Tive a sorte de no início dos anos 2000, antes mesmo da febre das centralidades terem começado, ter morado no Grafanil, em Viana, um bairro descrito pelo meu finado amigo Mendes como um dos mais especiais do mundo por razões que não são ainda aqui evocadas.
A poucos minutos do centro da cidade e da sede do município de Viana, o Grafanil tornou-se espaço de eleição de cidadãos provenientes de várias origens, destacando- se, entre estes, muitos naturais e descendentes do Leste do país, particularmente os Lunda Tchokwe.
Assim, diariamente, ao longo de vários anos fui bebendo um pouco desta cultura, mormente a culinária, com o xima e kandonda, e a música e os seus principais intérpretes, como o agora malogrado Rei da Costa, que partiu vítima de diabetes, como uma das vozes inseparáveis nos convívios que mantínhamos com gente que dança com tanta perfeição a Tchianda até aos dias de hoje.
Desde mais novo que me tornei um aficionado da música originária de Angola, aquela que alguns designam como tradicional. E escutar Sassa Tchokwe, Moyohemo, Skrite Samukuenda, Santos Católica, Ilinga Sakassexi, Gabriel Tchiema e Sandra Nhakatolo acontece com frequência, mesmo não percebendo o contéudo das letras cantadas em Tchokwe, mas o ritmo não deixa de ser contagiante.
O mesmo não acontece com os Tunjila Tuajokota e outros ritmos de Malanje, meu berço. Ainda assim, ouvir Sassa Tchokwe é um hábito que o faço com permanência, havendo uma pendrive já cativa no carro com dezenas de músicas das Lundas, oferecida há alguns anos pelo deputado Joaquim Nafoia.
A morte de Rei da Costa, que há muito andou adoentado, apanhou muitos angolanos de surpresa. E são várias as mensagens de condolência que vamos observando, principalmente daqueles que conhecem o verdadeiro valor desta obra que é executada com mestria no leste do país e dançada por muitos sem sequer conhecer aquele que teve o dom de criar.
Infelizmente, para muitos jovens angolanos, as músicas tocadas por sumidades como Rei da Costa, Justino Handanga, Bessa Teixeira e outros ícones da nossa cultura pouco ou quase nada dizem. Afinal, emborrachados por outros géneros musicais, muitos dos quais com letras obscenas e amplamente divulgados pelas rádios e televisões no país, a partida destas estrelas para o além acaba por passar de forma despercebida.
Felizmente, há quem também do outro lado lute para que não se perca o gosto por aquilo que é verdadeiramente angolano. Através de um vídeo que circulou nas redes sociais pude ver centenas de convivas no Funje do Mês a dançarem embalados ao som dos Tunjila Tuajokota. Seguramente, se fosse uma Tchianda com Rei da Costa e o seu Sassa Tchokwe Internacional sairiam na mesma os panos, a roda e os toques mágicos que os angolanos sabem muito bem inventar nestes momentos lúdicos, diferentemente do que fazem muitos sons de muitos artistas internacionais que alguns quase idolatram.
Como diriam lá pelas bandas de Cafunfu, Lucapa, Cuango, Xá Miquelengue, Xá Muteba, Saurimo, Luena e Kazombo… Txole Mwata Rei da Costa