A solução de um homem, ausente de capital social e económico, é a escola.
Evita-se estar à beira de uma instituição pedindo migalhas e trocos de notas tão pobres que reflectiriam a minha vida miserável perpétua.
Quero, com isso, dizer, senhor professor, tenho a máxima noção da figura da escola para qualquer sociedade.
Só desconheço o valor que as outras sociedades dão à escola! O gigante conflito entre os alunos e os professores é a estranheza entre esses dois principais agentes da educação, os alunos conhecem todos os professores, porque eles fazem o favor de contar as suas grandiosidades, mas os professores até conhecem os mais destacados e, às vezes, os nossos rostos, os vistos como fracos; os professores esquecem-se de que também temos um nome próprio, e passamos a ter nome de adjectivos com sentidos negativos, como nosso nome próprio, para o professor é mais fácil conversar e ser amigo dos que entendem as suas matérias.
Querido professor, não seria nós, os fracos, a termos mais espaços! Parece que planifica para os mais inteligentes! O heroísmo consiste na transformação de um fraco em forte, mas, está mais preocupado com os inteligentes! Muitos, por sinal, já vieram inteligentes! E, se o professor fizesse um inquérito no começo do ano, decerto, o professor saberia o tipo de estudante que tem.
A propósito, a sua avaliação diagnóstica serve só para medir o domínio cognitivo?! Chama-me fraco, como que todo bom aluno é ou será bom profissional! Será que o senhor foi bom aluno! Professor, deixe que eu lhe diga o seguinte: Eu oro para anoitecer, enquanto alguns para amanhecer, porque quando eu durmo, sei que vou descansar nos braços de um Deus que a sociedade me deu, esqueço-me na completude deste meu eu fraco, como o senhor diz.
O caminho que percorro para chegar à escola é uma viagem longa que já não sinto a longanimidade, ando mais de seis quilómetros a pé, sou obrigado a acordar às sete horas, sem o que comer, esforço-me a ler num intervalo de trinta minutos, que para o professor é insignificante e para mim também, porque devo dar banho ao meu pai que vive doente há dez anos numa cama do quarto do fundo e negro da nossa casa, doença diagnosticada como trombose, depois cuido da minha irmã caçula, que a mãe a deixou no parto, sempre que a toco, choro, porque sinto saudades da mamãe, que já não está entre nós, um pobre jovem de dezoito anos cuidando um pai e uma irmã de sete anos, além de cuidar da casa, eu devo preparar a comida para os dois comerem às onze horas, pois só temos duas refeições por dia, a suposta renda mensal da pensão do pai só é quinze mil Kwanzas, que, para a realidade angolana, é insignificante, por isso, devo terminar todas essas actividades antes das onze horas, entro às treze horas, mas o trajecto de casa a escola é um deus nos acuda! É uma distância de noite e dia ou preto e branco.
Chego tarde à escola, sim, como disse, viajo a pé e em pé nestas estradas empoeiradas, a família do pai e da falecida mãe não estão connosco, a desmotivação é minha aliada, na sala de aula, o professor rotulou-me fraco, a turma toda ri de mim, quer dizer, era suposto ter uma paz na sala de aula, mas também não sinto, a minha escola não me dá prazer, a escola está pelada de política de inserção, quer dizer, a minha escola desinteressa-me, o director-geral e os subdirectores casaram-se com os gabinetes, os professores são as estrelas da escola, aqui, na sala, no palco junto ao quadro, eles dão os melhores shows, contam as suas pseoudovidas luxuosas, dos seus ganhos, poucas vezes das perdas, isto é, estou metido com pessoas que só vencem, parece que sou o único ser que é desgraçado nesta escola da vida, como não bastasse, o professor ainda é um bom humorista, debocha das nossas vestes, quer transparecer sempre superioridade! Se o mais inteligente da turma responder, nós, os que não entendemos, acabamos ser o centro da aula, não para nos motivar, mas para nos rotular.
Já são quinze horas, no meu estômago já se vive tiroteios entre as lombrigas, tenho fome, mas não tenho o que comer, assusto que apanhei um leve sono, os colegas ficam mais a zombar de mim, dos meus ténis que as madres me deram, eles chamam pão que na ponta é bolo.
Quando começa a escurecer, também fico preocupado, porque na viajem a pé para casa, de duas horas de andamento, há delinquentes, a falta de dinheiro de táxi, leva-me, às vezes, a não assistir aos últimos tempos, devo chegar a casa, no mais tardar, às dezanove horas, para dar tempo de dar banho no papá e na irmãzinha, depois fazer o jantar para nós, a segunda e a última refeição do dia.
Eu não sou fraco, professor! Eu sei o papel da escola nesse país! Não me orgulharei em ser doutor com vida precária, mas se estou no Magistério, um dia eu serei professor como o professor, mas não como o professor.
Por: ADILSON FERNANDO JOÃO