Confesso que inicialmente não sentia qualquer atracção pelo jogador Gilberto. Este mesmo, o Gibelé, hoje na moda, o cara que questionou ao PCA da UNITEL onde tinha conseguido o seu número de telefone, como se para um responsável de uma empresa de telecomunicações pudesse ser encontrar agulha num palheiro.
Os dois últimos jogos do rapaz dos cabelos pintados, num dos quais pudemos assistir àquele passe magistral ao capitão Freddy e este para Gerson Dala, que o aproveitou de forma divinal, alteraram sobremaneira a minha convicção. E daí penitenciar-me em alguns círculos. Entretanto, mais do que os passes — ou até mesmo um dos golos que já fez — não se pode retirar o mérito de Gibelé, que entrou quase por pressão da sociedade ao técnico Pedro Gonçalves, transformou-se numa espécie de talismã que veio conferir uma harmonia sem igual ao balneário da Selecção de Angola.
Mais do que isso, num país em que muitas das nossas raízes são quase que ignoradas, até porque possuímos uma pseudo-elite alimentada ou engordada com um processo de aculturação ocidental, o número 7 da Selecção angolana levou para os palcos da Cote D’Ivoire aquilo que muitos a nível interno fingem não existir: o Kuduro. Criado por Tony Amado e aperfeiçoado por outros bons executantes, como Sebem, Dog Murras, bruno M, puto Lilas e o inesquecível Nagrelha com os seus companheiros dos Lambas, o Kuduro irrompeu as portas de África por estes dias de forma inesperada e a reboque do futebol, ou seja, o prodigioso Gilberto, para muitos o Gibelé.
Mais do que o futebol, que levou a Selecção angolana aos quarto-de-final, podendo chegar às ‘meias’ caso vença esta sexta-feira o combinado nigeriano, Angola acabou por impor também aos demais países presentes uma forma própria de se apresentar através do Kuduro. E são várias as Selecções que o passaram a fazer, muitos dos quais com um estilo de música muitas vezes marginalizado, mas que deve merecer urgente- mente um tratamento particular devido ao seu alcance hoje.
Diferente do que se observava noutros tempos, o Kuduro tornou-se hoje, para muitos, um estilo de vida, uma arte e sobretudo uma fonte de sobrevivência, retirando, inclusive, muitos jovens da pobreza. por isso, não se pode ignorar a sua existência, nem permitirmos que surjam, como aconteceu recentemente, informações embora apócrifas, mas que davam como certo que um cantor brasileiro havia ganhado um prémio mundial como tendo sido o seu criador.
Se exemplos não existiam no passado para espelhar melhor a sua força, o funeral do malogrado Estado-Maior, Nagrelha dos Lambas, com uma enchente só comparada com os principais momentos políticos do país, serve para que se procure encaminhar para um bom curso os seus executores e dele se retirar o maior proveito. por enquanto, até mesmo no futebol, os embaixadores do Kuduro estão presentes, comandados pelo próprio Gibelé.