Era uma manhã de Luanda, com o sol já alto e o movimento frenético das zungueiras a instalar-se nas ruas. Dona Maria, uma das mais experientes no ramo, era conhecida pela sua habilidade em vender qualquer coisa, desde frutas frescas até arroz a grossista, cuja proveniência ela própria desconhecia. Naquele dia, Dona Maria decidiu ensinar um pouco da sua “diplomacia das ruas” às novatas.
“Meninas, prestem atenção! O segredo para vender bem não está só no produto, mas na lábia e na logística!” dizia ela, enquanto arrumava as suas mangas numa disposição quase artística.
“Primeira lição: conheçam o vosso cliente! Vejam aquele senhor ali, o Engenheiro Joaquim. Ele passa por aqui todos os dias, mas só compra quando faço aquele meu desconto especial e ofereço uma piada de brinde.
Hoje vou dizer que manga boa é como político honesto, difícil de encontrar, mas quando se acha, dá gosto!” As jovens zungueiras riam, mas logo perceberam a estratégia por trás da piada.
Quando Joaquim passou, rindo da comparação, comprou duas mangas em vez de uma. “Viram? Ele sai feliz, e nós com a venda dobrada!” Mas Dona Maria não era só lábia.
“Segunda lição: organização é tudo! O espaço é pequeno, mas se souberem como usar, cabe o mundo inteiro!” dizia, enquanto reorganizava os produtos para parecerem mais atractivos e acessíveis.
E ali estava a logística em prática. As zungueiras aprenderam que cada centímetro de espaço bem utilizado poderia aumentar as vendas. “Nada de deixar a mercadoria amontoada!
Aqui é como nos grandes supermercados, mas com muito mais charme e improviso!” dizia, piscando o olho. No meio da aula improvisada, surge o agente Silva, figura já conhecida e com um bom humor contagiante. “Bom dia, Dona Maria! Hoje tem aula de empreendedorismo?” perguntava ele, rindo. “Ah, seu Silva, aqui é uma escola ao ar livre! A gente aprende e ensina todos os dias.
Quer uma manga para acompanhar a ronda?” respondia ela. Silva, aproveitando a oportunidade, fazia o seu papel de “cliente colaborador”, comprando algumas frutas e ainda aproveitando para elogiar a disposição e o bom humor de Dona Maria. “Sabe, Dona Maria, vocês zungueiras têm mais organização do que muitos escritórios por aí!” E assim, entre uma venda e outra, Dona Maria mostrava que a vida nas ruas de Luanda era uma aula contínua de economia, diplomacia e, claro, muita logística.
As jovens zungueiras, atentas, aprendiam que o segredo do sucesso estava na combinação de trabalho árduo, criatividade e um bom sorriso. Enquanto o dia avançava e as vendas prosperavam, a conversa começou a desviar-se para os últimos acontecimentos políticos. Dona Maria, sempre bem informada, comentou: “Meninas, já ouviram falar dessa ideia de dividir Luanda em duas novas províncias e criar três novas províncias no país? Que confusão isso pode dar, mas talvez haja vantagens.”
As mais novas ficaram intrigadas. “Dona Maria, como é que isso nos pode beneficiar?” perguntou uma delas. “Bem, vamos pensar como zungueiras e gestoras de logística que somos.
Com a criação da nova província de Icolo e Bengo, que vai incluir Cacuaco, Kilamba, Zango, Vida Pacífica e Viana, e a divisão de Luanda em duas, poderemos ter um acesso mais organizado e eficiente a diferentes mercados.
Por exemplo, Icolo e Bengo tem um grande potencial agrícola. Se a infraestrutura melhorar, poderemos obter os nossos produtos frescos de forma mais rápida e barata,” explicou Dona Maria. Ela fez uma pausa para vender um par de bananas a uma cliente apressada e continuou: “Com a nova divisão administrativa, as áreas de Cacuaco, Kilamba, Zango, Vida Pacífica e Viana podem se tornar importantes centros de comércio e logística.
Isso significa que mais pessoas terão dinheiro para gastar, e nós, com as nossas bancadas bem organizadas, poderemos aproveitar esse fluxo de novos clientes.” “E o centro de Luanda?” perguntou outra zungueira, curiosa.
“O centro de Luanda continuará a ser um ponto estratégico, especialmente para os produtos de luxo e serviços especializados. No entanto, a divisão pode aliviar a pressão sobre as infra-estruturas actuais, melhorando o trânsito e a acessibilidade.
Para nós, significa que podemos deslocar-nos mais facilmente entre as diferentes áreas, adaptando a nossa oferta conforme a procura de cada zona.” Dona Maria viu a dúvida nos olhos das mais jovens e decidiu acrescentar um pouco de humor à conversa.
“Vejam só, meninas! Quem diria que a Dona Maria, zungueira de longas datas, estaria aqui a falar sobre estratégias provinciais e desenvolvimento urbano? Mas é isso que somos: empresárias de rua, mestres na arte de adaptação e sobrevivência.” As risadas ecoaram novamente, mas desta vez com um tom de admiração pela sabedoria prática de Dona Maria.
