Ainda sinto na boca o sabor de algo comido há mais de quadro décadas. É muito tempo, acredito. Mas nem por isso, sempre que posso, recuo ao lembrar-me de um molho de tomate feito pela minha saudosa avó Rosa na casota que possuía aí nas proximidades da estação do Zanga, em Malanje. Era novo. Naquela fase, creio, o óleo alimentar parecia ser difícil. Não sei o que terá usado, mas o sabor era quase que inconfundível, o que faz com que passados vários anos mantenha vivo o seu paladar, sobretudo por causa dos produtos do campo que fazia parte do cabaz alimentar que usávamos no dia-a-dia.
Há quem pense que aquilo que se produz e os nativos se alimentam no campo seja inferior aos produtos que se vendem nas grandes cidades, muitos dos quais acabam por contribuir para doenças cancerígenas, diabetes, hipertensão e outros males que se vão exibindo sem compaixão nos dias que correm.
Felizmente, depois de largos anos extasiados pelo fast- food e outros alimentos pré-cozidos, aos poucos vamos recuando para aquilo que é verdadeiramente do campo, fresquinho e sem aditivos. É o que permite, se calhar, a inexistência de algumas doenças das grandes cidades em algumas aldeias, comunas ou até mesmo bualas. Há dias, infelizmente, olhei estranhamente para uma informação que passou por uma das nossas televisões sobre a merenda escolar num dos municípios do país. Os meninos, com certeza agradecidos por aquilo que lhes era dado em tempo de crise, sentiram-se felicíssimos pelos biscoitos, leite, o famosíssimo chocapic e outros produtos oferecidos pela direcção da escola em que estudam.
Nada contra. Afinal, em tempos de crise sobretudo, tudo que caí na rede é peixe. Porém, olhando para a composição da referida merenda e de alguns bens disponibilizados, nota-se, claramente, que alguns dos produtos parecem ser importados – ou de fabrico extremamente oneroso- que poderiam ser substituídos por outros de produção local, principalmente numa fase e num país em que ainda existem centenas de agricultores que se queixam da falta de mercado.
Na última semana, numa conferência de imprensa realizada pelo Ministério da Agricultura e Floresta, apercebeu-se de que existem muitas culturas em que Angola se vai tornando autossuficiente, exceptuando o arroz que vai ganhando velocidade ultimamente. Alguns dos produtos que Angola produz em grandes quantidades, como o milho, mandioca, batata-doce, feijão, banana e outros podem, sim, ser incorporados na merenda que se vai distribuindo nas escolas nas zonas rurais e até nas cidades.
Trata-se de um expediente que iria criar uma cadeia em que interviessem os camponeses, as cooperativas, alavancar o empresariado local e até mesmo impulsionar as pequenas empresas de transformação destes produtos nas comunidades longínquas. E assim fazer-se crescer a economia destas circunscrições.
Quase todos nós ainda nos lembramos do sabor daquela papinha, matete ou o rolão que mais novos comíamos e nos tornavam mais fortes. Da sopinha da avó, da mama ou da tia e outros pratos da terra que nunca nos fizeram mal algum. E sempre estiveram muito distante de alguns produtos lácteos importados, cuja composição pode conter ingredientes mais prejudiciais em relação aos que sempre vieram directamente do campo.
E porque não tornar a merenda mais original e nacional? Nada trava isso se houver vontade. Levar alguns biscoitos que exigem importação ou longas viagens de carro não parece ser uma ideia genial.