” pode actuar.
As críticas ocidentais à China, disfarçadas de “avisos” ou “alertas”, são mais frequentes do que se poderia imaginar. Especialmente em países considerados estratégicos na África, como Angola.
O Presidente João Lourenço destacou numa entrevista que Angola recebe “muitos recados para ter cuidado” sobre a China. (…) e o caricato – referiu o Presidente – é que os que. nos vêm dizer para ter cuidado, recebem investimento privado chinês todos os dias nas suas terras (…)”.
No entanto, esta postura reflecte o reconhecimento por parte do Ocidente da sua situação desfavorável na África. Estão a esforçar-se para compensar a sua desvantagem competitiva, que tem raízes históricas ligadas a eventos desastrosos para os africanos (as respostas para todas as perguntas retóricas acima).
Assim, os Estados africanos e a China emergem como parceiros estratégicos naturais, cujas vantagens se complementam de maneira harmoniosa, e cujas histórias partilham notáveis semelhanças.
O legado da colonização, invasões externas e guerras civis deixou uma marca indelével nos seus percursos históricos, tornando a relação entre a China e países como Angola ainda mais especial.
O Ocidente, especialmente a UE e os EUA, vai utilizar os seus investimentos em Angola para diminuir a influência da China.
Esta situação deve ser encarada com a devida atenção pelas autoridades angolanas, pois a possibilidade de uma intervenção indirecta fará com que estes investimentos deem anuência tácita a UE ou aos EUA para pressionar Angola a implementar as suas agendas políticas “democráticas” no país, de acordo com seus próprios interesses.
A UE acredita que estas medidas ajudarão a manter uma presença forte em Angola e a proteger seus interesses no país, como o próprio Borrell afirma, é o futuro da Europa que está em jogo.
“Ocorre desde há alguns anos”, como patenteia Alves da Rocha, “uma desocidentalizaçao do desenvolvimento económico, isso é um facto. Os centros de crescimento da economia mundial, do desenvolvimento tecnológico e científico estão a sair dos Estados Unidos, do Ocidente, e estão a emigrar para o Oriente”.
Este académico e Director do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola (UCAN), asseverou que “O modelo chinês de desenvolvimento económico é muito mais adequado a Angola e a África do que o modelo europeu ou americano”, pois permite um acesso mais direto ao financiamento, na medida em que “há um falhanço” no modelo de cooperação Europa-África, que sempre beneficiou a Europa.
Os representantes do Ocidente, ao se referirem à propaganda da “exploração” chinesa, não mencionam o perdão da dívida da China para países como Angola.
Neste momento, estamos a testemunhar um ressurgimento da mentalidade da Guerra Fria nos principais centros de poder do Ocidente, onde tendências como o unilateralismo e o protecionismo estão em ascensão.
Enquanto isso, há um anseio evidente dos povos de todo o mundo em continuar a ver a globalização como fundamental para evitar uma fragmentação ainda maior do mundo.
Angola, como assertivamente frisou Chen Feng, Encarregada de Negócios da Embaixad da China em Angola, “tem a liberdade de escolher os seus parceiros”.
Por: HOTALIDE CORDEIRO DOMINGOS & EDMUNDO GUNZA