Poucos lembrar-se-ão do famoso ‘melão de ouro’. Mas aconteceu em 2011, quando no conhecido supermercado Casa dos Frescos, em Luanda, estava a ser comercializado um melão a um valor que ultrapassava os 100 dólares norte- americanos, uma situação que criou revolta no seio de muitos cidadãos, apesar das explicações dos gestores sobre a proveniência do produto.
Pouco tempo depois da polémica, numa viagem a Portugal, num conhecido restaurante da sua capital Lisboa, pedi ao garçon que me trouxesse para comer o famoso melão que se dizia especial em Luanda. Surpreso, o funcionário, com quem já estivera momentos antes, questionou se se passava alguma coisa, porque era impossível que se tenha deslocado ao local apenas por causa da referida fruta? Foi então que contei ao profissional de restauração que havia em Luanda um supermercado em que um único melão custava perto ou mais de 100 euros.
Este, sem pestanejar e boquiaberto, atirou-me que se tivesse comigo 100 euros, no momento, me daria uma caixa com os famosos melões de ouro que custavam os olhos da cara. Ou seja, poderia levar vários melões, dourados, prateados ou bronzeados, por aquele preço. Durante muitos anos, evocar-se dezenas, centenas ou milhares de Kwanzas ou dólares era muito comum. Sem quaisquer pruridos, atribui-se preços escandalosos em produtos importados e até mesmo nacionais como se vivêssemos todos em terra de cegos, incapazes até de perceber que possa existir indícios de sobrefaturação nalguns destes bens, projectos ou infraestruturas que são oferecidas às pessoas.
Não espanta que durante muitos anos tenhamos liderado a lista dos países mais caros do mundo. Claro está que não terá sido por conta do melão de ouro. Porém, a forma desapaixonada como se falam de milhões e os endossam a produtos que a olho nu possam ser custado menos exige das autoridades algum posicionamento. Um estudo da Universidade Católica de Angola, publicado há alguns anos, indicava, por exemplo, que te- ria sido por intermédio das obras públicas que o país se viu lesados em largos biliões de dólares norte-americanos durante o boom do petróleo. Não espanta por isso que nos dias que correm alguns altos dignatários tenham sido indiciados em crimes supostamente cometidos durante esta fase.
Apesar de ser um sector extremamente exigente em termos de meios, materiais, estudos complexos e uma execução que influi para o aumento de preços, a forma como se fala destes milhões em Angola, incluindo em empreitadas de pouca montra, seriam susceptíveis de averiguação da Inspecção Geral do Estado. Reconhece-se que a distância de algumas localidades em relação aos principais centros produtores de matéria-prima ou de importação destas acabem igualmente por criar derrapagens em relação aos orçamentos finais.
Ainda assim, em alguns casos, os muitos zeros colocados na factura final pare- cem indigestos, como se vê em obras do Programa Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), em que infraestruturas pequenas aparecem orçadas em largos milhões de Kwanzas. Os zeros em determinadas localidades parecem estar a valer muito menos.