Quando em Agosto passado, no Zaire, o governador desta província, Adriano Mendes de Carvalho, pediu encarecidamente ao Presidente da República, João Lourenço, ‘maior atenção e apoio’ ao contrabando de combustível nesta circunscrição, não havia sequer a mínima noção da dimensão que a situação havia tomado.
Quase todos os dias, através dos órgãos de comunicação social, liam-se, ouviam-se e assistiam-se detenções de inúmeras quantidades de gasóleo, gasolina e petróleo nos postos de controlo instalados em muitas províncias do país. Porém, não se tinha a mínima noção da teia gigantesca e os supostos protagonistas da referida trama.
Para muitos, o desabafo de Adriano Mendes de Carvalho, cansado por ver os cidadãos da província sem combustível sempre, mas dezenas ou centenas de camiões a franquearem as estradas do Zaire, caiu em saco-roto.
Afinal, são várias as denúncias feitas no país, mas a serem apuradas e depois seus envolvidos responsabilizados quase que não ocorrem, por mais que se diga o contrário.
No caso dos combustíveis, uma semana depois das denúncias do governador, o ministro de Estado e Chefe da Casa Militar do Presidente da República, general Francisco Pereira Furtado, visitou a província, apurou as informações e colocou, como se soe dizer, mais ‘lenha na fogueira’, ao garantir, a 4 de Setembro passado, que o tráfico contava com a participação de governantes, políticos e oficiais das Forças Armadas Angolanas e da própria Polícia Nacional.
Sem mais pormenores, só as afirmações de Furtado já se tinham constituído num autêntico vendaval, prevendo-se que, nos próximos tempos, venhamos a testemunhar mais processos mediáticos, capazes de envolver a sociedade e com enormes repercussões na vida política e social dos angolanos.
O pronunciamento do Presidente da República, João Lourenço, durante o discurso sobre o Estado da Nação, vem consolidar ainda mais esta certeza de que os próximos dias poderão mesmo ser difíceis para alguns destes envolvidos nestes esquemas, que acabam por contornar, com recurso às chamadas ordens superiores, os mecanismos de fiscalização montados pelo próprio Estado.
No dia 15, na Assembleia Nacional, o Presidente da República, que defendeu uma vez mais o combate ao contrabando de combustível, afirmou, categoricamente, que alguns dos envolvidos são políticos e parlamentares.
Em outras palavras, alguns dos instigadores e beneficiários desta prática que tem lesado o país em largos milhões de dólares pertencem àquele hemiciclo e poderiam estar a ouvir o próprio discurso ‘in loco’.
Pessoalmente, talvez à semelhança de muitos angolanos, espero que este suspense seja encurtado o mais rápido possível. Se já se conhecem os nomes, onde trabalham e o respectivo envolvimento, é hora de se levar à justiça estes cidadãos, sobretudo quando se sabe que deveriam eles próprios servir de exemplo para os demais na defesa dos interesses da Nação.
É provável que depois do discurso do Presidente da República e no dia seguinte muitos já não tenham conseguido pregar o olho. Mas, como se diz regularmente, o crime nunca compensa, razão pela qual devem ser responsabilizados, independentemente da formação política ou instituição a que pertençam.