A primeira vez que lá pisei foi numa visita de campo do Presidente José Eduardo dos Santos. Na época, a desocupação da conhecida barroca do Miramar e o destino dos seus moradores era um dos principais cavalos de batalha e assunto que dominava os principais noticiários, atenção das forças políticas da oposição e das organizações da sociedade civil.
Muitos podem já não se lembrar dele. Mas o nome de José Rasgadinho, o rosto principal dos moradores da Boavista, era o símbolo maior de uma hipotética injustiça que se pensava existir, com muitos políticos, dirigentes e até cidadãos anónimos convictos de que viver no Zango configurava um desterro.
Não obstante os clamores das vozes que se levantavam e outros buscavam lucros políticos, os cidadãos da Boavista e de outros pontos de Luanda acabaram por ser transferidos para o Zango, em Viana, considerado hoje como um dos pontos mais habitados da cidade de Luanda.
Há quem diga que, quando se implementar a nova divisão político-administrativa, o Zango virá a ser um dos mais novos municípios da capital. A acontecer, claramente, não será de estranhar, uma vez que reúne no seu território, constituído por vários zangos e bairros que foram crescendo, mais de um milhão de moradores, uma cifra superior até a população de alguns países.
O bairro então dito como sinistro, que não poderia conferir qualquer dignidade a quem lá iria viver, sobretudo por causa da distância em relação ao Miramar, é um dos que cresceram mais a nível da capital. Por possuir ainda terrenos, embora quase sempre envoltos em polémicas, com suor e sangue, continua a receber jovens e até adultos que ainda não desistiram da concretização do sonho da casa própria.
É hoje vizinho de um aeroporto internacional, o recém-inaugurado Dr. António Agostinho Neto, de cujas salas de embarque se pode divisar pertinho os prédios do Zango 8 mil, hoje transferido para Icolo e Bengo.
À semelhança de outros bairros de Luanda, sem os devidos arruamentos e outros serviços, o Zango — ou os Zangos, se preferirmos — também viu nascer inúmeros problemas a nível dos acessos, inundações, fornecimento de água, energia, segurança, transporte e outros. Alguns deles estão a ser seleccionados, mas outros só com o tempo e a sagacidade do Executivo é que se poderão encontrar solução.
Por exemplo, é inaceitável que o Zango não tenha uma única biblioteca, assim como outros bairros de Luanda. E serão várias as preocupações que poderão apresentar ao inquilino que vão receber a partir de hoje: o governador de Luanda, Manuel Homem.
Até amanhã, sexta-feira, o homem forte de Luanda deverá percorrer as principais artérias deste distrito urbano, conhecer os seus mitos e as suas verdades. Quem sabe se não dará mesmo uma volta às zonas mais icónicas do Zango, entre as quais a famosa Dira, que se bem aproveitada pela Administração Municipal de Viana e pelo próprio distrito se transforme numa verdadeira fonte de receitas turísticas e não só para a própria edilidade.