Quem acompanhou os debates na primeira legislatura da Assembleia Nacional, depois das eleições de 1992, vencidas pelo MPLA e rejeitadas pela UNITA, tem presente o calor dos debates que eram protagonizados. Com humor, destrato, sorrisos e até mesmo palavras um tanto quanto chocantes, se podia divisar no seio dos presentes uma intelectualidade tal que fazia com que muitos se revissem nos pontos em discussão.
Se calhar o facto de ser uma situação nova, depois de vários anos de partido único, tivesse influenciado. Quem não se lembrará das tiradas de Mfulumpinga Landu Victor, o malogrado político fundador do PDP-ANA, o jeito provocador de Dias Kanombo, o português sempre refinado do agora regressado Benjamim da Silva, da FNLA, ou a irreverência dos jovens Celestino Capapelo, Daniel Maluca, Carlos Calita, Savihemba, isso sem contar com plêiade que de início formou o grupo parlamentar da UNITA.
Claro, ao lado tinham, como sempre, aqueles que desde cedo se mostravam como os principais defensores das teses do MPLA. Um grupo extenso, onde, com certeza, não se pode abdicar do malogrado André Passy, Alexandre Gouguel, o Xandocas, Paulo Rangel e Adelino Marques de Almeida. Este último cujo texto escrito em homenagem ao passamento físico do seu companheiro Passy deveria ser obrigatório para muitos jovens que se iniciam nas lides jornalísticas e até – se possível- nas ciências políticas.
Em suma, nestes mais de 30 anos de parlamento, com o conflito armado evoluindo, mas uma oposição do mesmo partido na casa das leis, foi possível divisar debates, poucos acertos e também algumas incertezas que acabaram por migrar para os dias que agora vivemos. Ao longo destes anos, curiosamente, embora a situação em determinadas alturas exigisse, assiste-se a uma quase inexistência de acordos que pudessem colocar no mesmo barco os dois principais partidos políticos. Por exemplo, não se percebe até agora por que razão não se rubricou uma agenda de consenso, sabendo-se que o MPLA havia proposto num determinado momento, mas rejeitado, na altura, pela ala mais radical da UNITA.
E do mesmo modo, agora, quando achou conveniente, por observar um suposto enfraquecimento dos seus adversários, a UNITA também quis uma agenda de consenso. E claro também levou um ‘não’ dos camaradas. À medida que o tempo avança, com novos actores ou figuras independentes, vai sendo visível que as diferenças entre as duas organizações irão permanecer. Algo que poderá tornar ainda mais difícil obter-se consensos em relação a assuntos com os quais os dois adversários figadais se deveriam concentrar, embora, em surdina, alguns tentem os rasgos individuais para marcarem posição em termos políticos na sociedade.
Por exemplo, não sei se não seria mais viável por parte da UNITA agora concentrar as suas atenções na problemática das autárquicas que, cedo ou tarde, deverão ocorrer no país. Procurando consensos em relação aos pontos ainda por se aprovar no quase longevo pacote legislativo para as referidas eleições. É que embora esteja no seu direito, ainda estou por perceber, neste desafio que ainda quer levar para outros campos, que garantias terá de que seriam os próprios militantes do MPLA a quererem se ver livre do seu líder e Presidente da República nesta tentativa de destituição? Como disse alguém, há dias, é preciso ter fé, mas nem sempre ela surge sobretudo daquele campo em que somos vistos como oponentes de uma vida toda. Apesar de ter aumentado o número de deputados, 90 no caso, é prudente acreditar sempre que os ‘camaradas’ ainda têm uma maioria folgada que lhes permite caminhar a solo e travar o que não desejarem. E dentro da lei.