Tem sido o mesmo discurso. Insistentemente, por mais que fuja, o meu amigo T, nome fictício, não pestaneja quando diz com regularidade que o problema deste país nunca foi a falta de dinheiro, mas sim a falta de amor. Há aqueles dias em que há alguma pachorra para escutar, sem quaisquer problemas, as lições que o meu companheiro faz. Aliás, por mais que me assuste, ainda assim dá um tempinho para tentar colher o pouco ou muito que ele nos quer transmitir.
Temos debatido sobre muita coisa. Nos últimos tempos, sobretudo agora que o Orçamento Geral de Estado veio, uma vez mais à baila, não há como não tentar compreender as dotações que são feitas pelo Estado angolano aos vários departamentos ministeriais e até mesmo às províncias, municípios e, com certeza, às comunas. Não há dúvidas de que nos habituamos a ver zeros a mais em cada projecto que nos surgisse a frente. Só por isso, muitos daqueles que tivessem menos zero fossem vistos com algum menosprezo e outras vezes até como empecilho a desígnios dos que não descansam enquanto não sacarem as suas percentagens. Na verdade, em Angola sempre se movimentou elevadas somas financeiras.
Só por isso muitos conseguiram a partir destas transações obter chorudas comissões, o que fez com que num determinado momento se olhasse para o país como uma autêntica fábrica de pseudo-milionários, alguns dos quais quase que não possuem hoje sequer alguma ligação umbilical , sanguínea ou até mesmo afectiva com este país que encheu os seus cofres. Por incrível que pareça, aumentam as queixas de falta de verba para muitos projectos. Ministros, governadores, administradores municipais e até mesmo gestores de projectos governamentais lamentam constantemente de um suposto emagrecimento dos seus cofres.
Porém, em sentido contrário, sem qual- quer receio, registasse o acumular de riquezas por parte de muitos destes sortudos, reflectindo-se nas suas contas, contrastando com aquilo que se espera de quem teve a missão de acudir dezenas ou milhares de populares mais necessitadas. Por mais que se fale de falta de verba, segundo o meu amigo T, o que muitos recebem daria para, no mínimo, fazer-se alguns projectos cujos resultados esta- riam a impactar positivamente na vida das pessoas. Para ele, não é o que vai ocorrendo hoje, onde se fala mais em aumento de verbas sem que muitos até demonstrem, por A+B, o que terão feito com aqui- lo que lhes foi dado inicialmente e dizem ser pouco.
Não é fácil neste país fazer apologia àquilo que os responsáveis ministeriais, da administração ou até mesmo determinados órgãos fazem. É que não é fácil mesmo, sobretudo por causa do excessivo sentido de convencimento que muitos apresentam. São poucos os que dão a mão à palmatória porque têm conhecimento de que com o que se obtém através do Estado se pode conhecer ou fazer um país melhor. Não é o que parece existir no seio de muito boa gente. O espírito do querer sempre mais há muito que moldou a mente dos angolanos, principalmente dos seus responsáveis. A febre dos números, ou seja, dos zeros nas contas ou até mesmo nos cheques e ordens de saque supera até mesmo o bom senso de que, afinal, sempre se soube que com pouco também se consegue fazer muito mais. É preciso, sim, que haja entre os angolanos vontade de servir mais e não se sentirem servidos.