O agente Silva, que já terminava a sua ronda, voltou para ouvir mais um pouco. “Dona Maria, parece que a senhora deveria ser conselheira do governo!” “Ah, seu Silva, se me ouvissem, o país estaria bem melhor,” respondeu ela, com um sorriso maroto. A conversa prosseguiu, e Dona Maria, agora com um público atento, aprofundou as possíveis implicações da divisão administrativa de Luanda.
“Meninas, outra vantagem pode ser a descentralização dos serviços públicos. Com mais províncias, cada uma terá que gerir os seus próprios recursos, o que pode significar melhor acesso à educação, saúde e segurança. Para nós, isso significa uma vida um pouco menos complicada, com menos burocracia e mais eficiência nos serviços que utilizamos.”
Uma das zungueiras, ainda um pouco cética, levantou uma questão importante: “Mas, Dona Maria, e se essa divisão trouxer mais corrupção e má gestão?” Dona Maria assentiu, reconhecendo a preocupação válida.
“É verdade, minha filha. A corrupção é um problema grave, e a má gestão pode acontecer em qualquer estrutura administrativa. Mas é aí que entra a nossa responsabilidade como cidadãs.
Precisamos estar atentas, votar em líderes competentes e exigir transparência e responsabilidade. Se nós, que estamos na base, não fizermos a nossa parte, a mudança não acontecerá.”
O sol começava a descer no horizonte, mas a energia das zungueiras continuava alta. Dona Maria sentiu que tinha mais uma lição a dar antes de terminar o dia. “Meninas, lembrem-se sempre de que a mudança começa dentro de nós.
Podemos ser pequenas comerciantes, mas temos um papel importante na sociedade. Se cada uma de nós fizer a sua parte com honestidade, dedicação e esperança, podemos criar um futuro melhor, não só para nós, mas para as gerações que virão.”
Ao arrumar as suas coisas, as zungueiras estavam mais animadas e inspiradas. Cada uma sabia que, independentemente das mudanças políticas e administrativas, elas tinham o poder de fazer a diferença nas suas comunidades.
E, com a liderança e a sabedoria de Dona Maria, estavam prontas para enfrentar qualquer desafio. Naquela noite, enquanto descansava em casa, Dona Maria reflectia sobre a conversa do dia.
Sabia que as mudanças em Luanda trariam desafios, mas também oportunidades. E, com a resiliência e a união das zungueiras, estava confiante de que poderiam aproveitar ao máximo as novas circunstâncias.
Dona Maria pensava nas três novas províncias que Angola iria ganhar e nas possíveis implementações das autarquias. “Se por acaso implementassem as autarquias, meninas, isso poderia ser uma verdadeira revolução para nós,” disse ela na manhã seguinte, retomando a conversa.
“Com a criação das autarquias, os governantes locais estariam mais próximos das nossas realidades. Poderíamos ter uma voz mais activa nas decisões que nos afectam directamente. Imaginem só, um governo local mais atento às nossas necessidades, como infra-estruturas para os mercados, acesso a crédito para pequenas comerciantes e programas de formação.”
Uma das zungueiras, agora mais interessada, perguntou: “Dona Maria, mas o que são exactamente essas autarquias?” “Autarquias, minha filha, são formas de governo local onde as comunidades têm mais controle sobre os seus próprios assuntos. Em vez de depender apenas das decisões tomadas lá em cima, em Luanda, teríamos conselhos locais a gerir os nossos bairros e municípios.
Isso poderia significar mais eficiência e respostas rápidas às nossas preocupações. Por exemplo, se houvesse um problema com a segurança aqui na praça, poderíamos levar isso directamente aos nossos representantes locais e esperar uma solução mais imediata.” Dona Maria fez uma pausa para vender algumas frutas a um grupo de crianças que passava, e depois continuou: “Com as novas províncias e as autarquias, poderíamos ver uma melhoria significativa na nossa qualidade de vida.
As novas divisões administrativas poderiam trazer mais recursos e investimentos para áreas que antes eram negligenciadas. Isso significaria melhores escolas para os nossos filhos, melhores centros de saúde e mais oportunidades de emprego.”
O agente Silva, que parecia ter uma curiosidade insaciável sobre as conversas de Dona Maria, voltou para ouvir mais. “Dona Maria, a senhora está sempre um passo à frente. Já pensou em candidatar-se a algum cargo?” Ela riu, com aquele sorriso característico.
“Ah, seu Silva, o meu lugar é aqui, com as minhas meninas, a ensinar o que sei e a aprender com elas. Mas se cada uma de nós fizer a sua parte, não precisamos de cargos para fazer a diferença.”
E assim, com a sabedoria e a visão de Dona Maria, as zungueiras de Luanda estavam mais preparadas para enfrentar o futuro. Cada uma sabia que, independentemente das mudanças, a união e a resiliência seriam sempre as suas maiores forças. E com a liderança inspiradora de Dona Maria, estavam prontas para transformar cada desafio em uma nova oportunidade de crescimento e sucesso.
Por: RIBAPTISTA