Sexta-feira, vestido à Tamoda, lá ia eu dirigindo-me a uma das salas da escola. Perto, ouvi uma tremenda barulheira que vinha da sala.
Entrei apenas e cumprimentei os alunos. Ninguém respondeu. Nem notaram a minha presença. Repeti a saudação, mas mais alto e irritado. — Boa tarde, sim, professor! — responderam todos. ¬— Rum! Estão bem? — Sim, professor! E o professor? — Estou bem. A que se deve tanto barulho, ó jovens?! — É assim, prossôr, vou explicar. — disse a Eliane que estava inquieta. — Prossôr, esses colegas num estão a acreditar que Zezus vai voltar. Sem terminar de falar, Daniel, o cómico da sala, declarou já rindo: “Agora mesmo é que ele não vai voltar”. Todos gargalharam.
Eliane, já estressada e irritada, retrucou: — Mas ó colegas, vocês não sabem mesmo que Zezus vai voltar? A turma voltou a gargalhar novamente. Dessa vez, de maneira mais duradoura. Eis que o Aldo, seu colega de fila, ainda rindo, disse: — Eliane, cala só.
É Jesus, não Zezus. E… Interrompi-os naquele instante. Estava sério e descontraído. E perguntei-lhes de um modo amigável e animado: — Ah! Estavam a rir-se do facto de ela ter dito Zezus em vez de Jesus? ¬— Sim, professor. É engraçado — falou o Aldo. — Eliane — chamei-a. ¬— Vai escrever a palavra Jesus no quadro. Ela, tímida e nervosa, foi até ao quadro escreveu Jesus.
A turma toda, espantada, perguntava-se: “Arrah! E como é que ela fala Zezus?” A turma calou-se. Olhando a situação, perguntei-lhes: — Vocês já viram ou observaram, de longe ou de perto, uma casa a ser rebocada, certo?
Unanimemente, todos disseram que sim. Novamente, questionei-os: — Qual é o objecto que eles usam para alisar o cimento na parede?
Nuel respondeu com toda a confiança, parecendo dominar bem a matéria: ¬— a esponja, professor! Mas o meu mestre diz que deveria ser a talocha.
A turma ouvia. — Nuel, por que é que utilizam a esponja em vez da talocha? — questionei-o. Sem deixar o Nuel responder, André, o boqueiro, enunciou: — fazem uma adaptação.
O importante é que serve, prof. — Evidentemente! ¬— proferi alegre. — Da mesma forma que o pedreiro faz uma adaptação, o nosso aparelho fonador também faz um tipo de adaptação. Lembram-se do que é o aparelho fonador e o seu objectivo? ¬— Essa eu num esqueço, professor.
O aparelho fonador é o conjunto dos órgãos da fala e tem como objectivo a produção acústica da fala — disse o Adi. ¬— Boa, Adinaldo! Então, percebam bem: O que acontece na Eliane e em muita gente, mas vocês apenas se riem, é um metaplasmo.
— Metaquê, prossôr? — questionou a Câmia. — Me-ta-plas-mo, Câmia! Entendam: o metaplasmo é o nome que se dá ao processo de alteração de uma palavra a nível do som, podendo modificar, adicionar ou suprimir sons. O metaplasmo acontece porque o nosso aparelho fonador faz uma adaptação para facilitar a pronúncia e tornar a fala mais fluente.
O metaplasmo não acontece com todos, pois temos contextos linguísticos, fora daqui, diferentes e mais outros factores como o contacto próximo do português com as línguas nacionais. Então, para a pessoa não ficar sem falar, o aparelho fonador faz o quê?
— Uma adaptação — disseram todos. — E cada metaplasmo tem o seu nome. E o nome do metaplasmo que ocorreu nessa palavra que a Eliane falou faz referência a um processo fonético chamado assimilação, que é a influência que um som, dentro de uma palavra, exerce sobre o outro, tornando este (outro) igual a ele ou semelhante a nível do som.
— Então, professor, o som z da letra s vai assimilar o som j? — indagou o Aldo curioso.
— É! Exatamente isso. São coisas do nosso aparelho fonador. Para não ficar sem falar, que seria estranho, ele faz essa adaptação. Todos, espantados e admirados, estavam com a cara: AHAM! — Riem à toa vocês. Viram, pois não? — afirmei entusiasmado.
Teresa, que se sentava na “baixeira” e estava nem aí para o que tinha acabado de explicar, perguntou: —Mas.
professor, já falamos bué. Jesus vai vortá ou não? Desta vez, apenas metade da turma sorriu, para o meu espanto. — Mas, ó colegas, vocês estão a rir o quê? — Perguntou o Alberto. — Estão a rir à toa. Assim o aparelho fonador dela vez essa adaptação.
Mesmo a aprenderem? Erreh! — continuou dizendo o Alberto impaciente. —Viram? Já estão a aprender! — exclamei. — A este tipo de metaplasmo, chamamos de rotacismo, que é quando substituímos o L pelo R. Como em barde, sarsicha e o que vossa colega disse.
— Mas não é erro, professor? — questionou-me o Alexandre. Conforme diz Mateus (2023), respondi-lhe: — NÃO É ERRO, é diferente!
Por: ASIEL PAULO